Ia eu a vociferar logo de manhã no carro com o meu marido por causa de estar a ler no jornal que o enorme surto de mortes que se verificaram no passado mês de fevereiro se devia ao frio, à gripe, ao envelhecimento e ao facto de “muitas famílias [estarem] a poupar no aquecimento”, quando ouvi, na rádio, o iluminado do senhor primeiro-ministro, interpelado na Bolsa de Turismo sobre a possibilidade de os portugueses poderem ir de férias, dizer, no seu tom pretensamente jovial e brincalhão, que não ia decretar a proibição de ir de férias! (ai que engraçado!...) E feita a pergunta “com que dinheiro”, o iluminado do senhor primeiro-ministro respondeu cheio de razão que “fazendo uma boa aplicação dos recursos”, naturalmente! Poupando, leia-se!
Vociferei ainda mais! Eu odeio
quando eles utilizam a palavra “poupar”. As famílias não poupam no comer ou no
aquecimento. As famílias não poupam na compra dos medicamentos ou nas taxas
moderadoras ou nos transportes para os seus tratamentos de químio ou de
hemodiálise. Aí não se trata de poupar, mas sim de não ter para gastar por não
ter o que gastar, que é diametralmente diferente! Poupar é pôr algum dinheiro
de parte para poder ir de férias, ou para qualquer exigência da vida. Agora
quando, a mais ou menos dias do fim do mês, já não há dinheiro para as
necessidades mais básicas, isso não é poupar – é não ter! Querem enganar quem?
Gostava, sinceramente gostava de
ver o iluminado do primeiro-ministro e outras figuras gradas da nossa política
viverem três meses – chegavam três meses – com 418 euros mensais como ouvi há
dias na televisão uma jovem mãe desempregada e com duas filhas pequenas em
idade escolar, a ter de pagar renda de casa, água, luz e alimentação e vestir e
calçar e tudo o mais que exige a vida de três pessoas, para ver como fariam a
tal “boa aplicação de recursos” por forma a poderem realizar a tal poupança que
lhes permitisse ir de férias!
Odeio – odeio mesmo! – quando os “endinheirados”
vêm a terreiro revestidos de um paternalismo rançoso e nojento, dar “consêlhos” – nem imaginam o que eu odeio
a palavra e o conceito de “conselho” (com chapelinho no ê e tudo)! Ouvi há anos numa novela brasileira e não
esqueci que “se conselho fosse bom, não se dava, vendia-se” – para cima de quem
vive (ou sobrevive) com menos de um vinte ou cinquenta ou mil avos do que eles
têm para se governar. Mete-me nojo!
Esta noção de poupança destes
nossos governantes iluminados remete-me sempre para a poupança salazarista em
que as pessoas também eram obrigadas a poupar na alimentação, na saúde,
no mínimo de bem-estar, na educação e em tudo do que se possam lembrar por não
poderem fazer de outra forma.
Sobre estes arautos da “poupança”
poderíamos de igual modo contar aquela anedota que se contava há muitos anos
atrás sobre o Salazar e que era assim: «Um pobre homem chefe de família pediu
uma audiência ao senhor presidente do Conselho para pedir um aumentozinho de
ordenado porque não ganhava o suficiente para sustentar a casa. E, como exemplo
da sua pobreza, explicou que todos os dias ia a correr atrás do carro elétrico
para poupar os dez tostões do bilhete; ao que o senhor presidente, cheio de
convicção – como o nosso atual primeiro – sugeriu que corresse atrás de um táxi
que sempre poupava vinte escudos.»
Há que mudar!
Concordo contigo Graça. Como se pode poupar quando não chega para pagar as despesas básicas? Infelizmente tenho acompanhado de perto este aumento do desemprego- que bate á porta de qualquer um, é bom não esquecermos - e é assustador e revoltante as situações por que tanta gente está a passar! Falasse muito das famílias mas conheço quem fique no desemprego, sem estar casado nem ter pais ricos...a vida muda toda de um dia para o outro. E depois este senhor vem brincar com as férias...palhaço. Bjs
ResponderEliminarOlá Carol
ResponderEliminarAlguém, já teve a oportunidade de cara a cara,perguntar a esse garoto.
- O Sr. sabe lá o que é a vida!
Sabes que tenho sempre mais genica no FB em relação a estas criaturas que nos desgovernam...não é preciso escrever muito! :-))
ResponderEliminarNão posso esquecer as palavras de uma senhora que conheço porque me passa à porta vezes sem conta quando me disse que este ano não tinha comprado lenha para a lareira porque tinha de poupar para comer e que se embrulhavam numa manta ao serão...
Ainda acrescentou que não vai visitar os pais que vivem em Vila Real para não gastar gasolina...não vê a filha e o neto também há muito tempo porque vivem no Barreiro...
Só o marido trabalha, ela está desempregada e o filho também e ainda estão a pagar a casa.
É esta família que vai poupar para ir de férias?!
Haja paciência para ouvir tanta barbaridade!
Abraço
O mesmo acontece aqui no Brasil, Graça! Senhores "desgovernantes" (gostei di termo e adoto-o) com seus poupudos salários e verbas extras para moradia, alimentação e vestuário... planos de saúde, os melhores... olham para o povo em épocas eleitorais, apenas! Nós é que deveríamos virar-lhes as costas e deixá-los falando sozinhos. Só assim perderiam toda essa mordomia!
ResponderEliminarAbraço, Célia.
Assino por inteiro o texto.
ResponderEliminarFico furiosa quando ouço essa do poupar e a de que vivemos acima das nossas possibilidades!!
Bons sonhos, Gracinha
Não sou dado a violências e elas nada resolvem mas cada vez que o ouço, bem protegido pela segurança, sobranceiro, arrogante, lembro-me logo do nariz do Berlozconi...
ResponderEliminarAndamos a dormir e, quando acordarmos, não temos país!...
ResponderEliminarDe forma descarada, prepotente e desumanizada esta cambada está a destruir tudo directa e indirectamente. Estão intencionalmente a deixar morrer os idosos, com as várias medidas que tomam, para não terem despesas com eles. Mas, estarei sempre à espera da justiça popular... há cada vez mais sinais do nojo que inspiram pelas vaias e não só... Pode ser que alguém que sofra de depressão não opte pelo suicídio.
A tua indignação deveria ser publicada na imprensa. Talvez assim o PM tomasse conhecimento do que os cidadaos pensam... Ou faria ouvidos de mercador...
ResponderEliminarAcho que a anedota está bem metida
ResponderEliminarNão não é do Salazar
é a foto exibida
Assino esta revolta e mais não digo pelo nojo que certas figuras no poder me fazem.
ResponderEliminarBrincam com a nossa desgraça e com a boa fé que o povo lhes deu-maioria.
É tempo de mudança !
Graça
ResponderEliminarAqui mesmo, numa das casas vizinhas, já se vive o drama. Firma pessoal fechada, ela desempregada porque houve seleção de pessoal, um filho no 11º ano e dois mais pequenos no básico. Rendas em atraso, dividas a fornecedores.
Valha-lhes a solidariedade de uns advogados ( pai e filho) que, também vizinhos, os estão a ajudar no que podem relativamente à área deles...
COMEÇA A HAVER MUITA FOME E TRAGÉDIA, por aqui.
Férias e poupança, que as engulam eles, que nos põem sem vermos um chícharo no prato...
Beijo
Chove em Leiria...lembro-me do célebre e doloroso "chove em Santiago",
ResponderEliminarFiquei emocionado, revolucionariamente emocionado, com o teor e fibra deste texto.
Uma autêntica exortação à resistência contra o "custe o que custar" temos que agradar, já, à alta finança internacional.
Pois, a verdade é que nos deixámos (frise-se bem; deixámos, numa passividade animal impressionante) levar a uma situação de rutura financeira nacional, mas também de valores éticos, morais e sociais de toda a ordem.
...
Alguém referiu o interesse em que estes desabafos chegassem aos ouvidos e olhos e sentimento dos nossos governantes, nossos mandatários.
E chegam, em muitos casos, que os nossos blogues estão referenciados, disso podem ter a certeza, sempre que nos manifestamos contra a situação.
Será para melhor perceberem o que nós sentimos? e em consequência o que eventualmente deverá ser mudado nas políticas sociais?
Graça, escrevi-lhe um e-mail a pedir autorização para que este seu artigo possa ser reproduzido no blogue do "Clube dor Pensadores", http://clubedospensadores.blogspot.com, um clube da máxima utilidade na participação cívica da sociedade em geral, nos mais variados aspectos, particularmente, na área política. Sim, que todos nós temos a obrigação moral de fazer política, no sentido em que somos uma parte dum todo que precisa de um governo que governe para todos e que não esqueça os que vivem abaixo da linha da miséria ou para lá caminham a passos largos.
Saudações revolucionárias!
(Não sou nenhum Che, muito pelo contrário, as mudanças na sociedade têm de ser ponderadas e não espingardadas, mas há momentos em que temos que fazer ouvir a nossa voz e fazer a nossa parte).
Concordo a 100%: só é possível poupar, sem passar necessidades de maior, se se tem um ordenado (bastante) acima da média. Agora vir o PM, armado em grande doutor, dar conselhos aos portugueses para fazerem poupanças, para lá de discurso bafiento e salazarento, quase parece que está a gozar com a nossa cara... :(
ResponderEliminarE será que não está?!
Beijocas!
Gostei deste texto.Está magnífico,mas...gastar,gastar..ir ao banco para ir de férias,etc,isso acabou.
ResponderEliminarZé
Caro amigo António, claro que pode usar este meus texto e qualquer outro que entender. É uma honra!
ResponderEliminarObrigada, amigos, por concordarem com este meu escrito.
Boa semana.
concordo plenamente! texto lúcido e claro.
ResponderEliminarabraço!
Obrigada, Humana. Beijinhos e ronrons também para a "gataria" e para o Lost.
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