Saltam os números a vermelho na
primeira página do jornal: 150 000 emigraram no ano passado! Já são números que
se aproximam dos registados nos anos 60 do século passado. Nesse tempo, os que
se aventuravam a dar o “salto” chegavam aos países da Europa – coisa que o
nosso não era – e, famintos de comer, de dinheiro, de civilização e de tudo o
mais, aceitavam os trabalhos “sujos” e difíceis que os cidadãos desses países
já não queriam realizar. Não é o caso atualmente. Felizmente. Não somos já
um povo faminto de educação, de cultura, de civilização. As condições alteraram-se
diametralmente. E mandam-nos emigrar! Mas será que há lugares disponíveis
para todos esses novos emigrantes desenvolverem as funções para que se
prepararam?
O senhor primeiro-ministro acha
que este país não é “para novos”. Mas “para velhos” também não será já que se
vão deixando desgastar-se e morrer dados os retrocessos sociais a que se tem
vindo a assistir.
Mas muito melhor do que eu, disse-o o
escritor, poeta e cronista Manuel António Pina na angustiante mas excelente
crónica que aqui deixo hoje.
Este país não é para jovens nem para
velhos
«O primeiro-ministro instiga os jovens a emigrar,
dizendo adeus ao país e àquilo que ele tem hoje para lhes oferecer: desemprego,
precariedade, humilhação quotidiana, ao que o secretário de Estado da
Juventude, um jovem da leva de boys que emigraram para o governo dotado
de particular sentido de humor negro, chama a sua (dos jovens) «zona de
conforto». Muitos dos que seguiram o conselho dormem agora, dizem jornais e
TVs, nas estações de caminho-de-ferro da Suíça ou são pedintes e sem-abrigo em
Inglaterra, e os mais felizardos arranjaram trabalho escravo na Alemanha e em
França. De qualquer modo, o problema já não é do governo português.
Os velhos são mais difíceis de exportar; é,
principalmente, mais difícil convencê-los a deixarem-se exportar. A solução, para
o país e o governo se verem livres também dos velhos, que só dão despesa, tinha
necessariamente que ser mais imaginativa.
Se o Governo fosse de comunistas, dar-lhes-ia a famosa
injecção atrás da orelha. A solução final neoliberal é mais «humana»: deixá-los
morrer (aos velhos pobres, porque os ricos podem comprar a vida) de morte por
assim dizer natural, como a Dra. Manuela Ferreira Leite defendeu na TV que
morressem os insuficientes renais com mais de 70 anos precisados de hemodiálise
e sem meios para a pagar, já que a hemodiálise custa um dinheirão e ocupa
médicos e enfermeiros pagos a peso de oiro com os descontos feitos à Dra.
Ferreira Leite e ao Dr. Eduardo Catroga.
Em duas semanas, 6100 pessoas, na sua maioria, segundo
o Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge, idosos com mais de 75 anos,
morreram em Portugal de frio e de gripe. O pneumologista Agostinho Marques,
director da Faculdade de Medicina do Porto, tem poucas dúvidas quanto às razões
do morticínio. Em declarações à Antena 1, apontou o facto de não só muitos
idosos pobres não se terem vacinado como, por falta de meios (sobretudo
atendendo aos brutais aumentos da electricidade e do gás), «não ligarem os
aquecedores», acabando assim por sucumbir de frio.
De facto, muitas das «poupanças» que o Dr. Paulo
Macedo tem feito na saúde, do fecho de postos e unidades hospitalares aos
aumentos das taxas moderadoras e aos obstáculos financeiros colocados ao
transporte de doentes crónicos, atingem sobretudo doentes idosos sem recursos
ou com pensões de miséria, muito em particular os que residem em regiões do
interior do país onde os políticos só vão de quatro em quatro anos quando abre
a caça ao voto. Tudo junto com as «poupanças» nas prestações sociais, não era
difícil prever o destino que uma política de austeridade dirigida quase
exclusivamente aos sectores mais vulneráveis da população reservaria aos idosos
pobres.
Vistas as coisas friamente e do ponto de vista da
«economia de mercado» neoliberal dominante, para a qual a saúde é, como diz a
Dra. Ferreira Leite, um direito de quem pode pagá-la, menos 6100 reformas ou
rendimentos sociais de inserção são uma boa notícia para o défice do Dr. Vítor
Gaspar. E, se o vírus da gripe continuar por aí ainda durante uns meses, a boa
notícia será decerto substancialmente melhor.
Entretanto, para os de saúde mais resiliente, o
Ministério da Segurança Social anunciou o milagre da multiplicação: mais dez
mil camas em lares da terceira idade sem gastar um tostão com a construção de
mais lares nem com mais quartos nos lares existentes, mas... mandando pôr outra
cama nos quartos onde hoje já se amontoam três ou quatro idosos.
Se este país não é para jovens nem para velhos, para
quem é, afinal, este país?»
Para onde emigraram?
ResponderEliminarLi, e li também o texto de Gonçalo M. Tavares... essa revista do DN salva o jornal, que está mal... muito mal... Mas quanto ao seu post, se não se põe a pau fica cá sozinha... a palavra de ordem é pirar daqui para fora. Mas... não desespere, terá a minha companhia.
ResponderEliminarObrigada, Rogério, pela companhia...
ResponderEliminarAté me comovi com o artigo, por ser tão verdadeiro e dizer a verdade sem papas na língua! Este país é só para esta cambada que nos governa se encher de massa e preparar o terreno para empregos de pouco trabalho e de ordenado milionário no futuro! Por causas destas a Maria Antonieta perdeu a cabeça. Às vezes tenho pena de hoje sermos tão "civilizados"...
ResponderEliminarBeijocas!
ps - gostei muito das fontes do post anterior - bonitas fotografias!
Eu até me oferecia voluntariamente para lhes ir fazer a mala lol
ResponderEliminarBjos
Pus essa malfadada notícia no FB! :-((
ResponderEliminarQuerem que emigrem os novos e que morram os velhos!
Subscrevo!
Emigrem eles ou voltem de onde vieram!
Abraço
As fontes são bonitas e este teu texto uma maravilha!!
ResponderEliminarAbraço-te
Com bilhete só de ida.
ResponderEliminarBom fim de semana Carol
Beijinho e uma flor
Hoje nem encontro um pouco de ironia para comentar,como é meu hábito.Só dor,raiva,ranger de dentes.
ResponderEliminarSempre atenta a despertar a atenção,Carol.Bem hajas.Kinkas
Quando todas as forças de trabalho emigrarem terão que negociar novas tranches do empréstimo para pagar as pensões aos reformados e os ordenados dos políticos que não sabem fazer mais nada senão viver "à conta".
ResponderEliminarAndo com pouca vontade de falar de política. Este Governo não merece que falemos deles nem da "sua política".
Bom fds
E eu, já descrente nos homens, ponho-me a olhar pelo jardim/quintal cá de casa, a ver se as couves crescem mesmo sem água, tenho uns repolhos que são um regalo, que remédio, aproveito a água do lava-louças, e mais alguma por aqui e por ali, a ver se consigo fazer a minha parte e poupar no precioso líquido...
ResponderEliminarE estes gandulos lá andam todos entretidos com o seu congressito, convencidos que os estamos a ouvir, tolos que eles são, que se preparem para perder estrondosamente as próximas eleições, se houvesse um Presidente da República com os coisos no sítio, se calhar até teríamos eleições antecipadas, mesmo com polícia a "defender" a democracia do snr alberto joão, etc etc
Estou zangado, isto está mesmo mal, assim não vamos a lado nenhum, lá voltamos a ouvir o disco de sempre, deve estar riscadíssimo de certeza,
- aqueles malandros do governo anterior, tão incompetentes que eles foram, nós cá andamos a tapar buracos para depois começarmos então a pôr a economia a funcionar, para se poder voltar a remunerar o trabalho com ganhos de produtividade, bla bla bla
Balelas...
Entretanto
o dinheiro continua
a circular
em sentido
único...
Obrigada, Kinkas e todos! Tanta gente para lhes fazer as malas... Era bom, era!
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