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terça-feira, 25 de agosto de 2020

Uma data que nunca esqueço...

 25 de Agosto de 1988 - uma data que nunca esqueço. Do grande incêndio do Chiado, a zona de referência da minha infância, adolescência e juventude.

A minha zona das compras com a minha mãe; a Rua do Carmo, a Rua Garrett, as lojas onde nos conheciam: o Eduardo Martins, os Tecidos do Carmo, a Sapataria Hélio, o Ramiro Leão, o Último Figurino, o Aguiar, os Davids - a loja de fazendas escocês para fazermos os kilts, as Livrarias, a saudosa Sá da Costa, a velha Bertrand; as discotecas: a Melodia, a Sassetti, a Valentim de Carvalho.






Anos depois - poucos - as compras com a minha mãe, enquanto o marido ficava a ler o jornal e a entreter as filhas na rua.... 

Mais ou menos assim...



E,depois, num final de Agosto, de fim de férias em São Pedro de Moel, entra-me casa dentro uma outra amiga lisboeta de alma e coração a chorar porque soubera que o seu, o nosso Chiado estava em chamas...

Ligámos a televisão e todo o dia chorámos ela, eu e a minha mãe por aquele pedaço de Lisboa tão nosso, tão carismático, tão vivido.  E não deu mais para esquecer...





Não por isso (mas também) posso afirmar sem sombra de dúvida que esse ano de 1988 foi o pior ano da minha vida: passado pouco mais de um mês, morreu-me a minha (ainda jovem) mãe, meu amparo, minha força e, pouco antes vimos ruir a empresa de família por obstinado capricho de um gerente de banco (não só por isso, mas também...)

Não dá para esquecer...

(As imagens foram retiradas do google; algumas do excelente blog Restos de Colecção)

segunda-feira, 1 de junho de 2020

Obituário


Há 130 anos, em 1 de junho de 1890, Camilo suicida-se com um tiro na cabeça, ao perceber que está cego e sem cura.





(Surripiado do facebook do meu amigo Alfredo Barroso)

sexta-feira, 22 de maio de 2020

Dia do Autor Português

(daqui)


O Dia do Autor Português, instituído em 1982, é comemorado no dia 22 de maio (este dia assinala igualmente o aniversário da Sociedade Portuguesa de Autores) e pretende homenagear os autores portugueses nas mais diversas áreas artísticas como a pintura, a literatura, a poesia, a música ou o cinema que têm contribuído para o enriquecimento da cultura portuguesa com as suas criações e distinguir aqueles que se destacaram na defesa e promoção dos direitos de autor.



E porque eu leio essencialmente autores portugueses e porque gosto muito de poesia e porque ontem foi Dia da Espiga, dia de ir apanhar a espiga e papoilas, as rubras papoilas, das quais eu também muito gosto, aqui fica, em homenagem aos autores portugueses, este belo poema de Cesário Verde - autor que em muito influenciou a poesia dos modernistas Fernando Pessoa e outros.


DE TARDE

Naquele «pic-nic» de burguesas,
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.

Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão-de-bico
Um ramalhete rubro de papoulas.

Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, inda o sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos,
E pão de ló molhado em malvasia.

Mas, todo púrpuro, a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas.

(segunda metade do século XIX)

segunda-feira, 18 de maio de 2020

Dia Internacional dos Museus

Para lembrar a efeméride - que se celebra desde 1977 - deixo aqui uma pequena parte da visita ao Museu da Vista Alegre, em Ílhavo, último museu que conheci ainda com o meu companheiro de uma vida...

Para quem gosta de porcelanas - e eu adoro! - é imprescindível esta visita.






(O antigo forno)


(Dentro do forno)








As novas tendências do século XX







(Art Noveau)






























Quem pode resistir à coleção de chávenas?!







(O tinteiro)

(A capela)








E muito mais haveria para mostrar...

terça-feira, 12 de maio de 2020

A caminho de Fátima

Na falta de quem nos descreva hoje os caminhos para Fátima vazios de peregrinos, ficam aqui uns fragmentos da excelente descrição saramaguiana. Vale a pena ler.

[Era o 12 de Maio de 1936. O Dr. Ricardo Reis resolve ir a Fátima «por curiosidade» - diz ele a Lídia. O certo é que ia ver se encontrava Marcenda.]

«Na estação de Fátima o comboio despejou-se. Houve empurrões de peregrinos a quem já dera no rosto o perfume do sagrado, clamores de famílias subitamente divididas, o largo fronteiro parecia um arraial militar em preparativos de combate. A maior parte destas pessoas farão a pé a caminhada de vinte quilómetros até à Cova de Iria, outras correm para as bichas das camionetas de carreira, são as de perna trôpega e fôlego curto, que neste esforço acabam de estafar-se. O céu está limpo, o sol está forte e quente. Ricardo Reis foi à procura de um lugar onde pudesse almoçar. Não faltavam ambulantes a vender regueifas, queijadas, cavacas das Caldas, figos secos, bilhas de água, frutas da época, e colares de pinhões, e amendoins, e tremoços, mas de restaurantes nem um que merecesse tal nome, casas de pasto poucas e a deitar por fora, tabernas onde nem entrar se pode, precisará de muita paciência antes que alcance garfo, faca e prato cheio. (…)´

Uma camioneta buzinava roucamente a chamar para os últimos lugares, Ricardo Reis deu uma corrida, conseguiu atingir o assento, alçando a perna por cima dos cestos e dos atados de esteiras e mantas, excessivo esforço para quem está em processo de digestão e afracado do calor. Sacolejando muito, a camioneta arrancou, levantando nuvens de poeira da castigada estrada de macadame. O motorista buzinava sem descanso para afastar os grupos de peregrinos para as bermas, fazia molinetes com o volante para evitar as covas da estrada, e de três em três minutos, cuspia fragosamente pela janela aberta. O caminho era um formigueiro de gente, uma longa coluna de pedestres mas também carroças e carros de bois, cada um com seu andamento, algumas vezes passava roncando um automóvel de luxo com chauffeur fardado. (…)

A maior parte desta gente vai descalça, algumas levam guarda-chuvas abertos para se defenderem do sol, são pessoas delicadas da cabeça, que também as há no povo, sujeitas a esvaimentos e delíquios. (…)  as mulheres transportam à cabeça cestos de comida, uma que outra dá de mamar ao filho enquanto vai caminhando. (…) com o calor, os rostos ficam negros, mas as mulheres não tiram os lenços da cabeça, nem os homens despem as jaquetas, os casacões de pano grosso, não se desafogam as blusas, não se desapertam os colarinhos, este povo ainda tem na memória inconsciente os costumes do deserto, continua a acreditar que o que defende do frio defende do calor, por isso se cobre todo como se se escondesse.

Este é o lugar. A camioneta para, o escape dá os últimos estoiros, ferve o radiador como um caldeirão no inferno, enquanto os passageiros descem. (…) Ricardo Reis junta-se ao fluxo dos peregrinos. (…)

É um mar de gente. Ao redor da grande esplanada côncava vêem-se centenas de toldos de lona, debaixo deles acampam milhares de pessoas, há panelas ao lume, cães a guardar os haveres, crianças que choram, moscas que tudo aproveitam. Ricardo Reis circula por entre os toldos, fascinado por este pátio dos milagres que no tamanho parece uma cidade, isto é, um acampamento de ciganos, nem faltam as carroças e as mulas, e os burros cobertos de mataduras para consolo dos moscardos. (…)

(José Saramago, O Ano da Morte de Ricardo Reis, 1985)








sábado, 9 de maio de 2020

O Mito da Europa

Hoje celebra-se o Dia da Europa – da Europa Unida (ou não…) – não da Europa da poesia e do mito.

 E…

… nada como a Grécia Antiga, berço de toda a nossa civilização ocidental, para nos contar histórias de encantar como é esta do Rapto da Europa.

Filha de Agenor e de Telefassa, esta Europa foi amada por Zeus.

Zeus viu Europa brincar com as suas companheiras na praia de Sidon ou de Tiro, no reno de seu pai. Apaixonado pela sua beleza, transformou-se num touro de resplandecente brancura e cornos semelhantes a duas luas na fase de quarto crescente. Aproximou-se assim da jovem, indo deitar-se a seus pés.

Primeiro, Europa assustou-se, mas pouco depois, tomando coragem, acariciou o animal, sentando-se sobre o seu dorso.

Logo o touro se levanta, correndo em direção ao mar. apesar dos gritos da jovem, que se agarrava aflita às hastes do animal, ele avança por entre as vagas e vai-se afastando da margem.

Chegam ambos a Creta, onde junto a uma fonte, em Gortina, Zeus consuma o seu amor pela jovem, à sombra dos plátanos que, em memória desta paixão, obtiveram o privilégio de nunca perderem as folhas.

Europa teve de Zeus três filhos: Minos, Sarpédon e Radamente. Em trica, Zeus ofereceu-lhe três presentes: deu-lhe Talo, o homem de bronze que guardava as costas de Creta, impedindo o desembarque de estranhos; entregou-lhe um cão que nunca deixava escapar presa alguma e ainda uma lança de caça que jamais falhava o alvo.

Depois casou-a com Astérion, rei de Creta que não tendo filhos, adotou os de Zeus.

Após a sua morte, Europa recebeu honras divinas. O touro em que o deus se metamorfoseara tornou-se uma constelação e foi colocado entre os signos do Zodíaco.

(in Dicionário de Mitologia Grega e Romana, Pierre Grimal, Difel Ed, 1992)


O Rapto da Europa
daqui

Agora a análise do mito e respetiva leitura transcendental cabe a cada um de nós/vós...



terça-feira, 5 de maio de 2020

Dia Mundial da Língua Portuguesa

espanto é o tema do livro de Raul Brandão que ando a ler, Húmus. Foi publicado em 1917, em inícios da fase Modernista e - na minha modesta opinião - nada fica a dever às obras modernistas, até mesmo em relação ao Livro do Desassossego de Pessoa/Bernardo Soares. 

Neste campeia o desassossego; em Húmus, campeia o espanto.


«E ainda o que nos vale são as palavras, para termos a que nos agarrar.»

«Na aparência é a insignificância a lei da vida; é a insignificância que governa a vila.»

«Só a insignificância nos permite viver:»

«A vila é um simulacro. Melhor: a vida é um simulacro

«Em certas ocasiões, se as palavras e a insignificância desaparecessem a via, só ficava de pé o espanto.»

(fragmentos de «Húmus» de Raul Brandão, 1917)

....

Espanto foi o que eu, já nesse tempo amante da bela Língua Portuguesa, senti quando, aí pelos meus 17 anos li, pela primeira vez, aquele que ainda hoje considero um dos mais belos textos escritos em português e que hoje deixo aqui como homenagem à nossa bela Língua Portuguesa.

«Pede-se a uma criança: Desenha uma flor! Dá-se-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais ninguém. Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direcção, outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas que o papel quase não resistiu. Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já era demais. Depois a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: Uma flor! As pessoas não acham parecidas estas linhas com as de uma flor! Contudo a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas, são aquelas as linhas com que Deus faz uma flor!»

 (Almada Negreiros)



domingo, 3 de maio de 2020

Mãe!

(Maternidade - Almada Negreiros)



Confidências

Mãe! eu não sei nada! Eu não me lembro de nada!
Ah! lembro-me!
Lembro-me de ter ajudado a levar pedras para as pyramides do Egypto!
Tambem me lembro de me ter chamado José, antigamente, com meus irmãos
e uma mulher!

Mãe!
Estou a lembrar-me! Tu já fôste a menina loira! Eu já fui o menino
verdadeiro a quem tu davas de mamar! Eu já estive comtigo na terceira
oleografia!
Lembro-me exactamente! Quando tu me beijavas, o sol não doía tanto
na minha pelle!

Mãe!
Estou a lembrar-me!
E as tardes quando iamos todos juntos soltar palavras no caes e vêr
chegar mais laranjas!

Outras vezes juntavamo-nos na praia para nadar melhor do que os
outros e deixar o sol queimar quem mais merecêsse. Já as laranjas
estavam contentes com o que chegasse primeiro! O melhor jovem ganhava
a melhor rapariga. Os outros sabiam aquella que tinham ganhado. Eu
tinha ganho a minha!

(…)

Mãe!
Vem ouvir a minha cabeça a contar historias ricas que ainda não
viageie. Traze tinta encarnada para escrever estas coisas! Tinta
côr de sangue, sangue! verdadeiro, encarnado!
Mãe! passa a tua mão pela minha cabeça!
Eu ainda não fiz viagens e a minha cabeça não se lembra senão de
viagens! Eu vou viajar. Tenho sêde! Eu prometo saber viajar.

Quando voltar é para subir os degraus da tua casa, um por um. Eu
vou aprender de cór os degraus da nossa casa. Depois venho sentar-me
a teu lado. Tu a cosêres e eu a contar-te as minhas viagens, aquellas
que eu viagei, tão parecidas com as que não viagei, escritas ambas
com as mesmas palavras.

Mãe! ata as tuas mãos às minhas e dá um nó-cego muito apertado!
Eu quero ser qualquer coisa da nossa casa. Como a meza. Eu tambem
quero ter um feitio, um feitio que sirva exactamente para a nossa
casa, como a meza.
Mãe! passa a tua mão pela minha cabeça!
Quando passas a tua mão na minha cabeça é tudo tão verdade!

(in Invenção do Dia Claro, Almada Negreiros, 1921)


(daqui)    Almada Negreiros ao colo da mãe, Elvira Sobral de Almada Negreiros, 1894