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sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Aparências

Tive umas tantas cadeiras com ele – ele em Românicas e eu em Germânicas (entrámos na Faculdade no mesmo ano, 1966) a primeira das quais, «Introdução aos Estudos Linguísticos», regida pelo pai, o saudoso Professor Lindley Cintra. Nesse tempo, ninguém falava nas aulas, pelo que quase nem me lembro de lhe ouvir a voz ou notar a atitude (ao contrário do Júdice, o poeta, que por vezes era solicitado pelo professor.)

Como não sou pessoa de teatro (desculpe-se-me a insensibilidade ou a incultura) nem apreciadora das fitas de Manoel de Oliveira, não lhe segui a carreira, sabendo de longe que era gente de vulto na “alta cultura”, contracenando com os grandes lá de fora – a linda e sensual Deneuve, o Malkovich, o da voz de veludo – e pouco mais.

Soube que vinha aqui ao Mosteiro da Batalha numa noite de Outubro fazer a leitura do Livro Eclesiastes na tradução do nosso infeliz humanista do século XVI Damião de Góis e lá nos abalámos para o ouvir.







Muito bem lido, muito bem representado, mas devo dizer que não gostei da atitude, da distância que manteve do muito público que ali se deslocou – como se tivesse provido de uma máscara. Grega. Vim algo desiludida.

Hoje li por alto – não gosto de ler entrevistas – uma longa entrevista que deu ao Jornal de Leiria e continuei e ficar com um sentimento de não simpatia pelo que afirma, ou melhor, pela forma como afirma, como transmite as suas ideias, as suas opiniões. Sempre de cima para baixo – parece-me – sempre com uma ponta de sobranceria, um pouco pedante até.

«Acho o livro Eclesiastes particularmente adequado a um recinto sobre a vaidade, um mosteiro erguido em honra de um rei para festejar uma vitória militar sobre outras pessoas.»

«Não voto porque acho evidente que o sistema político e eleitoral é uma farsa. As próprias pessoas que votam neles não lhes reconhecem autoridade como representante. Pessoas da minha geração que sonharam que o sistema político corresponderia a uma mudança sentem-se tristes, desconsoladas. No meu caso, fiquei sempre de fora, recusei tudo. Como sou artista, acho que faz mais sentido colaborar intervindo individualmente (…)»

E diz que voltou a ser católico – agora que foi envelhecendo e ficando doente – «com uma espécie de raiva por não ter entendido que era uma estupidez afastar-me da igreja.» E que se revê no Papa Francisco «pela simpatia, pela simplicidade, pela negação de tudo o que são acrescentos moralistas à verdade essencial.»

Pois eu fico com a sensação que o Luís Miguel Cintra é – ou pelo menos aparenta ser – tudo o que o Papa Francisco não é.


O pai dele, esse sim, terá sido bem mais parecido com o atual Papa. Pela sua simpatia, pela sua simplicidade, pela generosidade das suas atitudes, das suas crenças, dos seus valores, dos seus comportamentos.

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Menino do Bairro Negro

Foi a escolha de António Arnaut no final da entrevista que aquele Homem de fibra, socialista e republicano, nas suas próprias palavras, concedeu a Maria Flor Pedroso na Antena 1 esta manhã. Foi uma verdadeira lição de política enquanto ciência ou arte (não sei bem), uma lição de cidadania e de democracia dada com toda a humildade e singeleza. Só por isso vale a pena ouvir.

E, no fim, a sua escolha musical: José Afonso, o nosso possível Nobel da Literatura – disse eu ao ouvir. O que já fora dito pelo entrevistado e eu não ouvira… Gosto quando chego a conclusões iguais às de pessoas sabedoras.

Uma escolha emotiva.Uma boa escolha.



sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Entrevistas de Verão

Não gosto de ler entrevistas. Aborrecem-me. Aborrecem-me se são longas pela dispersão das temáticas. Aborrecem-me se são breves por serem, a maior parte das vezes, áridas ou tontas. Prefiro sempre um bom artigo sobre a pessoa em questão ou um texto escrito pelo próprio acerca do(s) tema(s) que se querem ver tratados. Desse modo, não temos de lidar com as interrupções do entrevistador – que muitas vezes corta o fio do discurso e do pensamento do entrevistado – e com as suas muitas vezes acidentadas mudanças de rumo. Além disso, é frequente os entrevistadores não estarem ou serem bem preparados para a abordagem dos assuntos e até mesmo para a abordagem ao entrevistado.

Abro exceção para algumas entrevistas passadas na revista Ler sobre literatura, grande parte delas traduzidas do inglês ou do francês, e que são feitas por quem sabe muito do tema. Não se espraiam a falar de onde nasceu e de como a infância o/a influenciou na escrita, são verdadeiros artigos sobre literatura.

Isto vem a propósito das entrevistas de verão que o jornal DN tem feito a escritores e pessoas da ciência e da política. Claro que não me ative – e perdoe-se-me a arrogância – a ler num uma linha da entrevista ao “pisca-olho” do Rodrigues dos Santos, mas dei uma vista de olhos pela entrevista à escritora Dulce Maria Cardoso – de quem li e gostei de lei O Retorno – e achei de uma superficialidade incrível.

Pior, ou talvez não, foi ler a entrevista de ontem ao cientista João Magueijo, um físico de caráter algo estilhaçante que trabalha no Imperial College London. O que doeu foi constatar a grandeza de pensamento do cientista (que também tem livros editados fora da ciência embora não dentro da ficção) e a pequenez de espírito do entrevistador. A entrevista pretendeu ser abrangente, sem se ater apenas aos aspetos científicos (em que o entrevistador devia estar a léguas de distância do físico – e isso é o menos) mas que ficou muito aquém nos aspetos políticos (sobre o brexit nomeadamente) e sobre conceitos como a dualidade esquerda/direita que notoriamente “baralhou” o entrevistador. Este não teve a humildade de deixar o cientista transmitir um pouco do seu pensamento – que é o interessante numa entrevista já que é assim que aprendemos e alargamos os nossos horizontes – e, por outro lado, com algumas das suas perguntas “pequeninas” deu azo a que o respondente lhe desse algumas “patadas” e a respostas de que não estaria à espera nem gostaria de ter ouvido.

Se estiverem na disposição de ler a entrevista poderão fazê-lo aqui.

João Magueijo

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Exame ou não-exame: that is the question...

No nosso país há dois temas que toda a gente se acha no direito de comentar (ou mandar uns bitaites…): o futebol e a educação.

Os jornais e os noticiários desdobram-se em artigos, comentários e opiniões sobre a educação, mas, ao contrário do que acontece com a economia – em que vão buscar especialistas nem que seja à China (?!) – raramente se fazem valer de (verdadeiros) especialistas em educação.

Ontem, espantei-me com uma entrevista feita ao Professor Joaquim Azevedo que o DN promoveu e publicou. O título, só por si, (não me dando embora grande novidade) é francamente inspirador: “O nosso modelo escolar é do séc. XVIII e não está adaptado à realidade”. Depois de dizer muito simplesmente que o modelo está esgotado e que há mais de vinte anos que se sabe que está esgotado, afirma que o problema da educação - que se centra na desatenção e no desinteresse dos alunos pelas matérias escolares que provocam desmotivação e indisciplina - não passa, nem de perto nem de longe, pela realização ou não de exames. A propósito desta «guerra» dos exames e da avaliação formativa, diz que, no seu trabalho pelas escolas, vê que os professores só sabem é classificar (não avaliar…)

Sobre isto menciona o novo modelo de educação implementado na Finlândia e nos colégios jesuítas da Catalunha que rompe completamente com toda a organização letiva passando a estruturar o processo de ensino-aprendizagem a partir de temas que interessem aos alunos. Porém, todo este processo está a ser preparado na Finlândia há trinta anos tendo-se começado a investir nos professores, mudando a formação inicial e as regras de funcionamento da profissão docente. Adaptando esta questão ao nosso país, expõe a forma como se poderia começar a preparar por cá a implementação deste modelo. E, para isso, propõe que a nota mínima de acesso à profissão docente deveria ser 16. Exigir ao nível do que se exige para a Medicina.

Mas a entrevistadora – Ana Sousa Dias – insiste na questão dos exames ou não-exames que muitos dizem que tem a ver com a permissividade e a indisciplina. Ao que o Professor contrapõe: «Isso é uma conversa estafada. Essas tensões existem mas o problema não é esse. É uma mistificação, porque um sistema com exames pode ser altamente permissivo. Ficam bem os que ficam bem no exame. E os outros? Em Portugal, aumentou imenso, nos últimos anos, a retenção no 2.º ano. Porquê? Pelo efeito do exame. Mas aprende-se melhor? Temos de ir um bocadinho mais atrás, mais longe. Esse tipo de discussão cansa-me, não conduz a nada. Vivemos num mundo de faz de conta: faz de conta que escola funciona bem; faz de conta que os exames são bons para os alunos aprenderem; faz de conta que os professores ensinam bem; faz de conta que a legislação que o ministério põe cá fora é eficaz e que os professores e as escolas a seguem, faz de conta que existe avaliação formativa.»

A questão que eu ponho é a seguinte: sendo o Professor Joaquim de Azevedo um homem da área político-partidária mais próxima do PSD, e com os conhecimentos profundos que «ganhou» com os seus estudos e experiência no âmbito das Ciências da Educação, porque não conseguiu pôr algum juízo na cabeça no ministro (C)rato?

O que se tinha evitado!!