sexta-feira, 31 de julho de 2020

E agora o oposto: «o que importa é não ter medo»


Afinal o que importa não é a literatura nem a crítica de arte nem a câmara escura

Afinal o que

importa não é bem o negócio

nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio

Afinal o que

importa não é ser novo e galante

- ele há tanta maneira de compor uma estante

Afinal o que

importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício

e cair verticalmente no vício

Não

é verdade rapaz? E amanhã há bola

antes de haver cinema madame blanche e parola

Que afinal

o que importa não é haver gente com fome

porque assim como assim ainda há muita gente que come

Que afinal

o que importa é não ter medo

de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:

Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal

o que importa é pôr ao alto a gola do peludo

à saída da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora!

– rir de tudo

No riso admirável

de quem sabe e gosta

ter lavados e muitos dentes brancos à mostra


Mário Cesariny


(De uma tremenda ironia!!! Mas muito bom!)


                                                                 (daqui)
 

quinta-feira, 30 de julho de 2020

Congresso Internacional do Medo

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,

não cantaremos o ódio, porque este não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte.
Depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas


Carlos Drummond de Andrade




(Da próxima vez, trarei um outro poema de um outro excelente poeta que diz completamente o contrário...

É que, como costumava dizer aos meus alunos, em poesia (e na linguagem poética) tudo é possível, tudo se aceita...)

domingo, 26 de julho de 2020

Ídolos do "nosso tempo"...

Ídolos do século assado para animar o domingo (mais um...) do nosso confinamento...

Espero que gostem.




quinta-feira, 23 de julho de 2020

terça-feira, 7 de julho de 2020

A maldição da formiga e da cigarra




Que fique desde já muito claro que eu sempre fui pela cigarra e que a sonsa da formiga sempre me enervou... 

Trouxe a ideia do blog do Centro Nacional de Cultura que tem sempre textos muito bons e depois lembrei-me que o poema do nosso excelente surrealista Alexandre O'Neill foi cantado pela Amália, cujo centenário de nascimento está a celebrar-se.

Por isso, aí vai:


MINUCIOSAS FORMIGAS, CIGARRAS GAITEIRAS

«Minuciosa formiga
não tem que se lhe diga:
leva a sua palhinha
asinha, asinha.

Assim devera eu ser
e não esta cigarra
que se põe a cantar
e me deita a perder.

Assim devera eu ser:
de patinhas no chão,
formiguinha ao trabalho
e ao tostão.

Assim devera eu ser
se não fora não querer».


E agora a Amália  (sem fado...)




O poema de Alexandre O’Neill merece atenção especial, sobretudo neste momento em que o debate lusitano sobre a pandemia Covid-19 se torna uma grande encenação de passa-culpas. Como é hábito antigo, passamos rapidamente dos melhores do mundo para os piores. Do milagre para a maldição… Ora formigas, ora cigarras – e esquecemo-nos que somos, sempre fomos, as duas realidades como toda a gente. Felizmente! E razão tem o Alexandre O’Neill – “Assim devera eu ser / se não fora não querer”. (...)

Temos de cuidar dos exemplos das minuciosas formigas e das gaiteiras cigarras. Ou seja, temos de saber ser formigas gaiteiras e cigarras minuciosas. Que é a arte senão o sentimento e o cuidado?  (...)

Esopo ensina-nos sim que a vida não pode esquecer o outro lado das coisas. Daí as representações pedagógicas do mundo às avessas. Poderia a formiga viver sem a música das cigarras? Poderia a cigarra viver sem o trabalho das formigas? Claro que não. Uma fábula é um paradoxo ilustrado. Temos sempre de a ver o direito e o avesso… (...)

[com o Covid] Tudo pode ser mais simples – se redobrarmos as cautelas e se soubermos ser boas formigas e melhores cigarras…



quarta-feira, 1 de julho de 2020

Máscaras!

Agora é só escolher...