quarta-feira, 3 de novembro de 2010

A Camioneta Fantasma



Às vezes, detenho-me a ver nos jornais as percentagens das audiências dos programas de televisão . É um bom indicador dos nossos gostos, da nossa maneira de ser.

No outro domingo atrás foi, no mínimo, surpreendente (e assustador) verificar que a chamada gala da Casa dos Horrores – eu bem sei que é a Casa dos Segredos, mas parece-me mais real chamar-lhe Casa dos Horrores porque este reality show (como se diz agora; até parece que a nossa língua não é suficientemente rica em vocabulário para termos de usar as expressões inglesas...) é realmente um verdadeiro horror a todos os níveis! – liderava a tabela, sem qualquer contestação, com 14% de audiência média (43,6% de share, seja isto o que for...) à frente dos (abomináveis) Ídolos da SIC, do jogo do Sporting (e se fosse do Benfica era a mesma coisa!), dos telejornais, etc., etc..

Mas, o que me deixou mais contrariada foi o facto de o último programa da tabela, com apenas 5,8% de audiência e 14,4% de share, fosse o mini-filme histórico “Noite Sangrenta” que o canal público passou em dois episódios emitidos no sábado e no domingo que muito me agradou (aliás tem passado vários filmes desta série sobre acontecimentos históricos da 1ª República) e que versava os acontecimentos trágicos da noite sangrenta de 19 de Outubro de 1921, em que a chamada Camioneta Fantasma liderada por um simples cabo do Exército arrebanhou, de suas casas e da forma mais vil, alguns dos mais notáveis homens da implantação da República, assassinando-os sem se saber, até hoje, a mando de quem.

O meu espanto e o meu desagrado têm a ver com dois aspectos principais: um é que estamos constantemente a ouvir dizer que a nossa História tem tantos episódios tão interessantes para se fazerem peças de teatro e novelas e filmes e sei lá o que mais para instruir as pessoas e dar-lhes a conhecer o nosso passado e, no fim, quando se faz alguma coisa nesse sentido e até com alguma qualidade, há “meia-dúzia” de bem intencionados que vêem o programa.

Por outro lado, e este é o aspecto que menos abona a nosso favor, é que está meio país embasbacado com os insanes desacatos de uns tantos jovens homens e mulheres, todos bem apessoados e vestidos/despidos à moda, diga-se, para atraírem o ”pessoal”, mas de uma boçalidade e de um baixo nível que nos deixam, no mínimo, envergonhados!

Não pretendo armar-me em moralista ou coisa parecida porque é coisa que nunca fui; nem me escandaliza o nosso voyeurismo (aí vai outro estrangeirismo...) que faz parte da natureza humana (lembro-me que me diverti um bocado com os primeiros Big Brother); mas contraria-me o facto de aquelas pobres ”marionetas” terem sido escolhidas pelas suas características mais baixas e mais negativas de forma a dramatizarem com a maior naturalidade os sentimentos e os valores mais baixos da escala, como sendo a mentira, a desconfiança, a inveja, o engano, o fingimento, a traição e sei lá o que mais, tudo rodeado de grandes festas fictícias – as galas – e de uma grande alegria mascarada.

Há, com toda a certeza, outras formas menos perniciosas de divertir as pessoas.

1 comentário:

  1. Também lhe chamo "A Casa dos Horrores" e não entendo essas e outras audiências...
    Assim se mantém o povo acéfalo! :-((
    Fiquei impressionada com essa mini-série!

    Abraço

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