quarta-feira, 10 de maio de 2017

Morreu o BB

Foi com grande espanto e alguma consternação que ontem recebi a notícia do desaparecimento do grande jornalista, cronista e também escritor Baptista-Bastos.

Sabe, quem generosamente frequenta este meu espaço, que para aqui transcrevi muitas das suas crónicas que ele escreveu enquanto não foi ignominiosamente despedido do Diário de Notícias.

Como gostava da sua forma elegantemente escancarada com que ele desferia as suas setas certeiras contra quem, durante os últimos anos, comprimiu e quase quis açaimar este nosso país, este nosso povo ainda e sempre tão necessitado de quem lhe mostre o caminho.

Fazia-o de forma desassombrada mas algo pedagógica, usando o seu estilo fluente mas preciso, chamando as referências históricas, literárias e políticas mais penetrantes e mais esclarecidas, num vocabulário rico, elaborado mas bem truculento, e com a sintaxe de quem estudou (ou não) latim.

Que era assaz duro e que tinha mau feitio. Se calhar assim era. Mas defeitos todos temos, desenganem-se aqueles que assim não se julgam.

Sobre si próprio (e de mais um punhado de outros jornalistas dessa era que fundaram o semanário O Ponto) escreve BB que se tratava de «um singelo sonho de liberdade acalentado por um grupo de jornalistas que de seu só possuía a honra jamais hipotecada e a ingénua convicção de que as palavras (sempre de recusa, sempre de protesto, sempre exaltantes) poderiam ser integradas na grande voz colectiva e aceites pelas minorias sem voz.» E acrescenta que a escrita, a sua e a de outros jornalistas como ele, «é um tributo ao sonho e à esperança. Sonho e esperança de que o homem está sempre em questão, é sempre questionável, deve ser questionado, e que legitima, devido às suas constantes dúvidas, todas as questões. E também porque o homem em questão coloca como ponto prévio, antes de tudo e se necessário contra todos, a questão da liberdade.» (in “Um Homem em Ponto – Entrevistas por Baptista-Bastos, 1984)

É assim que eu penso. E (também) por isso, lamento tanto a perda.





14 comentários:

  1. Abri o computador e dei com esta triste notícia aqui.

    Também lhe quero prestar homenagem no "ematejoca azul", embora neste momento ainda esteja sem palavras.

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  2. Um homem íntegro, sem papas na língua.
    Além da obra, deixa-nos uma enorme dose de valores.
    Que descanse em paz.

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  3. Recordo-o sempre pronto para a briga, quer fosse à estalada (a própria), quer fosse na escrita, quer oralmente, defendendo sempre as suas convicções.
    Morreu (mais) um homem livre.
    Nunca incompreendido, (porque ele explicou-se sempre muito bem); incómodo sim, porque dizia o que pensava e (quase) sempre com razão.
    E, como sabemos, quem com razão sabe do que fala raramente é "apreciado".
    Morreu, mas só fisicamente.
    As tuas ideias, as tuas lutas, as tuas revoltas, não morreram contigo.

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  4. Era um homem que incomodava por ser vertical e de esquerda. O seu modo peculiar despertava a inveja dos confirmados.
    Bj.

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  5. Frontal, ético, de fibra.
    Quem o leu, jamais o esquece.
    ~~~ Beijinhos ~~~

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  6. homem de fibra
    antes quebrar que torcer...
    que sabia o valor das palavras e, por isso, as respeitava.

    beijo

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  7. Vai fazer falta a sua frontalidade e verticalidade.

    Que descanse em paz!

    Um beijinho amiga Graça

    O Toque do coração



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  8. Partiu um cultor da Língua Portuguesa.
    Que repouse em paz.
    Beijinhos

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  9. BB - O homem de esquerda de quem até alguns de direita gostavam!... Paz à sua alma!

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  10. Estas perdas custam-nos sempre muito a aceitar, mas o que fazer ?...
    E à medida que os anos vão passando estas situações ir-se-hão repetindo cada vez em maior número !
    Contra isso, não poderemos fazer nada. É inevitável ! :(

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  11. Obrigada, amigos, pelas vossas palavras elogiosas para quem as mereceu e merece.

    Bem-hajam!

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  12. Perdi o meu Mestre, o Amigo e o Camarada. Nunca esquecerei o tempo que trabalhei com ele no "Ponto".

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