segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Eduardo Lourenço

Não sei falar da obra de Eduardo Lourenço, o pensador que sabe e tem escrito (quase) tudo acerca da nossa cultura. Uma vez que falei nisso à minha saudosa amiga Amélia Pais, ela aconselhou-me a ler “Fernando, o rei da nossa Baviera”, que era o livro de Eduardo Lourenço de que ela mais gostava. Fiquei a entender o valor, a qualidade, a profundidade de pensamento e de conhecimentos que jorram dos seus textos. É por isso que não perco um texto, um comentário, um ponto de vista seu que apareça num jornal, numa revista.

Ouvi-o uma vez apenas e foi na apresentação que José Sócrates fez do seu livro na Biblioteca Nacional na primavera de 2014 e fiquei encantada com a sua eloquência fácil, a singela exposição dos factos e acontecimentos históricos e sociais que, desde a Antiguidade, têm influenciado toda a nossa vida ocidental, toda a nossa razão de ser. Ouvi-lo é como se todas as peças de um imenso puzzle rapidamente se integram umas nas outras fazendo com que tudo tenha um sentido.




E tudo isto por um senhor que já conta 92 anos de vida e de intenso estudo. É espantoso! Por isso gostei de saber que foi distinguido por mais um prémio, a primeira edição do Prémio Vasco Graça Moura (que teria feito ontem 74 anos), depois de ter recebido o Prémio Camões (1995) e o Prémio Pessoa (2008) entre muitos outros nacionais e internacionais.

O Diário de Notícias noticia isso de forma quase poética: «Eduardo Lourenço junta Graça Moura a Camões e a Pessoa» e relata a forma simples e algo humilde como o grande estudioso e pensador fala daquilo que faz: «Quando lhe perguntamos como corre o seu trabalho nos dias de hoje, responde: "Tenho sempre muita dificuldade em chamar trabalho àquilo que eu fiz. Acho que era o Mastroianni que dizia que não percebia como é que lhe chamavam trabalho quando, afinal de contas, ele só tinha prazer naquilo que fazia. Eu não sou o Mastroianni, mas é a mesma coisa. Não me posso considerar um trabalhador, é ofender os trabalhadores verdadeiros." Conta que continua "a ler bastante" e "a escrever", mas di-lo como quem é obrigado a comentar uma rotina matinal.»

Mas melhor do que tudo o que eu possa dizer, será passar a palavra a Guilherme de Oliveira Martins, outro grande senhor da cultura portuguesa e presidente do júri que atribuiu o Prémio Graça Moura, que diz: «Eduardo Lourenço segue os passos da Geração de 70 demarcando-se da religiosidade tradicional, e de um sentimento universal, notados em Fradique Mendes e depois na galáxia Fernando Pessoa e no modernismo. Nesta ligação, o ensaísta assume grande originalidade ao articular (como antes ninguém fizera) as Conferências Democráticas e o Orpheu. "A história e o destino de Portugal nunca foram trágicos fora da tragédia adiada que a vida é. Também não o são agora. Pela primeira vez, o nosso país vive-se a si mesmo e começa até a ser visto pelos outros, como um povo insolentemente feliz." Lourenço falou, por isso, de "maravilhosa imperfeição", como marca indelével de Portugal. Nem contentamento nem desconcerto, do que se trata é de procura de um sentido emancipador. Perante as nuvens negras da crise, o seu tema é o da vontade, que supere uma ciclotimia antiga. O tema de Portugal como Destino está de pé. Longe dos mitos da glorificação ou do pessimismo são urgentes a liberdade e a vontade! Afinal os mitos obrigam a ter deles uma leitura exigente e crítica.»

17 comentários:

  1. Depois de ter lido a tua bem alicerçada crónica/homenagem ao ensaísta Eduardo Lourenço, fui espreitar o que dele referiu o DN.

    Acho que aos 92 anos este grande senhor tem um sentido de humor refinado que sabe usar de modo muito peculiar, à mistura com uma boa dose de humildade e muita naturalidade.
    Adorei esta sua resposta à pergunta que lhe foi colocada sobre o seu trabalho actualmente.

    "Tenho sempre muita dificuldade em chamar trabalho àquilo que eu fiz. Acho que era o Mastroianni que dizia que não percebia como é que lhe chamavam trabalho quando, afinal de contas, ele só tinha prazer naquilo que fazia. Eu não sou o Mastroianni, mas é a mesma coisa. Não me posso considerar um trabalhador, é ofender os trabalhadores verdadeiros."

    Desculpa, Graça, mas achei esta forma de expressão deliciosa e peço -te que não leves a mal eu incluí-la no meu comentário, apesar de já haveres feito referência a esta citação.

    Parabéns Graça, por enalteceres e dares destaque aos grandes vultos da nossa Cultura!

    Beijinhos

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    1. Nada de desculpas, Janita!! Tudo o que seja para completar os meus texto´s é sempre muito bom!!
      Também gostei muito da sua resposta que para aqui transcreveste, mas não podia «copiar» tudo...

      Beijinhos.

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  2. Ouvi a notícia de atribuição do prémio ontem.
    Mas confesso que sou um néscio no que respeita à obra de Eduardo Lourenço.
    Beijinhos

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  3. ~~~
    Um dos nossos inteletuais
    mais simpáticos e respeitáveis; simples como todos os
    verdadeiros doutos; com aptidões culturais reconhecidas
    internacionalmente, profícuo e, pela sua idade, um vero
    exemplo de energia criadora, visando fazer-se entender.

    Uma homenagem sucinta - adequada a este tipo de publicação
    - porém, precisa e perfeita.

    ~~~~ Beijinhos, Graça. ~~~~

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    1. És sempre uma querida, Majo!! Obrigada pelas tuas simpáticas palavras.

      Beijinhos.

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  4. Vi-o também uma vez ao vivo e a experiência foi o oposto, porque prolongou demasiado a intervenção algo confusa .

    Porém penso que teve a ver com o seu estado de saúde, porque Adriano Moreira acabou por pedir que toda a gente saísse da sala, porque Eduardo Lourenço se sentia mal.

    Beijinhos e bom 2016 !

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  5. Um Homem. Um Homem que conhece a nossa natureza... Gostei que lhe tivessem atribuído o prémio.
    Um beijo, Graça

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  6. Parabéns amiga Graça por enalteceres aqui um Homem que nos orgulha.
    Um prémio muito merecido.
    Um beijinho e BOM ANO!

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  7. Gracinhamiga

    Junto-me à multidão ou seja os admiradores de Eduardo Lourenço que, além do mais, faz o favor de ser meu Amigo. Para mim há dois Homens que me marcaram, marcam e marcarão a minha vida: Agostinho da Silva e Eduardo Lourenço. Ponto final.

    Bjs da Raquel e qjs do Leãozão (Biba o Lopestepegui, biba!!! Oxalá fique muitos no FêCêPê...)

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    1. Dois «monstros» da cultura portuguesa, Henriquamigo!

      Quanto ao Lopestegui..... SPOOOOOOOOORTING!!!!! Ai, não, enganei-me: Biba o Lopestegui!.....

      :)))))

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  8. Nunca li nada dele, mas não me parece que ele escreva ficção. Ou será que também escreve? :)

    Beijocas e Bom Ano!

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  9. É impressionante a forma como Eduardo Lourenço discorre sobre qualquer assunto. Tive esta percepção ao ouvi-lo em entrevista na Antena 2 há umas duas semanas, julgo. Consegue encadear o discurso interpondo parêntesis explicativos sem nunca perder o fio do pensamento. Assombroso, tanto mais, como a Graça refere no seu texto, trata-se de um "jovem" de 92 anos. Daí a minha conclusão: a densidade de EL é > à unidade pois a massa do seu conhecimento supera grandemente o volume da sua idade.
    Bom trabalho.
    BFS.

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  10. Não consigo apreciar este peralvilho afrancesado que não conseguiu ensinar aos filhos a língua de Camões. Mas vai arrecadando uns €uros que deve meter no Crédit-Lyonnais para lhes deixar em legítima. Aprecio mais o emigrante analfabeto que envia os filhos para a escola ensinando-os o português ou falando-o em casa. Tudo o mais são sedas, rendas e cenários!

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