Nunca tinha ficado no Tivoli em Sintra.
Era uma vontade antiga: é que durante anos passei ali naquele sítio, muito
antes de ser Tivoli, várias vezes ao dia, a caminho do meu Externato Académico
onde estudei e depois fui professora. E era uma das nossas referências no
espaço: quando vínhamos do Colégio que era bem bem lá no fundo da imensa e
íngreme rampa e chegávamos junto ao Hotel, no Largo, era altura de respirarmos
fundo e descansar da subida; ao contrário, quando descíamos para as aulas ainda
dava tempo de darmos umas corridinhas escada acima, escada abaixo na escadaria
de pedra do Hotel (aquela por onde o Cruges «entusiasmado com Sintra, rompeu a
assobiar, conservando aos ombros o xale-manta, de que não se queria separar
porque lho emprestara a mamã») ou até – ai se a minha mãe alguma vez tivesse
sabido!... – de experimentarmos umas cambalhotas no varão sem deixar que as
saias nos deixassem “descompostas”…
Era assim o Hotel Nunes. O tal
onde o Cruges e o Carlos da Maia iriam ficar na sua visita a Sintra.
«Chegavam às primeiras casas de
Sintra, havia já verduras na estrada e batia-lhes no rosto o primeiro sopro
forte e fresco da serra.
E a passo, o break foi penetrando sob as árvores do Ramalhão. Com a paz das
grandes sombras, envolvia-os pouco a pouco uma lenta e embaladora sussurração de
ramagens e como o difuso e vago murmúrio de águas correntes. Os muros estavam
cobertos de heras e de musgos: através da folhagem, faiscavam longas flechas de
sol. Um ar subtil e aveludado circulava, rescendendo às verduras novas; aqui e
além, nos ramos mais sombrios, pássaros chilreavam de leve; e naquele simples
bocado de estrada, todo salpicado de manchas de sol, sentia-se já, sem se ver,
a religiosa solenidade dos espessos arvoredos, a frescura distante das
nascentes vivas, a tristeza que cai das penedias e o repouso fidalgo das
quintas de Verão… Cruges respirava largamente, voluptuosamente.
- A Lawrence onde é? Na serra? –
perguntou ele, com a ideia de ficar ali um mês naquele paraíso.
- Nós não vamos para a Lawrence –
disse Carlos, saindo bruscamente do seu silêncio e espertando os cavalos. –
Vamos para o Nunes, estamos lá muito melhor!»
“Os Maias”
Mas o Tivoli que brotou das ruínas do Nunes (que teve melhor sorte que o vizinho Netto) é assim, bem mais confortável e modernaço e, apenas aos poucos, se vai integrando na paisagem feérica da Vila.
Gosto do edifício antigo e acho o moderno uma aberração.
ResponderEliminarMelhor ficou a reconstrução do Laurence, em que os proprietários holandeses respeitaram a traça original.
Jardins bem cuidados e mobilados, poderiam suprir a falta de varandas, onde, aliás, os utentes ficam muito expostos à curiosidade dos residentes.
Ainda andam por lá, espanholas?
Um excelente dia.
Relativamente ao Lawrence's, não há por que louvar os ditos holandeses uma vez que já nesse momento não era permitido alterar a traça original exterior dos edifícios
EliminarA vista é deslumbrante.
ResponderEliminarMas o prédio é para o feiote.
Tipo caixote com buracos.
Beijinhos
Que bela lembrança tiveste!
ResponderEliminarQuando há uns tempos visitei a Quinta da Regaleira não dormi lá mas almocei no restaurante do hotel e muito bem!
Abraço
ResponderEliminarMaravilha?
É interessante ver como os espaços podem, através das palavras certas, trazer-nos reminiscências, "coisas"
que nem sabemos ao certo de onde vêm.
Um beijo
Obrigada pela partilha.
ResponderEliminarcvb
Era do meu bisavô do lado Norte, bem que desconfiava que ele tinha deixado umas propriedades a Sul e que nunca se descobriu qualquer registo para os netos se habilitarem à herança!
ResponderEliminarA verdade é que, com algumas probabilidades, haverá alguma situação como esta que eu estou a insinuar (a brincar, melhor dizendo) relativamente ao meu avô materno, cuja história a minha mãe me andou a esconder, inocentemente, durante anos e anos......
Sintra merecia que arquiteto e proprietário tivessem arranjado uma solução melhor. Parece-me que quiseram dar nas vistas e ...
ResponderEliminarAs personagens dos Maias estranhariam se voltassem para uma queijada.
Passei novamente por aqui e senti novamente necessidade de manifestar o meu pesar, por não se terem repeitado, os espaços frequentados por Eça de Queiroz, como aconteceu no Lawrence.
ResponderEliminarO valor que a história concede a um edifício!
Tens toda a razão, Majo! Mau gosto há-o por todo o país...
ResponderEliminarironia subtil e transgressora - como as saias "descompostas" ou o bigode do primo Basílio.
ResponderEliminarbeijo
Paraíso! Divino lugar!
ResponderEliminarFeliz é você por desfrutar de tamanha maravilha!
Abraço.
ai heretico...
ResponderEliminarvale bem a vista, de facto, porque na comparação, o antigo "Nunes" sem modernices servia bem a paisagem. :)
ResponderEliminarNão conheço mas, pelas fotos, também acho que foi pena não se ter preservado alguma traça romântica no edifício, mais condizente com o ambiente local.
ResponderEliminarPode não ser bonito por fora, mas decerto que tudo o que se passa lá dentro é de superior qualidade.
ResponderEliminarOlha que eu assisti a tudo, desde a demolição do Nunes e da casa ao lado da família Almeida e Brito, e nunca me deu para entrar no Hotel Tivoli.
Depois de um serão emotivo e cheio de recordações, nada melhor que uma noite bem passada numa boa unidade hoteleira.
Sintra sempre nos nossos corações.
Em maio há mais!...