terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Catarse - ou talvez





 Parte I

Pertenço a uma geração que, desde muito miúda, se teve de submeter a exames. Sem contar com as Provas de Passagem da 1ª à 2ª e da 2ª à 3ª classes que fiz na Escola de Vieira de Leiria e que se revestiram da importância e do aparato de autênticos exames, com vestidos a estrear e tudo, o primeiro exame que fiz foi o do 1º grau – ou seja, o da 3ª classe, que constituía, à época, a instrução básica, se bem que não obrigatória, para as mulheres. Lembro-me bem do vestido que a minha mãe mandou fazer para ir a exame: um vestido azul claro de um tecido de seda pesada, com saia às pregas e decote à marujo com risquinhas brancas. E lá me dirigi, com as minhas tranças crespas e ruivas e os meus óculos modernos de lentes à gato, à escola oficial, que eu era menina de colégio, o Gil Eanes em Algés. Depois, foi o exame de 2º grau, o da 4ª classe – que dava aos rapazes que o concluíam a instrução básica, não obrigatória – e que fiz numa qualquer escola oficial de Cascais. No mesmo ano, fiz o Exame de Admissão ao Liceu, no Liceu Maria Amália, em Lisboa, com provas escritas e orais que se arrastaram por agosto dentro. Lembro-me bem do dia em que realizei as Provas de Ditado e de Redação que estava tão quente que as enormes janelas daquele liceu imenso – a que anos mais tarde chamei ironicamente de “Hospital das Letras” por lá ter passado dois anos “maus” da minha existência enquanto aluna/estudante a fazer o 6º e o 7º ano de Letras – através das quais se iam ainda ouvindo alguns dos proverbiais pregões matinais lisboetas. Era o verão de 1958.


Liceu Maria Amália

 Os exames continuaram por longos anos: no 2º ano do liceu, com provas escritas e orais a todas as disciplinas, porque era aluna externa, do colégio – o meu querido Externato Académico de Sintra, atualmente em abandono total – e no 5º ano do liceu que, garanto, foi o ano em mais estudei em toda a minha vida. Depois vieram os exames do 7º ano já como aluna interna pelo que consegui já dispensar de algumas das penosas provas orais. 


Externato Académico de Sintra (abandonado)

 Para entrar na Faculdade, tive de fazer os antipáticos Exames de Aptidão e durante os cinco anos de curso superior, os exames foram incontáveis já que fiz vinte e sete cadeiras de curso e mais cinco do Curso de Ciências Pedagógicas para me propor a estágio para professora. No fim do dito estágio em que todas as semanas era “examinada” nas aulas assistidas, mais um exame – o Exame de Estado. Desse “safei-me” porque se deu o 25 de Abril e, lá para meados de maio, já mesmo depois de ter escrito a tese que defenderia nesse exame, conseguimos, depois de muitas Manifs frente ao Ministério na 5 de Outubro e de algumas audiências não se sabe muito bem com quem, que fosse abolido. O que me valeu (fui sempre uma sortuda!) que anos mais tarde, aí por inícios de 90, tivesse de me submeter ao Exame ao 8º escalão para a ele poder ascender e por não ter feito o dito Exame de Estado! Os “examinadores” eram professores adstritos à Direção Regional de Educação que já se encontravam no topo da carreira e, como isto da avaliação de professores já nessa altura era complicado, calhou-me como “examinadora” uma colega, por acaso minha conhecida de quando também eu estivera em comissão de serviço igualmente na dita DRE, com formação de base na área dos Trabalhos Manuais que, enfim… não gostou (ou não entendeu) muito do trabalho eu apresentei. 

 (continua)

12 comentários:

  1. Posso assinar tudo o que aí tens até ao exame do segundo ciclo liceal, isto, o 5º anos - com as respectivas secções de letras e Ciências.

    Bons sonhos, colega, rrss

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  2. Hoje reabriu uma caixinha de recordações para os mais velhos. Os mais novos nem sonham quanto isso era doloroso.
    Podíamos trazer para casa a raposa má e seria um mar de castigos e de contrariedades...

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  3. Já vi que o nosso percurso foi igual ,embora eu um pouco mais nova, a avaliar pelo ano do 7º ano.Os exames , os vestidos feitos para a ocasião, que ainda hoje me acompanham , pois as saias com uns bicos de bordado inglês , serviram para forrar 2 roupeiros.As pedagógicas foram feitas já eu dava aulas e o estágio pedagógico no Porto já depois do 25 de Abril; já dava aulas há 9 anos....Traumatizante mesmo , a passagem para o 8º escalão, onde nunca estive , pois passei do 7º para o nono , esperando que a ministra Manuela Ferreira Leite "botasse" cá para fora legislação...Foi horrível e traumatizante. Fiz a dita cuja prova pública no Porto no dia 21 de Janeiro de 1994 e a partir daí desmotivei alguma coisa...tive bom com distinção se é que isto quer dizer alguma coisa.Passei para o 9º escalão em Novembro de 1993 mas para efeitos de recebimento , Janeiro de 1994.Leccionei sempre desde 1980 Biologia 12ºano, um desgaste e só interrompi 2 anos 1997 / 8 , por ter sido operada a um pólipo numa corda vocal. A nossa geração trabalhou muito e bem , com responsabilidade e isto dá-nos autoridade moral para muitas vezes criticarmos o que actualmente achamos mal, não é ? Um abraço. M.A.A.

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  4. Como reconheço todo esse percurso.
    Até as ondas de calor na época de exames.Malta sofria...Na vigilância das provas escritas o rigor era extremo.Contou-me uma amiga que,apesar de ter prova impecável quanto a ortografia,aritmética etc etc.sentia a presença incomodativa de um dos membros de vigilância durante a prova de desenho.A senhora recomendava:olha bem para o jarro!Ela, nos seus 9 anitos, bem olhava,mas não via nada de especial,até que ,por fim, reparou que desenhara,como sempre,aliás,a asa do lado direito e que o modelo apresentava a mesma do lado esquerdo.Iria reprovar,como lhe disse mais tarde a professora que a preparara, porque teria MAU naquela prova e isso arrasava o resto.E os problemas do exame de admissão?Torneiras que enchiam,comboios de velocidades diferentes que se cruzavam,divisão de orações na oral etc,etc.Kinkas

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  5. Estimada Amiga Graça,
    Penso que somos da mesma geração, visto que eu igualmemente passei por todas estas trabalheiras e levando réguadas com a menina dos olhos.
    Estudei em Évora, depois no seminário de Vila Viçosa, regressando a Évora continuando os estudos na Escola Comercial e Industrial, tendo tirado o curso Geral de Comércio.
    Já na Ásia conclui o 7o. ano do liceu, e depois tive mais sorte que a amiga Graça, frequentei várias universidades,uma em Macau, outra na China e a terceira em Singapura, tendo-me formado criminalogista, como isso náo chegasse, tirei o curso superior da Escola Naval, na China.
    Tive um percurso escolar misto e só com muita força de vontade consegui ultrapassar todos os obstáculos em terras que na altura eram ainda estranhas para mim.
    Cada um recorda a seu modo esses tempos de estudante, uns de forma agradável outros de forma penosa.
    Abraço amigo

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  6. E com tantos exames, ainda aqui estamos.

    O caricato da questão é que hoje as aulas assistidas, para a atual avaliação, são feitas por pessoas que nada têm a ver com a nossa área. Pode entender-se que um Professor de Educação Física seja avaliado por um colega da Educação Especial!!!!????

    Também me lembro dos meus exames. Quando me encontrava cá no Continente ( o caso, por exemplo, do exame do 5º ano na altura da morte do Salazar) eu frequentava um Colégio ligado diretamente à minha família. Pois acredita que todos os que eram familiares o fizeram e eu vim fazer os exames a Viseu para que não pudesse haver qualquer ponto de suspeita. Outros tempos... mais saudáveis.

    Beijo constipado

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  7. Quando vi a primeira foto comecei logo a sentir suores...
    Estamos no bom caminho, diz a Troika, agora se vamos passar no exame... isso é que eu já não sei.
    :)

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  8. Peço as minhas mais sinceras desculpas a todos a quem fiz reviver esses malditos exames que eram mesmo como a amiga Kinkas descreveu: com nove anitos! Que injúria!

    Gostei de conhecer os vossos trajetos, querida M.A.A. e caro amigo Cambeta. Que vida de desafios e de novidades que você passou! Que sortudo! Ainda bem.

    Pois é, Rui, espero bem que não tenhamos de voltar a esses tempos sombrios e tristes.

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  9. Carol
    Nasci em Dezembro de 1956, por isso em 1958 era eu bebé.
    Mas também recordo muito bem do meu vestido, dos meus tamancos às flores e das minhas tranças enfeitadas com lacinhos nas pontas, quando fiz em Monte Redondo o meu exame da 4ª classe numa folha de 25 linhas com uma caneta de tinta permanente, caneta essa que foi usada pelo meu pai quando fez o exame dele e depois as minhas duas irmãs e meu irmão mais velho, meu pai fez questão de todos usarmos a sua caneta e, que ainda hoje guardo com muito amor.

    Beijinho e uma flor

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  10. Ainda tenho a caneta de tinta permanente com que fiz todos os meus exames. Mesmo depois de aparecerem as esferográficas. Obrigada, Flor, pelo teu testemunho.

    Beijinho.

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  11. Que recordações agradáveis… na sua maioria! : )

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  12. Algumas serão... outras, nem por isso!

    Obrigada, Catarina!

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