quinta-feira, 1 de junho de 2017

Os Conselhos Gerais das Escolas

Leio sem qualquer resquício de espanto a deceção que a ex-ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, manifesta no seu artigo de opinião semanal de ontem no DN face à não consecução dos objetivos gerais do Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior (RJIES) aplicado pelo ministério de Mariano Gago há dez anos, quando ela própria detinha a pasta da Educação.

Centra-se a articulista, estudiosa e bem conhecedora que é destas e de outras coisas do governo das escolas, sejam eles do ensino superior ou de qualquer outro, em dois aspetos determinantes:
  • um é a ausência da avaliação da sua aplicação ao fim de cinco anos como estava consagrado na lei, nem ao fim de quase dez anos que faz em Setembro próximo;
  • o outro, que é aquele que me aqui traz, é a relação entre os reitores e os conselhos gerais. E explicita a Professora:

«Os conselhos gerais foram concebidos como órgãos de orientação estratégica das instituições de ensino superior, com elementos externos à universidade, e de supervisão geral da instituição. Têm competências de escolha e fiscalização do reitor. Os seus poderes são o contraponto dos poderes executivos reforçados dos reitores. Porém, na prática, em muitas universidades o reitor exerce um papel ativo na criação e composição do conselho geral, transformando-o numa extensão do seu poder e inviabilizando o necessário equilíbrio e separação de poderes pretendido na lei.(…) É o princípio da separação de poderes substituído pelo do alinhamento.»

Meses mais tarde, em Abril de 2008, fez a Ministra aprovar – depois de uma consulta pública «à portuguesa» – o Dec. Lei 75/2008 (de muito má memória, em minha opinião, que fiz questão de dar a conhecer ao meu “superior” que fez o favor de o meter na gaveta) que aprovou o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.

[Aproveito para esclarecer quem tiver a paciência de ler este meu texto que nunca fiz parte daquele número infinito de professores desagradados com as medidas desta ministra, nomeadamente no que toca à avaliação dos professores, não fiz manifestações à laia do senhor Mário FENPRF (que, curiosamente, está a voltar à carga, enquanto esteve quase desaparecido no tempo do governo anterior) nem conspirei contra ela.]

Voltando ao regime de autonomia, administração e gestão das escolas, cumpre-me aqui informar que, tal como previsto para o ensino superior, também as escolas secundárias e os agrupamentos de escolas passaram a ter um conselho geral - que desempenharia as funções da administração, substituindo em muito, pelo menos teoricamente, a administração central. Seria (e é) composto por um número relativo de professores e pessoal não docente eleitos, encarregados de educação auto-designados, membros designados pela autarquia e membros designados por organizações da comunidade local. As escolas secundárias também elegem alunos para o CG. O seu presidente é eleito pelos seus membros (num máximo de 21) não sendo obrigatório que seja escolhido um professor.

As competências do CG são essencialmente de eleição e supervisão do diretor (nome já de si de má memória e muito mal escolhido) podendo demiti-lo, e de supervisão geral do(s) estabelecimento(s) de educação e ensino.

Teoricamente muito bem! Lembro-me de ter estudado esta partição de poderes – administração/gestão, a primeira para a comunidade educativa, a segunda para o diretor – quando fiz a minha primeira Pós-graduação em Administração Escolar na Universidade de Aveiro em inícios de 90. Influências da governação das escolas nos países da Europa do Norte.

A aplicação veio quase vinte anos mais tarde. Mas, tal como a Professora aponta para a relação de autêntica manipulação do CG pelos Reitores, o mesmo – ou pior – acontece no geral das escolas e agrupamentos: Os diretores “mandam” nos CG, manipulam-nos para a sua eleição ou continuidade no cargo, os membros do dito CG estão completamente desinteressados das suas funções e competências e as reuniões são praticamente reduzidas a carradas de informações dadas pelos diretores. [Fico a saber que, infelizmente, os Conselhos Pedagógicos – órgão da máxima importância nos regimes jurídicos anteriores – limitam-se agora também a ouvir infindáveis informações dos diretores… ]

Quem disse, quem pensou, quem acreditou que este povo, amarfanhado na sua maioria pela ignorância rural e eclesiástica e pela desinstrução instituída ao longo de séculos, estaria já pronto para responder aos desafios da democracia representativa, da cidadania ativa, da intervenção dinâmica nas instituições?

Que me desculpem, mas vão ter de passar décadas antes que isso aconteça. E, por favor, não me venham com exemplos esporádicos, que esses, embora muito apreciáveis, não contam para a generalidade de um país que se quer moderno e interventivo.





8 comentários:

  1. A reforma da escola será sempre uma das mais complicadas de concretizar.
    Beijinhos, bfds

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    1. Não tenha dúvidas, Pedro!
      Aproveito para agradecer a sua constância aqui no meu espaço mesmo com os temas menos apelativos...

      Beijinho.

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  2. Costumo dizer que deixei o ensino na hora certa quando me reformei em 2010!!!
    Ainda um dia destes comentei com alguém sobre os meus 35 anos de lecionação!
    Dei muitas horas ao Estado ... trabalhei sábados ... domingos e em férias pois acumulei durante muitos anos a direção de escola com o de docente!
    Só faltei após o nascimento dos meus filhos!!!
    Fiz muita formação ... com o meu dinheiro !
    Saí na hora certa ... já não aguentava tanta papelada ... tanta reunião sem interesse ... tanta pressão sem justificação!!!
    Os nossos professores não têm a vida nada facilitada ... em todos os aspetos!!!
    Precisamos de gente que perceba ... de educação e ensino ... nos cargos de chefia!!!
    Bj

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    1. Gracinha, também me aposentei em 2010.
      Tenho para mim que há muito quem saiba de educação neste país, só que não está nos sítios certos ou são muito mal compreendidos.
      De facto, os nossos professores não têm a vida facilitada, não. Tenho duas filhas nas escolas e sei bem.

      Beijinhos

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  3. Não estou dentro do assunto, mas, em todo caso, o tema parece-me tratado com profundo conhecimento de causa. E bem.

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  4. Concordo plenamente. Acrescento que como membro do conselho geral não alinho nesta forma de atuação, falo, dou a minha opinião, voto contra, a favor e abstenho-me e depois aguento com as consequências de defender uma escola justa e igual para todos, quer professores quer alunos quer funcionários. ... horários esburacados... não é respeitada a continuidade pedagógica, tudo para me incentivar a mudar de escola!

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