terça-feira, 27 de junho de 2017

O vale das hortas

O vale das hortas verdes no centro rural de S. Pedro de Muel por trás do belo Largo fronteiro ao areal, de que ainda me lembro nos anos 70 cheio de hortinhas de verduras das que agora se chamam biológicas, tinha uma lavadouro daqueles com pedras para bater a roupa e água corrente. 

Mercê da modernização dos espaços, o vale das hortas deu lugar a uma belo parque para passear, ler, descansar, apanhar o fresco, com um espaço para as crianças esticarem os braços e as pernas e, ao fundo, lá está o lavadouro para lembrar o tempo das lavadeiras. 








O lavadouro foi revestido no seu interior com painéis de azulejos com pequenos trechos de poemas de Afonso Lopes Vieira, o eterno apaixonado de S. Pedro.








A propósito das lavadeiras, Fernando Pessoa escreveu assim:

«Lavadeira a bater roupa
Na pedra que está na água,
Achas a minha mágoa pouca?
É muito tudo o que é mágoa.»


E assim:

«A lavadeira no tanque
Bate roupa em pedra bem.
Canta porque canta e é triste
Porque canta porque existe;
Por isso é alegre também.

Ora se eu alguma vez
Pudesse fazer nos versos
O que a essa roupa ela fez,
Eu perderia talvez
Os meus destinos diversos.

Há uma grande unidade
Em, sem pensar nem razão,
E até cantando a metade,
Bater roupa em realidade. . .
Quem me lava o coração?»


Mas como calar aqui a poesia de Vieira se ela se respira no ar de S. Pedro?


NO TRONCO DUM PINHEIRO DA FLORESTA

A infinita frase dos pinhaes
cantou embaladora à minha infância,
e ficou em minha alma a ressonância
destas religiosas catedraes…

Em cada inverno as árvores doridas
fogem do mundo, deixam-no sozinho;
só estas, sempre fielmente erguidas,
mantêm no mesmo gesto igual carinho.

Verdes amigos certos para a gente,
têm a constância na adversidade,
dão a saude e ensinam a bondade,
— a Bondade: justiça sorridente.

(in O Pão e as Rosas,)


Porém, com poesia ou apesar dela, os miúdos divertiram-se por ali.








15 comentários:

  1. No lavadouro punha-se a conversa em dia! E que conversa! Não devia de haver segredo que o deixasse de ser quando as lavadeiras se juntavam no lavadouro! : )

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    1. Os lavadouros de roupa suja, têm agora um nome mais pomposo e é feito de tablet na mão, em vez de água e sabão, Catarina.
      Chama-se Face Book...:)

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  2. Em Macau chamam a essas pessoas xuxumecos, Catarina.
    Os tais que têm língua de trapos.
    Beijinhos para as duas

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  3. Olá Graça, também em Alte, colocaram junto às fontes poemas do poeta Cândido Guerreiro !
    são cantos fresquinhos e agradáveis,
    mas olhe que a conversa continua a pôr-se em dia, e não precisa de ser a lavar roupa !!!

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    1. Eu conheço Alte. Muito bonito. Não cheguei a nadar no rio!!

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    2. Boa, Ângela!! Também conheço Alte, linda vila fresca dos Algarves.

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  4. Bonito post! Modernizar sem esquecer o passado; lembrando às gentes de hoje a dureza que era a vida das mulheres de outrora!!

    Beijinhos, Graça.

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  5. Ainda se vão fazendo algumas alterações inteligentes ao antigo ordenamento das nossas terras! Está um recanto muito belo!

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  6. Adorei os painéis de azulejos, as fotos e os poemas.
    Um bonito post.
    Um abraço

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  7. Agradeço esta reportagem tão interessante e desejo bons sonhos

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  8. Obrigada, amigas pelas vossas palavras simpáticas. Beijinhos.

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