domingo, 16 de abril de 2017

Pedro Mexia

De Pedro Mexia conhecia apenas as crónicas que escrevia na revista Ler – que muitas vezes achava algo densas e herméticas – alguns outros textos na saudosa revista dos sábados DNA do Diário de Notícias in illo tempore, e um pouco, muito pouco mesmo, da sua participação naquele deplorável programa [isto acho eu, claro! não me peguem fogo!] governo sombra. Da sua poesia nada sei – mas eu, que gosto muito de poesia, não me meto muito pela poesia ultra simbolista, ou coisa assim, da pós-modernidade em que dizem que vivemos sob pena de não a entender e ficar mal vista no retrato…

Por isso, quando a Arquivo teve a amabilidade de me comunicar a sua vinda à livraria para apresentação de mais um dos seus diários, de nome Malparado, tirei-me dos meus cuidados e fui saber algo mais sobre o jovem poeta, crítico literário e de arte, diarista e, ainda por cima, consultor cultural do atual Presidente da República.

Gostei de o ouvir, sim senhor! Muito conhecedor, muito culto, tem, como gosto de dizer, quilómetros de leituras. Discurso desassombrado, aparentemente fácil, com um sentido de humor muito fino mas sempre se foi afirmando como um anti-Rousseau no que toca à bondade do Homem. Partidariamente desapaixonado, deixou transparecer uma tolerância muito civilizada, que gostei de ouvir, mas que me deixaram um bocadinho de pé atrás.

Confessou ter uma forte tendência anglicista – agradou-me, né?! – e ser um apaixonado pela poesia de Hölderlin – poeta pré-romântico alemão, muito mal compreendido pelos contemporâneos e que acabou por enlouquecer – de que não ouvia falar desde os meus tempos da Literatura Alemã na Faculdade.

Mas que não, que não se considera um intelectual… (pois, pois, e eu sou o coelhinho da Páscoa…)

Saí dali tentada a comprar-lhe este último diário. Gosto de ler diários de escritores. Não pela bisbilhotice, naturalmente, mas pela visão que nos podem transmitir do tempo, do espaço e da história que dia-a-dia se vai costurando. E, mais do que tudo, com linguagem literária.

Ora os seus diários editados em livro são uma (re)composição do que vai escrevendo nos seus blogs e aí, toca de ir espreitar o seu último que tem exatamente o nome do Livro – Malparado. Pareceu-me ter pouco de diário e muito de pensamentos, de convicções, de estilhaços de espelho quebrado. E – tal como as crónicas que em tempo li na Ler, muito densos e bastante herméticos.

E depois, ontem, li uma entrevista sua no DN em que o autor afirma que «Gosto de coisas engraçadas da vida privada mas a maledicência não é um dos meus defeitos. Sei que alguns diários mais conhecidos, como o Conta-Corrente de Vergílio Ferreira, contêm azedume e amargura do princípio ao fim, no entanto como leitor interessa-me pouco e nada como autor.»

Oh como gostava de perguntar ao jovem menino de família, que me parece ter tido muitas facilidades na vida (e ainda bem!) e que agora até pode dizer tudo o que lhe apetece num programa de televisão como é a tolice do governo sombra - gostava de lhe perguntar, repito, como se sentiria ele depois de ter sido internado contra vontade num seminário e depois de ter vivido mais de metade da sua vida num regime político fechado, castrador, autoritário, prepotente, censório e outras coisas mais…





18 comentários:

  1. Formulaste a tua opinião acerca de Pedro Mexia, mediante o que da boca dele ouviste e pelo que dele já conhecias, Graça. Quase poderia afirmar que o saldo final é bastante positivo, não fora o desagrado que te causou a forma como se referiu a Vergílio Ferreira, mas Mexia também tem direito a ter a sua opinião. :)

    De Mexia pouco conheço para além de ter lido algumas crónicas e de o ouvir no 'governo sombra'. Ao contrário de ti, não desgosto do programa. ( o que, se calhar, até nem te surpreende...) :)

    Excelente, mesmo, é este teu texto/opinião. Olha, cada vez fico mais encantada com estas tuas críticas incisivas, onde não falta a dose certa de ironia e mordacidade. Gostei muito! :)

    Fui espreitar o blog e pareceu-me que o nome faz jus ao teor: 'Malparado'; com links desactualizados.

    Um beijinho Graça. Boa semana

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    1. Obrigada, Janita, pelas tuas amáveis palavras!!

      Beijinho e boa semana também para ti.

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  2. Já formulaste a tua opinião, já não há nada a fazer. Mesmo assim, ouve-o: https://www.rtp.pt/play/p3097/e269715/curso-de-cultura-geral

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  3. Gostei de ler a sua opinião, Graça, a respeito de Pedro Mexia, em muitos pontos semelhante à minha. Em relação aos diários de escritores, o que sei é que muitos aproveitam para "ajustar contas" com outros autores com mais sucesso que eles... Uma ressalva para os diários de Torga...
    Uma boa semana, Graça
    Um beijo.

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    1. Os diários de Miguel Torga são uma coisa maravilhosa de poesia. Isso do "ajuste de contas" é mau de mais! Que horror!

      Obrigada, Graça, pela sua opinião.

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  4. Não penso que as "desculpas" que a Graça oferece ao Virgilio Ferreira, sirvam de defesa para as "suas dores", quase permanentes. Há quem tenha sofrido muito mais que ele, e nem por isso tenha passado parte do tempo a "destilar veneno".

    Há sempre que se ache maior que a pátria. Jorge Sena era assim e agora temos o Rentes de Carvalho, que também se tem em grande conta...

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    1. O feitio do escritor não pode denegrir a sua obra! O Sena podia ser um ressentido - e tinha bons motivos para o ser - mas comparar a sua obra imensa e brilhante com a do Rentes de Carvalho... não dá!

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    2. Graça, não comparei obras, apenas feitios. :)

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  5. Li atentamente o que escreveu sobre o Pedro Mexia.
    Se não estou em erro, foi também director da Cinemateca.
    Não sou muito apreciadora do seu estilo.
    Mas admito que tem uma boa bagagem cultural.
    Um bj.
    Irene Alves

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    1. Muito culto e muito sabedor, com um enorme espetro cultural, Irene.

      Beijinho.

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  6. um boa questão a tua!
    mas seja como for, estou com o Mexia na sua avaliação de Virgílio Ferreira.

    beijo

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    1. Opiniões... de facto o Vergílio Ferreira era uma personalidade muito fechada, muito complexa, mas nunca o categorizei como «Calimero»...

      Beijinho.

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  7. Não vou muito com o pensamento do Pedro Mexia. Contudo, é coerente consigo próprio e não consegue descolar dos seus ideais políticos e sociais. É pena que pessoas inteligentes sejam limitadas na apreciação dos acontecimentos. Agarradas a uma directriz, afunilam o pensamento.

    Bjs

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    1. Tem razão, mas temos de aceitar. É, de facto, um homem muito culto, de uma forma muito abrangente.

      Beijinho.

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  8. Não gosto dele, confesso. Curiosamente, o Vergílio Ferreira é só o meu escritor favorito de todos os tempos. Morreu no ano em que me formei e senti-me orfã, completamente. Já li Aparição umas 5 vezes!

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  9. Pelo que vejo o meu Pedro Mexia evaporou-se.
    Resumindo: apesar do seu posicionamento conservador parece-me uma pessoa decente e até gosto de o ler, não sendo muito fácil de o fazer. Ponto. Pronto não, Referia uma boa nota para a Graça que tem mão para este tipo de crónicas.
    Bj.

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