sábado, 22 de abril de 2017

No Dia da Terra

Então fiquei a saber que a Tapada de Mafra organizou para hoje de manhã uma caça às hastes. Uma caça às hastes? perguntei-me eu. Sim! Todas as Primaveras os veados e os gamos da Tapada perdem a sua armação, as hastes, num processo que tem o nome de desmoque. E serão essas hastes perdidas que os participantes terão de procurar. Parece-me bem para celebrar de forma diferente o Dia da Terra, bem no meio de um tão belo cenário natural.

Ora a propósito de Tapada de Mafra, lembrei-me de ir reler um ou outro fragmento do livro «As fabulosas histórias da Tapada de Mafra» de Cristina Carvalho, filha de Rómulo de Carvalho/António Gedeão.

E, já que estamos a falar de veados, deixo aqui esta engraçada história que retirei do referido livro.
«Existiu na Tapada um veado especial. Nunca teve um nome pelo qual fosse mais fácil e imediato dar com ele. É que nem sempre os responsáveis pelas vidas dos animais aqui na floresta lhes dão nomes. Veem-nos nascer, às vezes alimentam-nos a biberão, os animais crescem rapidamente e criam-se laços indestrutíveis de amor e amizade entre humanos e bichos. Numa tentativa de não os personalizar demasiadamente, muitas vezes ficam sem nome. É sempre muito doloroso quando morrem. Um nome é uma marca, um sinal para determinado animal, talvez um que se tenha afeiçoado mais, talvez um mais belo, mais próximo, mais manso. Com nome dado, a sua morte é mais difícil de suportar.

Por isso mesmo, o veado da Tapada, que nunca teve um nome mas toda a agente o distinguia dos outros todos, era uma animal enorme! O seu corpo grande e pesado não passava despercebido. Às vezes, um restolhar intenso ali nas moitas próximas e já se veem as poderosas pernas e a cabeça com grandes hastes a afastar as ervas, abrindo caminho. Todos os anos, na primavera, o veado perdia as suas hastes ramificadas e tornava-se agressivo, investindo contra tudo e contra todos e, como era ciumento e desconfiado, era difícil amansá-lo. Só na presença de uma mulher, qualquer uma, é que ele acalmava, e isto ninguém nunca conseguiu explicar!

Um dia, um dos guardas viu-se tão aflito e aterrorizado com as investidas do grande veado que teve de trepar pelo tronco da árvore próxima, até onde conseguiu. Ali ficou, num ramo, horas e horas a fio. O veado cá em baixo a rondar, a rondar soprando pelas narinas, e o homem, lá no alto da árvore à espera que por ali passasse alguém, de preferência uma mulher. Por um acaso e sorte desse dia inquieto, a ronda da mata, aqui já perto da entrada e pelas sete da tarde, foi feita por duas guardas florestais. Avistaram o furioso animal rodando à volta do tronco da árvore e foi então que ouviram um chamamento vindo do alto!


Como teria sido se elas não passassem por ali naquela hora, naquele dia?» 

(Sextante Editora, Porto, 2016, pp 70-71)






21 comentários:

  1. Não tinha noção. Gostava de ter sabido da iniciativa.

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    1. Deve ter sido uma maravilha andar por todo aquele espaço natural.

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  2. Tens razão Graça, uma excelente maneira de celebrar este dia.
    Uma história deveras interessante, o que seria que o animal pressentia com a presença feminina ? :)

    Um beijinho e bom fim de semana

    O Toque do coração

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    1. Um toque feminino tem sempre algo de atraente, Fê...

      Beijinho.

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  3. Excelente, não conhecia, adorei!

    Bom domingo querida, um beijinho imenso.

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    1. Obrigada, Flor! Apesar de tudo, arranjas sempre um minuto para vir aqui. És uma querida.

      Beijinho.

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  4. Grata pela excelente leitura...
    Proteger o planeta é imprescindível.
    Beijinhos terrestres.
    ~~~~~~~~~~~~

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    1. O pior são aqueles países imensos que nem a Quioto obedecem...

      Beijinhos em bom ambiente...

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  5. Fico imaginando...Ufa! O valor feminino, hein!!
    Abraço.

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  6. Um veado seduzido pela elegância, ou pela ternura feminina?
    Bom desconhecia essa caça às hastes, como desconhecia que hoje era o dia da terra.
    Ando mesmo desatualizada
    Um abraço e bom fim-de-semana

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    1. Atuliza-te, filha, atualiza-te... :)))

      Beijinhos atualizados...

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  7. Um homem pendente, dependente da mulher e um veado submisso à mulher?
    Como se explica a situação?
    Boa semana.

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    1. O poder femininos tem poderes absolutamente insondáveis...

      Beijinho.

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  8. As mulheres e o seu poder (de presença) em momentos especiais|...
    Bfds.

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    1. Nem mais!!! E não há como negá.lo. amigo Manuel Tomaz!!

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  9. Uma iniciativa interessante e uma história bem curiosa!=)bj

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  10. Estive lá há uns anos num evento da Companhia onde trabalho a plantar árvores. Extrarodinariamente bonito !

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    1. Temos um país que é uma maravilha, Ricardo. O pior é o pessoal que cá foi posto... :)))

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  11. Janita, minha querida, sem querer apaguei o teu comentário. As minhas desculpas de info-naba.....

    Beijinhos

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