Sabemos bem que grande parte de
nós não se dá bem com o modo conjuntivo. E eu digo «nós» apenas para não
parecer arrogante, que a minha vontade era mesmo dizer «grande parte dos
portugueses» ou até mesmo «dos tugas». São muitos os opositores do acordo
ortográfico de 1990 – daqueles que dizem que defendem a «bela língua de Camões»
- que surpreendemos a mal-usar e a maltratar o pobre do conjuntivo…
Em boa verdade o modo verbal do conjuntivo
é uma das grandes dores de cabeça de professores – e alunos – das línguas de
origem latina. Sim, que a culpa é apenas e só mesmo do raço do latim. Veja-se o inglês, uma língua de estrutura gramatical
tão mais simples – por isso se tornou “língua universal” – se não arrasou com o
modo conjuntivo, nivelando-o com o modo indicativo que é bem mais simples e
mais simpático… Por isso, em tempos, quando os miúdos no 5º ano ainda escolhiam
entre o estudo do Francês ou do Inglês, nas primeiras aulas nós lhes
perguntávamos «Então porque escolheste o Inglês?» e eles, inocentes,
coitadinhos, respondiam «Porque não tem verbos»…
Bom, mas todo este intróito apenas
porque esta manhã, enquanto me dedicava àquelas tarefas domésticas
(terrivelmente execráveis e deprimentes, diga-se) de varrer, lavar, arrumar, me
lembrei de uma daquelas canções portuguesas, portuguesinhas, dos idos de 50 que
dizia: «Ai se os meus olhos falassem,
amor…»
Por essa época, anos 50, tempos
da minha 1ª/2ª classes, viemos viver aqui para a Vieira de Leiria (oh como eu estava predestinada!...)
porque o meu pai veio trabalhar para os escritórios da fábrica de limas dos
Feteiras. A vida era tão, mas tão diferente daquilo a que estávamos habituados
em Lisboa que nos arranjaram uma criadita
(entenda-se que era assim que se dizia nesse tempo), a Diamantina, uma jovenzinha
que mais não tinha do que treze ou catorze anos e cujo percurso escolar
desconheço em absoluto para minha mãe nas limpezas, ir encher os cântaros com
água (à picota), levar-me e buscar-me à escola (que a menina não podia andar sozinha por aqueles caminhos…) Deus do céu,
o que aprendi com ela sobre aspetos da vida na aldeia!
Ora acontecia que a Diamantina
cantava muito enquanto lavava e limpava. E uma das suas canções favoritas, que
ela cantava com um enorme fervor, era exatamente aquela «Ai se os meus olhos
falassem, amor». Só que ela – e lá vem o malvado do modo conjuntivo – cantava,
quase gritando: «Ai se os meus olhos falassam amor, talvez a ti te contassam o que eu
não conto a ninguém…»
Por muito que o meu pai e a minha
mãe – que era professora – a emendassem e a fizessem repetir a forma verbal corretamente, ela nunca conseguiu cantarolar a canção em bom conjuntivo…
Muita conversa de senhora professora e afinal, trazes-nos uma bela e simples canção onde a letra está muito bem explicada!, Ó Graça!! :)
ResponderEliminarAí pelos meus meus treze anos cantava-a eu muito! Assim a cantassem os meus olhos e talvez a ti te contassem o que não conto a ninguém...:))
E aquela : "Da Janela do meu Quarto"...Lembras-te, Graça?
Vejo a luz do quarto dela
quando a Lua vem brincar
nos telhados das vielas.
Gostei muito de relembrar aqueles bons velhos tempos!
Beijinhos
Também eu, Janita. E as canções do Tristão da Silva tinham letras bem bonitas! Bem me lembro delas porque passavam muito na rádio e eram muito cantaroladas lá em casa.
EliminarBeijinhos
grato, Graça
ResponderEliminarpelo apreço que tens por meus textos
e pela amizade, simpatia e boa disposição com que recebes as "impertinências" do herético..
beijo
e... quais impertinências? Costumo dizer aos meus alunos que em poesia pode-se tudo. E aqui digo: aos poetas pode tolerar-se tudo...
EliminarBeijinho e que tenha corrido tudo bem lá na Ass 25 de Abril.
Belo pretexto para recordar tempos idos e boa gramática!
ResponderEliminarBeijinhos, Graça :)
Obrigada, querida Maria.
Eliminar~~~
ResponderEliminarAndava alguém demasiado distraído, não reparando nos olhos do triste...
Nos anos 60, tivemos uma empregada em Lisboa, a Augusta, vinda
da província, que achava que tínhamos uma panela de impressão.
Apesar de todos os esforços, ninguém a conseguiu convencer do contrário.
A popularização da televisão teve o grande mérito de contribuir muito para
a correção da linguagem oral, incluindo os sotaques.
Pois se a nossa pachorra falasse, talvez contasse o que nos vão divertir
as novas cenas do mirabolante AO de 1990...
Há, mesmo, pessoas com muita dificuldade de adaptação...
~~~ Beijinho, Graça. ~~~
Lá "cheira" mal esta cena em torno do AO...
EliminarEssa da panela de impressão também está muito bem apanhada...
Beijinhos e bom fim de semana.
Engraçado. Sei que foi uma canção que se ouviu muito em determinada época. Mas sempre que a oiço, vejo-me pequenita, no barração de madeira junto ao rio, no quarto dos meus pais, único com janela para a rua, num dia de tempestade, as águas do rio agitadas, e eu a ouvir a canção pelos auscultadores da galena do meu pai.
ResponderEliminarDecerto que a ouvi muitas outras vezes, mas quando a oiço sempre me vem à memória este quadro. Porque será?
Um abraço e bom fim de semana
A nossa memória faz e abedece a associações incríveis e tão marcantes, não é, Elvira?
EliminarBeijinhos.
Se os nossos olhos falassem ...
ResponderEliminarTemos sorte em não ter surgido alguém a dizer que o modo conjuntivo está na origem das conjuntivites.
Bom fim de semana, Graça, um beijinho.
Eh eh eh eh eh.... O Observador no seu melhor!!!
EliminarBeijinhos sem conjuntivites nem outras ites...
O conjuntivo é realmente um problema tramado. Felizmente li o comentário do Observador e assim evitei ser acusado de plágio, por ter pensado em brincar com a minha conjuntivite.
ResponderEliminarBom FDS Graça
Então boas melhoras da dita conjuntivite - que, por acaso não deriva do conjuntivo...
EliminarBeijinho.
Coitada da cachopa..., p´ra mais, pretérito imperfeito... Mas, apesar de tão pequena, sabia, de ginjeira, como usar a vírgula!!!
ResponderEliminarGostei desta, Graça.
BFS
Que engraçada que é esta música! Não conhecia mas ele tem uma bela voz.
ResponderEliminarbjs