quinta-feira, 24 de julho de 2014

Provas de avaliação

Como sou uma rapariga da primeira metade do século passado, para finalmente conseguir vaga na Preparatória de Leiria sem ter de recorrer aos favores do Senhor Diretor, mandei-me, saída da Faculdade, a fazer o estágio profissional ainda antes do 25 de Abril. Aquele estágio que obedecia a ter professor metodólogo e professor assistente em cada uma das disciplinas a quem tratávamos por Senhor Doutor, que apareciam de surpresa nas nossas aulas para fazerem as 18 assistências obrigatórias anuais em cada disciplina, que nos davam «aulas» semanais de didáctica e de pedagogia a que chamavam seminários de metodologia e nos quais cada uma de nós seis apresentava um trabalho escrito. Para além de tudo isto e de tudo o mais que já nem quero relembrar, tínhamos de preparar uma dissertação sobre um tema de pedagogia relacionado com a nossa prática de durante o ano e que serviria de base à discussão a ter com um júri de professores metodólogos no chamado Exame de Estado.

Recordo com algum prazer e algum orgulho as manifestações em que participei em inícios de Maio de 74, à frente do Ministério na 5 de Outubro, com cartazes improvisados que diziam «Abaixo o Exame de Estado» e das recepções por parte dos chefes de gabinete que ouviam as nossas reivindicações…

Foi só em fins de Maio, já em vésperas da realização da provas do Exame de Estado e com as dissertações prontas a serem entregues, que ficámos a saber que o dito Exame tinha caído. Abençoado 25 de Abril (também por isso).

Não me livrei no entanto de, anos mais tarde, na década de 90, e porque não fizera o malfadado Exame de Estado, ter de me submeter ao exame de acesso ao 8º escalão que compreendia a defesa do currículo e de um trabalho escrito. Nem queiram saber a «chuchadeira» que foi na organização dessas provas cuja discussão era feita num júri constituído por professores que já se encontravam no topo da carreira, ou seja no 10º escalão, a maior parte dos quais nem sabia muito bem o que estavam a fazer.

Mesmo assim e apesar de todas estas e outras vicissitudes, lá fui conseguindo ultrapassar com bastante sucesso todas estas provas (e outras). O mesmo não teria acontecido, tenho a certeza, se – como muitos colegas que desenvolveram a sua vida profissional com denodo e muito sucesso – tivesse de me submeter a uma prova com trinta itens bem diversificados e que me exigisse, eu que sou de professora de Inglês, a responder a questões como esta:

«Um indivíduo entra numa loja para comprar um computador. Quando vai pagar, o funcionário explica-lhe que o preço marcado não inclui um imposto de 19% nem um desconto de 10%.
O funcionário, que trabalha há pouco tempo na loja, tem algumas dúvidas sobre a aplicação das percentagens.

27. Qual das opções que se seguem apresenta um raciocínio correto sobre a aplicação daquelas duas percentagens?

(A) Se calcular em primeiro lugar o desconto de 10%, favoreço a loja, uma vez que o desconto vai ser menor e o cliente paga mais.

(B) Se aplicar em primeiro lugar a taxa de 19% relativa ao imposto, prejudico a loja, pois o desconto vai ser maior e o cliente paga menos.

(C) Como tenho de acrescentar uma taxa de 19% ao preço do computador e depois retirar 10%, posso acrescentar apenas uma taxa de 9%.

(D) O cliente paga o mesmo qualquer que seja a percentagem que eu aplicar em primeiro lugar, os 19% do imposto ou o desconto de 10%.»

Ou como esta:

«O mapa apresenta a rede de transportes de uma cidade. Estão representadas as linhas do metropolitano, a Estação de Comboios, o Terminal de Autocarros e a ligação deste ao Cais para a travessia do rio.
                                          (apresentação de um mapa de transportes)

A rede de transportes começa a funcionar às seis horas.
Do início de cada linha do metropolitano, sai uma carruagem de cinco em cinco minutos.
O tempo que demora a fazer um percurso é contado desde que o metropolitano sai da primeira estação desse percurso até ao momento em que chega à última.
Tenha em conta que: – o tempo médio do percurso entre duas estações consecutivas é 3 minutos; – o tempo médio de permanência numa estação, sem efetuar mudança de linha, é 1 minuto; – o tempo médio de permanência numa estação, efetuando mudança de linha ou de modo de transporte, é 3 minutos.

Do Terminal de Autocarros, sai um autocarro de 10 em 10 minutos, que demora 12 minutos a chegar ao Cais. Do Cais, sai um barco de 15 em 15 minutos, que demora 20 minutos a fazer cada travessia. Quer o barco quer o autocarro regressam de imediato ao ponto de partida.

20. Qual é o menor número de estações em que é necessário passar para ir do Picadeiro ao Quartel?

 (A) 4                 (B)  5                 (C)  7                   (D)  8

21. O Sr. Américo saiu do Mercado às 8 h 40 min e só fez uma mudança de linha. A que horas chegou à Estação de Comboios?
 (A) 9 h 11 min           (B)  9 h 13 min                    (C)  9 h 17 min                   (D)  9 h 19 min

22. Qual é o número mínimo de autocarros e de barcos que são necessários para garantir as condições normais de funcionamento da rede de transportes?

 (A) 3 autocarros e 3 barcos   (B)  3 autocarros e 2 barcos (C) 2 autocarros e 3 barcos   (D)  2 autocarros e 2 barcos

23. O Sr. Alfredo iniciou o seu percurso na estação da Câmara Municipal às 7 h 10 min e vai sair no Terminal de Autocarros para apanhar, no Cais, o primeiro barco que conseguir. A que horas parte esse barco?

 (A) 7 h 20 min         (B)  7 h 30 min                    (C)  7 h 45 min                    (D)  7 h 50 min»

E será assim que se testa a competência pedagógico-didática dos professores? E que interesse tem uma prova destas? Ou será que, para além de se «chumbar neles» para poupar o erário do “governo”, servirão também para mostrar aos pais e aos alunos e ao público em geral que os professores são uma cambada de ignorantes que não sabem o que andam a fazer?

Poupem-nos!!

 
(imagem retirada da net)
 




13 comentários:

  1. Mas por acaso sabe qual foi o ministro que teve a ideia do vexame?

    Caso não, veja então:

    http://www.jornaldenegocios.pt/economia/educacao/detalhe/professores_comecaram_a_fazer_a_prova_de_avaliacao_em_horas_diferentes.html

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  2. Mas foi isto o exame dos apitos?
    Isto é um gozo pegado.

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  3. ~
    ~ ~ Um insulto às ESE-- um opróbrio a todo o sistema!

    ~ ~ Uma das maiores ignomínias nacionais!

    ~ ~ ~ Continuação de excelentes férias. ~ ~ ~

    ~ ~ ~ ~ ~ Abraço. ~ ~ ~ ~ ~

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  4. Parecem aquelas adivinhas que contamos na adolescência.
    Mas aqui está-se a brincar com assuntos muito sérios.
    BFDS

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  5. Estou aqui que nem posso com tamanhas artimanhas para massacrar os que se têm de se submeter a estas provas...Porque precisam de trabalhar para ter pão todos os dias.

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  6. Cruzes canhoto!
    Eu reprovava...:)
    Abençoado estágio clássico, menos complicado do que o teu e abençoada prova de acesso ao 8º escalão à qual também me submeti com sucesso!
    Não me admiro nada com os resultados que já se anunciaram! :(

    Abraço

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  7. Com estes vexames conseguem colocar professores contra professores, um absurdo.

    Boa continuação Graça

    Beijinho e uma flor

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  8. Alguém me explica o que tem esta porcaria de prova a ver com pedagogia e com saber específico da disciplina a ensinar?

    Isto foi só uma maneira mais de demonstrar o desprezo que Passos e Portas têm por nós e, neste caso, pela classe docente através de Crato, que saiu um prepotente e que quanto a rigor ...

    Continuação de excelentes férias

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  9. Garanto-vos que também reprovava! Que chuchadeira!!

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  10. Por acaso sei, Rogerito! Posso "gabar-me" de que sabia (e ainda sei alguma coisinha) de legislação sobre educação desde que comecei a pertencer às direções da escola em 1976 até me reformar em 2010.

    As provas de acesso começaram, aliás como os mega-agrupamentos e os diretores, com que também não concordo, com o Dec -lei 75/2008 do tempo de Maria de Lurdes Rodrigues. Mauzito esse decreto, por acaso. Mas não podemos ter a pretensão de que ela fez tudo bem...

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  11. Acabei de ler e estou com os neurónios em curto circuito. Que vergonha.Que se pretende testar ?!
    M.A.A.

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  12. Não sei, M.A.A., mas que é um desplante, ai lá isso é! É gozar com a classe!

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