domingo, 17 de maio de 2015

O futuro é daqui a bocadinho

Nunca fui pessoa de projetos. Para mim projetos fazem-nos os arquitetos e mesmo esses falham e são tantas vezes alterados. Tive sempre a noção de que o futuro é daqui a bocadinho e, daqui a bocadinho, tudo pode estar virado do avesso. Se calhar porque lá em casa eram um bocado instáveis e andávamos sempre a mudar de casa e de terra, se calhar porque aprendi, à força e desde muito nova, a lidar com as mortes repentinas dos meus mais próximos.

Não suporto a ideia que entrou na moda há uns tempos, aí pelos anos 90, de que tudo tem de obedecer a um projecto, até a vida. Essa do projecto de vida é, no meu modesto entender, mais uma daquelas expressões retóricas falaciosas com que gostam de nos encher a cabeça para que pensemos que somos um povo tão organizado que até fazemos projetos para a vida.

Foi sempre contrariada que fiz, na minha profissão, planificações a longo prazo (que raramente cumpríamos por força de circunstâncias várias que, de um momento para o outro, alteravam tudo). Depois veio a «moda» dos projetos educativos (e elaborei vários lá para a “minha” escola! Imaginam-me a estudar e a propagandear a Metodologia de Projeto? Detestei!) e dos projetos curriculares e mais não sei o quê e o que mais que, garanto-vos, em nada melhoraram coisa nenhuma no que toca às aprendizagens dos alunos. Serviram essencialmente para assoberbar os professores com papelada e para, com essa papelada – quanta mais, melhor! – encher dossiers para a Inspeção-Geral  chegar às escolas e classificá-las de Muito Bom se tiverem X quilos de papelada bonita e apelativa ou de Suficiente se tiver apenas alguns gramas da mesma. Pouco interessa se os alunos fizeram aprendizagens ou não. Interessam os papeis, se possível com muitos gráficos comparativos…

Mas porque estou eu a falar de escola? Eu queria apenas dizer que não acredito na “moda” dos projetos porque o futuro é daqui a bocadinho e, daqui a bocadinho, pode já estar tudo ao contrário.

Tudo isto porque me lembrei daquela canção – lembro-me tantas vezes! – «Look what they’ve done to my song, Ma!» A gente pensa que vai ser assim, desta e daquela maneira, como romanticamente imaginámos a nossa canção e, de repente, sopra um vento destrambelhado  e muda tudo…

Foi em 1969 que a Melanie Safka nos trouxe essa canção na sua voz arrastada e rouca de cantora folk e, no ano seguinte, a (malograda) Dalida apresentou-a na versão francesa «Ils ont changé ma chanson».


Vejam qual preferem.







18 comentários:

  1. O plano de destruir canções não falha.
    E o futuro que se projecta
    manda que o socialismo não saia da gaveta

    Melanie,
    gosto mais dela desde que a ouvi

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  2. Sou o exemplo vivo do que acaba de escrever, Graça.
    Quando é que me passou pela cabeça vir para Macau?
    Nunca!
    Depois de vir, quando é que imaginei que aqui ia casar e constituir família??
    Que disparate!!
    Depois de casar e constituir família, ficar em Macau e não regressar à Pátria??
    Era o que faltava!!
    Et pure.....
    Beijinhos, boa semana

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  3. Bom dia Graça
    Entre o tudo e o nada existirá sempre alguma coisa.
    Penso que devemos sempre ter um projecto,um plano,um desejo...Alguma coisa...
    Pessoalmente gosto de saber para onde vou, o que quero, qual o melhor caminho.
    Poderei chamar-lhe outras coisas mas terá sempre este sentido de viver.

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    1. Claro, amigo Luís, concordo! Só me exaspero contra o exagero de «projetos» que toda a gente inventa por tudo e por nada...

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  4. Eu gostava de ter o dom de escrever o que escreve e como escreve...
    Sempre gostei de planificar tudo ou quase tudo...tudo "direitinho " ( sem ser de direita ) , como gosto de dizer , mas esse vento destrambelhado sopra sempre sempre...e se não é de um lado , vem de outro. é tão chocante que , quando digo " gostava que isto ou aquilo fosse assim "....acontece ao contrário...para não ter chatices , deixei de planificar , deixo correr e não me incomodo . ou antes , faço por não me incomodar.
    M.A.A.

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    1. Querida M.A.A., realmente não mereço a simpatia das suas palavras...
      É assim que me sinto também: «faço por não me incomodar»....

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  5. Em toda a vida que já vivi (curta por sinal), vivi na ansiedade de realizar os projectos no futuro e agora que olho para trás, não realizei nada do que idealizei porque o que planei para fazer aos 19 já não em apetece fazer...

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    1. O pior é quando nos continua a apetecer e já não dá para fazer o que se idealizou...

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  6. O futuro ...como ele muda de repente.
    Gosto mais da primeira versão.

    O meu beijinho agradecido querida amiga, aos poucos vou-me reerguendo.

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    1. Tem de ser, Fê, querida!! Como de costuma dizer: a vida continua... Como dizem por aí: «quando pensamos que sabemos as respostas todas, a vida muda-nos as perguntas.»
      Beijinhos solidários.

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  7. Gostei de recordar a canção.

    Desta vez , não estamos totalmente de acordo.

    Defendi a Pedagogia de Projecto com as devidas cautelas, porque tive motivos para isso... e porque gosto de ter uma ideia sobre a linha que quero seguir, embora nunca perca a noção de que nada tenho nas mãos.

    Beijinhos e boa semana

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    1. Mas não estamos assim tão longe.... Não ser de projetos não quer dizer que não tenha uma linha orientadora e convicções bem fortes...
      Beijinhos

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  8. Também a minha vida já se alterou demasiadas vezes para me pôr a projectar!
    Prefiro a versão inglesa.
    Beijinhos

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  9. Todos, em qualquer tempo, em qualquer situação tivemos/temos projectos. O que não acontecia antes é que não se perdia muito tempo a registá-los, ao milímetro, floreando contextos, inventando recursos e fazendo depender desses registos o sucesso do projecto em si. Depois eles multiplicaram-se como cogumelos (falo das escolas, concretamente) e o que aconteceu foi que com tanto tempo gasto no "registar", ficou pouco tempo para o "aplicar".
    Isto é o que se chama "ter mais olhos que barriga".

    Bj.

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  10. Como descobri, à minha custa, que o homem põe e Deus dispõe, há muito deixei de fazer planos para avida. Vivo um dia de cada vez e deixo-me ir ao sabor dos acontecimentos.
    Se me agradam, embarco , se não fico em terra!...

    As canções ouvi-las-ei noutra altura, hoje tive um dia muito preenchido e com pouquíssimo tempo para andar na blogo!

    Beijinhos, Graça!

    Janita

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