16 de Março de 1974
«Já tinha acabado tudo. Sabia-se
que a coluna fizera meia volta e regressara às Caldas a poucos quilómetros da
chegada a Lisboa.
- Mas que raio de barracada foi
esta? – interpelava [Ruben Rodrigues].
Expliquei-lhe o que podia no
momento. A perplexidade persistia.
- Mas como pôde a malta alinhar
nisso? Tava-se mesmo a ver que dava raia!» (…)
«São dez horas quando a coluna
motorizada, regressada às Caldas, entra os portões do RI 5, que logo se fecham.
Com o comandante, o 2º comandante e os três majores da unidade neutralizados,
Monge e Casanova tomam conta da situação, assumindo até final, com
extraordinária dignidade, pesadas responsabilidades.
Cerca das onze horas, o
brigadeiro Pedro Serrano, 2º comandante da Região Militar de Tomar, ordena o
corte da luz, da água e dos telefones à unidade. Pelas doze horas, forças do RI
7 e do RAL 4, de Leiria, do RI 15 de Tomar, da EPC de Santarém (em Chaimites) e da brigada móvel da PSP
(então estacionada na Marinha Grande para repressão de uma greve de operários
da indústria vidreira) sitiam o quartel. Monge e Casanova ordenam que não se
faça um único disparo. Aquela é uma guerra de ideias e não de armas, que irmãos
não lutem contra irmãos. Perto das catorze horas, com o quartel cercado, Pedro
Serrano, em pé dentro do jipe, ordena à porta das armas da unidade rendição,
concedendo para tal um prazo de quinze minutos. Monge e Casanova respondem que
só entregam o RI 5 e o portão a Costa Gomes e Spínola. Mas é uma bravata final.
Reconhecem que não há qualquer hipótese. Reunindo os oficiais da unidade decidem-se
pela rendição. Sabem que a intentona e a sua missão de sacrifício não serão
vãs. À opinião pública nacional e internacional chegará uma vez mais a
informação de que em Portugal o Exército se agita e que os jovens oficiais causticados
pela guerra colonial não partilham da fidelidade canina dos generais jarretas e
corruptos ao Governo.»
(A coluna das Caldas - foto daqui) |
À noite, no telejornal foi lida
uma nota do Governo:
(…) «O Governo tinha conhecimento
de que se preparava um movimento de características e finalidades mal definidas,
e fácil foi verificar que as tentativas realizadas por alguns elementos para
sublevar outras unidades não tinham tido êxito.
Para interceptar a marcha da
coluna vinda das Caldas, foram imediatamente colocadas à entrada de Lisboa
forças de Artilharia 1, de Cavalaria 7 e da GNR.
Ao chegar perto do local onde
estas forças estavam dispostas e verificando que na cidade não tinha qualquer
apoio, a coluna rebelde inverteu a marcha e regressou ao quartel das Caldas da Rainha,
que foi imediatamente cercado por unidades da Região Militar de Tomar.
Após terem recebido a intimação
para se entregarem, os oficiais insubordinados renderam-se sem resistência,
tendo imediatamente o quartel sido ocupado pelas forças fiéis, e
restabelecendo-se logo o comando legítimo.
Reina a ordem em todo o País.»
(in «Alvorada em Abril» O. S. Carvalho, 1977)
(Não sabiam que esta
ordem reinaria em todo o País apenas por mais quarenta dias.)
Regressara a Portugal poucos dias antes e desde esse dia fiquei com a sensação de que ou não iria cumprir o serviço militar ou, pelo menos, que não iria dar com os costados para África. Entrei para Mafra no dia 22 de Abril, mas não fui para África.
ResponderEliminarSalvo pelo gong... Ainda bem!!!
EliminarEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarUma tentativa frustrada de revolta, mas que acabou por dar frutos - que já apodreceram - mais tarde!
EliminarE agora?
Somos livres de ditaduras políticas e prisioneiros da tirania económica!
Precisávamos que aparecesse um General sem medo - do trabalho - com sabedoria de liderança!
Beijinho
É verdade, Janita!!! Mas não se vislumbra ninguém, infelizmente.
EliminarA propósito: acabei de ler as «Memórias de Humberto Delgado» - gostei bastante. O homem era um "doido" mas destemido a sério - por isso teve aquele final infeliz e injusto.
Beijinho.
Também assim se escreve a História...
ResponderEliminarAcredita que só tive conhecimento desta intentona bem depois do 25 de Abril?
ResponderEliminarCerto que se murmurava alguma coisa sobre o assunto nos meios militares, em Luanda, mas nada de concreto e os civis nunca tomaram conhecimento. O próprio 25 de Abril só foi dado a conhecer oficialmente quase uma semana depois.
Um abraço e uma boa semana
Não havia telemóveis nem internet, Elvira..... E, além disso, havia uma cultura de não informação dos acontecimentos - quantos menos o povo soubesse, melhor!
EliminarBeijinho
Relembrar a História.
ResponderEliminarUma tarefa que muito boa gente vai fazendo por esquecer ou branquear
Beijinhos
Como convém, Pedro.....
EliminarBeijinho
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminar~ A bravura de quem estava consciente da exposição e seus terríveis efeitos.
ResponderEliminar~ O julgamento executado por um Tribunal Militar por «crime de lesa-pátria», neste caso, «alta-traição», não só colocá-los-ia no lixo, como os marcaria com um estigma degradante para toda a vida. Por isto, tanto demorou a revolução!
~ ~ ~ ~ Uns heróis que bem merecem ser homenageados. ~ ~ ~ ~
~~Bjs~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~
Mas são-no muito pouco, Majo! Em termos gerais, os portugueses continuam a obedecer aos seus arquétipos fascizantes e clericais...
EliminarLembro-me muito bem e como " cheirava " a qualquer " coisa " que andava no ar... Bons tempos.
ResponderEliminarAgora , cheira a mofo ,carteiras conspurcadas , aldrabões , sofreguidão por um lugar ao sol , nada.
M.A.A.
Que bem me lembro desse dia, Graça !!! :(( ... Um dia que chegou a fazer perder a esperança a muitos, mas que acabou por "virar o feitiço contra o feiticeiro" ! ...
ResponderEliminardespertou alguns espíritos mais confiantes e fez "adormecer" um poder convencido do seu domínio absoluto !
Infelizmente, passados uns poucos anos o ódio e a sede de vingança transtornou alguns desses militares, o que poderia fazer cair por terra os verdadeiros ideais da Revolução. :(( ... "Nem tudo eram rosas" !
Infelizmente ainda, bastante mais tarde, não soubemos assumir um verdadeiro espírito democrata provocado pela falta de bons e honestos políticos.
Neste momento só vejo uma saída : Um General Eanes, num regime que eu gosto de apelidar (a brincar) de "Ditadura Democrática" (rsrsrs) Presidencialista ! :))))) ... a Democracia, tal como a temos vivido, "não me cheira" ! :(((
Beijinho Graça ! :)))
Nos, humanos, estamos longe de sermos perfeitos, Rui....
EliminarBeijinho.
~ Rui Santo, Amigo querido.
ResponderEliminar~ O tema do debate é «A Intentona das Caldas»...
~ ~ ~ Beijinhos. ~ ~ ~
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Tens razão, Amiga ! :))) ... Faz de conta que só escrevi 4 linhas ! rsrs
EliminarBeijinhos
Tudo bem.... Este espaço é livre...
EliminarAmiga Graça, obrigada por nos relembrares este momento histórico.
ResponderEliminarbeijinho
Fê
É nossa obrigação, Fê!!
EliminarBeijinho
Da intentona nada soube, andava de mochila às costas a fazer desporto radical. Da Revolução sim; o capitão reuniu os graduados da Companhia para lhes comunicar que, na metrópole, tinha havido "uma" revolução. Data e local do briefing: cerca das 14,00 h, do dia 25 de Abril, em Mussenga, Em Angola que se dizia ser nossa.
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