segunda-feira, 10 de junho de 2013

Dia de Camões


Há dias, pelo aniversário da morte de Jorge de Sena, o nosso amigo Rui da Bica manifestou o seu mais veemente desagrado (que eu tenho de aceitar) pelo citado poeta e escritor por ter, na sua opinião, renegado a pátria destratando-a em dois poemas violentos que ele transcreveu no seu blog.

No Dia de Camões, o chamado príncipe dos poetas portugueses, deixo aqui duas estrofes do final do Canto X de Os Lusíadas – escolhi estas, poderia ter escolhido outras – em que também o insigne poeta da nossa bela e tão propalada, embora pouco e mal lida epopeia, no seu tom elevado e grandíloquo, se queixa amargamente da pátria, das portuguesas gentes e até de el-rei. Isto em pleno século XVI.


No mais Musa, no mais, que a Lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda, e endurecida:
O favor com que mais se acende o engenho,
Não no dá a pátria, não, que está metida,
No gosto da cobiça, e na rudeza
D' hua austera, apagada, e vil tristeza.
(…)
Mas eu que falo, humilde, baixo e rudo,
de vós não conhecido nem sonhado?
Da boca dos pequenos sei, contudo,
que o louvor sai às vezes acabado.
Nem me falta na vida honesto estudo,
com longa experiência misturado,
nem engenho, que aqui vereis presente,
cousas que juntas se acham raramente.

Para servir-vos, braço às armas feito,
para cantar-vos, mente às Musas dada;
só me falece ser a vós aceito,
de quem virtude deve ser prezada.
(…)

(Canto X)

(Também, quem, de inteligência e cultura superiores e conhecedor de outras gentes e de outras culturas, de outras civilizações, consegue não se queixar deste povo, deste país?)


9 comentários:

  1. Qualquer homem sério, mesmo que poeta, nunca deixa de constatar os problemas de que o País padece ou padeceu noutros tempos (que acabam por rondar quase sempre os mesmos problemas). Por mais que ame a sua Pátria...

    Beijocas, Graça!

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  2. Como não tenho inteligência e cultura superior, embora conhecedora de outras gentes e de outras culturas, de outras civilizações, não me queixo do nosso povo.

    Em tempos o nosso amigo Rui publicou um artigo sobre Jorge de Sena, e eu então, tentei explicar num comentário a sua atitutude contra a gente deste país de "rasca chinela".

    Li e gostei do que tu escreveste lá em baixo sobre um dos maiores poetas, intelectuais e tradutores portugueses, que foi repudiado por "safardanas" promovidos a grandes pelos partidos respectivos.

    A propósito partidos, a sua grande amiga Sophia escreveu numa carta de Março de 1978, o seguinte:

    "O PS tem da cultura uma noção decorativa radicalmente burguesa."

    Um abraço da amiga de longe, Teresa

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  3. Eu não sabia que esse era o dia de Camões. Conheci um pouquinho da poesia de Camões ainda bem menina, pelas mãos do meu avô. Tenho guardado comigo com todo carinho um livro de sonetos de Camões com edição de 1913, de Lisboa, que meu avô deu como primeiro presente de namoro para minha avó. Uma semana antes de meu avô falecer repentinamente, eles me deram de presente esse pequeno livro, para que guardasse como uma recordação deles.
    Ao ler tua postagem, lembrei desse pedaço tão querido da minha vida.
    Beijos

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  4. E a Lusa Gente continua descontente
    Pelos desgovernos de má gente
    Atrevida, fingida e prepotente
    Que nos arruína constantemente...

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  5. Gracinha

    Mesmo aqueles "que se vão da lei da morte libertando" são seres humanos sujeitos a contradições...
    Camões também canta:

    "Cessem do sábio grego e do troiano
    As navegações grandes que fizeram;
    Cale-se de Alexandre e de Trajano
    A fama das vitórias que tiveram,
    Que eu canto o peito ilustre lusitano,
    A quem Neptuno e Marte obedeceram;
    Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
    Que outro valor mais alto se alevanta."

    Todos os povos têm qualidades e defeitos que entram em choque muitas vezes através das palavras dos mesmos observadores!
    Infelizmente, no contexto actual, vivemos uma situação para a qual fomos empurrados por forças antagónicas...e lá voltamos às contradições do ser humano!

    Abraço

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  6. Grande este guerreiro escritor, que narrou as façanhas de outrem com a beleza da escrita: o verso.
    Dia da Raça, dia de Camões, ou como quer que se chame hoje, ao fim e ao cabo o dia de Portugal. Parabéns!!!
    Abraços de vida

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  7. E não vou acrescentar nada, porque todos os comentários atrás já refletiram sobre o que se pensa.

    beijo

    Laura

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  8. Gostei muito deste post, mas ainda mais dos comentários.:)
    bji, Gracinha

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  9. Graça, minha amiga
    Chegou o momento de agradecer, a cada um particularmente, os comentários deixados na minha «CASA» no dia 6.
    Tens razão, nunca nos habituamos às separações, por muitas a que estejamos sujeitos. Mas… algumas custam mais do que outras. Acontece com toda a gente, não é verdade?
    Obrigada pelo carinho da tua presença.
    Beijinhos

    Para mim, Luís de Camões foi o maior poeta português de todos os tempos. Adoro os seus poemas, nomeadamente «Os Lusíadas».
    Que ele tenha criticado o seu país e suas gentes parece-me mais que natural, na medida em que também a pátria não o honrou como devia.
    E nós, passados tantos anos, não temos também motivos (largos motivos) de queixa?
    Olha o que se está passando com os professores, por ex. (tenho uma filha professora); até os próprios alunos, pelo que ouvi hoje na TV, estão a favor dos professores, mau grado o prejuízo/transtorno que lhes possa causar.

    PS – A minha próxima postagem será no dia 14, como habitualmente.

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