(O dia 5 de Maio foi fixado como a
data em que é anualmente comemorada a “Língua
Portuguesa e a Cultura da CPLP”, uma decisão saída do XIV Conselho de
Ministros da CPLP, realizado em Junho de 2009, em Cabo Verde. Nesta data, os ministros
dos Negócios Estrangeiros e das Relações Exteriores recomendaram aos
Estados-membros, às instituições da CPLP, aos Observadores Associados e
Consultivos e às diásporas dos países da CPLP, a comemoração do Dia da Língua Portuguesa, tendo em vista a sua
afirmação crescente nos Estados membros e na Comunidade internacional.)
E para me associar, deixo aqui, sobre
a nossa bela língua, um excelente texto de Eduardo Lourenço e um poema de amor
de Hélia Correia, ambos transcritos do Jornal de Letras, de Março/Abril do
presente ano.
Língua
e enigma
«O coração do enigma para cada povo é
a língua em que a sua leitura do mundo se manifesta como mistério ao mesmo
tempo luminoso e obscuro. É na língua e na língua ó que somos virtualmente
imortais. Tudo se passa como se não pudéssemos ser sujeitos dela. Somos falados
antes de falar e falamos para nos falar. Sem começo nem fim. Só no século XVIII
quando o Ocidente começou a esquecer a língua como “dom de Deus” um ato recapitulativo
de um Verbo criador do mundo, o mistério dessa revelação com sujeito, criadora
ao mesmo tempo da voz, da consciência dela e do sentido da sua nomeação de toda
a realidade, se converteu no enigma dos enigmas. Começou então a nossa marcha
do Deserto. Falamos para povoar o mundo. E ao mesmo tempo para regressar a essa
linguagem antes da linguagem, a essa língua divina, a do homem ainda não
separado do universo e de si mesmo, sujeito de múltiplas línguas mas lembradas
da única que dizia o Ser sem o mutilar, aquela que fala no silêncio do mar e
nos cala.
Todas as línguas do mundo desenham
nele o bem pouco mítico arquipélago de Babel. O mistério de cada uma participa
dessa aventura humana sob a forma de um rizoma. Só a História singular de cada
uma delas desvela os seus segredos. Não são os mesmos para o Japão, ou Bornéus,
isolados milénios dos seus vizinhos, que os do ramo indo-europeu onde a nossa
mergulha as suas raízes. Essa raiz sânscrita só para filólogos terá algum
sentido. Para nós, mortais comuns, basta-nos o batismo camoniano, ou da matriz
latina sob a qual se sumiu misteriosamente, ou quase, a nativa herança
lusitana. Foi aquela que se derramou no mundo juntamente com o castelhano como
as primeiras línguas no mundo do Ocidente.
Nem ela nem a dos nossos vizinhos
têm os dias contados. Até onde podemos imaginar-lhe o futuro, essa língua, hoje
de variados tons, é um dos mais insólitos milagres linguísticos imagináveis,
dada a sua origem tão modesta. Este simples estatuto devia poupar-nos todas as
glosas apocalíticas acerca da sua perenidade. Como os amores míticos de Pedro e
Inês, a língua em que eles couberam arderá até ao fim do mundo.»
Eduardo
Lourenço, JL, Março/Abril 2012
(Hélia Correia) |
Por
ti eu troco a noite pelo dia
Por ti eu troco a noite pelo dia,
Como é o natural de uma paixão.
Do fado e dos poetas que seria,
E dos amantes, sem a escuridão?
E salta-me no peito o coração
Se certa voz murmura e pronuncia
Palavras já tão ditas mas que são
Pedaços de um segredo que arrepia.
De Gregos descontentes, de Latinos
Com pouca corrupção dileta herdeira,
Menina e moça, ó flor de verdes pinos.
Além da Taprobana transportada
E sempre renascida e sempre inteira,
Eis a ditosa língua, minha amada.
Hélia
Correia, JL, Março/Abril 2012
Olá, amiga Graça, que bom vir aqui e ler esta postagem, tiraste nota dez, mil, eu adorei ler o texto e mais ainda esse belo poema, que delícia!
ResponderEliminar*)
"E salta-me no peito o *coração
se certa voZ murmura e pronuncia palavras já tão ditas mas que são pedaços de um segredo que arrepia!"
Coisa mais linda!
Bela noite de sábado, e parabéns e também muito obrigada por compartilhar ... Mery*
Cara Graça Sampaio
ResponderEliminarAcabo de escrever um texto em que usei uma expressão de Camões, desconhecia a comemoração do dia.
Sabe bem sentir que ainda temos algo de que nos orgulhamos, como está bem exemplificado no texto de Eduardo Lourenço e no poema de Hélia Correia.
Grato pela partilha.
Um beijo
Rodrigo
Que belos textos! Que boa postagem! Mais uma vez parabéns.
ResponderEliminarGostei de ler a forma como esse dia foi abordado.
ResponderEliminarBom domingo.
Passei para te desejar um dia feliz.
ResponderEliminarAbraco
Obrigada por terem gostado das minhas escolhas.
ResponderEliminarObrigada, Catarina, beijinhos e boa semana.