«Ele avança a morder-se o lábio,
e da estalada ela esquiva-se, sentiu de que lado vinha, outra vez o jogo que
sabemos como se joga, mas com a outra mão ele agarra-lhe o cabelo, e como vem
quase a correr, consegue desequilibra-la, a puxá-la pela nuca, para o lado e
para baixo e depois para o lado outra vez, e é incrível a rapidez de um corpo
enlouquecido a atacar e a de um corpo aterrorizado a defender, ambos capazes de
tudo, e com isto estão na cozinha
- Como é que vai ser então, como
é que vai ser minha puta
Ela procura tapar a cara com as
mãos, está com as mãos na cara desde o início, porque conhece o jogo, porque
não quer ver, nem é tanto pela sova que vem aí outra vez, tapa os olhos e quase
tenta cantar baixinho, tapa os olhos porque não quer ver a sua vida outra vez
outra vez outra vez.
Mas só consegue proteger a cara
com as mãos nas primeiras três pancadas contra o frigorífico.
Depois as mãos soltam-se,
devagar, na ponta dos braços caídos ao longo do tronco, porque a quinta e a
sexta vez que lhe atira a têmpora contra o frigorífico ela já não está bem ali.
E não disse nada, não vai dizer
nada, sabe muito bem a táctica do jogo, mas é dentro de casa, porque ele vem a
arrastá-la pelos cabelos da nuca para fora da porta, para as escadas do prédio,
pelos degraus abaixo»
(«O Pianista de Hotel»; Rodrigo Guedes de Carvalho; D. Quixote; Lisboa;
2017, pp 97-98)
Este é um breve trecho de um
romance (que ando a ler, se bem que sem grande entusiasmo porque, a páginas
cento e tal, ainda não encontrei o fio condutor) mas podia muito bem tratar-se
do testemunho de uma qualquer mulher deste nosso encantador país.
Mas – e aqui devo escrever um MAS com letras bem grandes – MAS teria de tratar-se de uma
mulher sem instrução, provinciana, das berças, com a educação do tempo das
nossas bisavós, ou burrinha de todo, demente talvez.
Não, meus caros amigos, não estou
a ironizar e muito menos a duvidar dos muitos testemunhos das muitas mulheres
que são agredidas e violentadas e até mortas pelos homens! Estou tão-somente a ir
ao encontro da leitura que os juízes e JUÍZAS da “nossa” praça fazem dos casos
que se lhes apresentam.
Que saibamos, já são dois os
casos em que o homem agressor é ilibado de culpas pela “justiça” dado as
respetivas mulheres serem consideradas “modernas, esclarecidas, destemidas e
independentes pelo que têm a obrigação de se protegerem e aos respetivos filhos”.
Palavras de juíz(a)! Isto sem esquecer o anterior caso do inexorável juiz Neto
de Moura & Cª.
Ora nesta ordem de ideias, meus
caros amigos homens, ficam – aqueles que assim o entenderem e que tenham
mulheres modernas, destemidas e independentes – livres e à vontade para lhes
carregar sempre que vos apetecer, mordê-las, cuspir-lhes, atirá-las ao chão ou
pela janela fora, parti-las, matá-las e aos filhos! A responsabilidade não vos
vai ser atribuída! Elas é que – algumas bêbadas, outras umas desarrumadas, outras umas devassas, umas putas – logo após a primeira bofetada, têm a obrigação de sair de casa,
nem que seja para debaixo da ponte, para se porem a salvo da vossa abençoada
força de macho latino protegido pela lei da Bíblia e da Justiça portuguesa!
Quanto caminho por percorrer... :(
ResponderEliminarUm longuíssimo caminho, Luísa!
EliminarGraça, não tenho opinião formada relativamente ao caso Bárbara e Carrilho pelo facto de não conhecer as coordenadas. Ou seja, não conheço os implicados e nem sei o que aconteceu relativamente a violência. Tomei conhecimento pelo que fui lendo, que é o que sucede com a maioria, o que é muito pouco para tomar partido. Quem falou verdade, o que na realidade aconteceu, etc.... Sem se estar na posse de provas, não tomo posição face a questões tão sensíveis.
ResponderEliminarSei que as condições e perfil psicológico de ambos devem contar para a avaliação. Se tal foi tido em conta em igual medida, não sei.
Boa semana e feliz Natal!
Não queria referir-se a esse caso em particular, mas tão-somente a propósito dele. Até porque antes deste caso, outro houve em Viseu, parece-me, em que o homem foi considerado inocente pelo mesmo motivo - a mulher era independente e moderna...
EliminarMuito mau...
Beijinho, Isabel! Boas Festas.
Quem não conhece casos reais?
ResponderEliminarCusta a acreditar que ainda existam.
Sobretudo entre gente supostamente educada.
Bandalhos!!
Beijos, boa semana
É verdade, Pedro! E depois virem juízes e JUÍZAS darem estas razões, acho abominável!
EliminarBeijinho.
Graça, eu neste caso em particular, percebo a sentença (não havia prova pericial e as testemunhas não foram esclarecedoras), só não entendo as palavras justificativas da juíza (como não entendi as ainda mais absurdas do outro juíz).
ResponderEliminarOu seja, os próprios agentes da justiça, são os primeiros a prestarem-lhe um mau serviço.
abraço
Sem dúvida, Luís! Neste e em tantos outros casos e não só deste âmbito. A nossa Justiça anda muito por baixo; muito dominada por interesses económicos e partidários. Uma vergonha.
EliminarBeijinho.
Pois... Muito complicado.
ResponderEliminarBeijo e uma excelente semana
Complicado e indecente. E não me refiro a este caso em especial.
EliminarBoa semana!
Difícil e complicado de comentar. Existe de tudo na vida.
ResponderEliminar.
Hoje: ***Mulher:» O equilíbrio emocional. A solução***
.
Votos de um dia feliz
BOM NATAL
.
Parece que vem a propósito... mas não podemos exigir tudo à mulher - imperfeita que é tanto como o homem.
EliminarBom Natal para vós.
Infelizmente não vejo jeito em que deixe de acontecer!
ResponderEliminarFeliz Natal e um 2018 felicíssimo!!!bj
Havendo mais educação e menos ignorância, talvez...
EliminarBeijinho.
Fiquei muito interessada no livro. Este assunto é muito inquietante e chega a parecer impossível não só que aconteça como também que ainda haja alguém que ache que a culpa é das mulheres...
ResponderEliminarUm beijo, Graça e desejos de um bom Natal e de um ano novo melhor.
Obrigada, Graça. Boas Festas para vós e um Bom Ano.
Eliminar(O livro é como que um relato da vida - das vidas - atual. Está interessante, mas não é uma obra prima.)
Beijinho.
Olá, Graça
ResponderEliminarA minha visita de hoje tem apenas como finalidade desejar BOAS FESTAS.
E, para isso, nada melhor do que fazer-me acompanhar de Mahatma Gandhi (Mahatma – “A grande Alma”), e suas sábias palavras:
“Se eu pudesse deixar algum presente a você, deixaria aceso o sentimento de amar a vida dos seres humanos.
A consciência de aprender tudo o que foi ensinado pelo tempo afora.
Lembraria os erros que foram cometidos para que não mais se repetissem.
A capacidade de escolher novos rumos.
Deixaria para você, se pudesse, o respeito àquilo que é indispensável:
Além do pão, o trabalho.
Além do trabalho, a acção.
E, quando tudo mais faltasse, um segredo:
O de buscar no interior de si mesmo a resposta e a força para encontrar a saída."
(Gandhi)
UM SANTO E FELIZ NATAL!
Beijinhos
MARIAZITA / A CASA DA MARIQUINHAS
PS - Tenho que voltar para ler; o assunto é por demais interessante (interessante porque tem interesse!). Só li, na diagonal, a parte do teu texto...
Será sempre bem-vinda!
EliminarObrigada pela visita, pelas palavras e pelo voto de Boas Festas, que retribuo com amizade.
Beijinho.