quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Final feliz!




Encontrei hoje na pastelaria/padaria (a forma europeia de acabar com as nossas tradicionais padarias forradas a azulejo e onde se vendiam os belos papossecos, as vianinhas, as carcaças de 16 e o substancial pão de 2ª) uma jovem morena toda produzida, filha de uma moradora aqui da rua e que conheço desde pequenina. Sempre me cumprimentou bem, coisa que nem sempre acontece com as pessoas desta cidade, mas, desde que começou a namorar com o actual marido, ficou mais apegada a mim por eu o conhecer já que fora aluno na “minha” escola.

De facto, quando, há muitos anos, os vi de namoro pegado, fiquei algo apreensiva. A pequenina C. que eu me habituei a ver na brincadeira lá na rua com aquele miúdo mal educado e sem maneiras, não me agradou nada.

Foi lá para os inícios de 80, no primeiro Conselho Directivo de que fui presidente, estávamos nós de malas aviadas para deixarmos as instalações do Antigo Lyceu de Rodrigues Lobo para irmos estrear as já na época acanhadas instalações de modelo sueco onde a D. Dinis ainda labora, na época em que ainda se registavam muito poucos casos de indisciplina, que apliquei a minha primeira suspensão das aulas a um aluno. E foi àquele miúdo que encontrei na velha piscina municipal ainda ao ar livre, de mão dada com a C.

Um miúdo de uma classe sócio-cultural (não gosto de dizer ‘classe social’) bastante desfavorecida, lá da Calçada de Bravo, macambúzio e agressivo, que se portava muito mal nas aulas e também nos recreios. Dois dias de suspensão das aulas! Escrevi à mãe que se apresentou na escola, humildemente, pedindo desculpa pelo mau comportamento do filho; que o pai batia; que se o pai soubesse; que ia fazer com ele em casa; que... que...

Eu era ainda muito nova, mas já tinha as minhas filhas ambas e pensei nelas, claro! E disse à mãe:«o Zé fica de castigo aqui no meu gabinete a fazer trabalhos.» E assim foi: durante dois dias o Zé preencheu o seu horário escolar numa mesa no meu gabinete passando cadernos a limpo e fazendo trabalhos de Língua Portuguesa sob a minha supervisão. Ia lanchar comigo ao bar e almoçou comigo na cantina. Ficou meu amigo até hoje e não teve mais suspensões. Não passou a ser um bom aluno, nem fez nenhum curso superior, mas faz a sua vida.

Sei que casaram, que se dão bem, ele um homem discreto e calado e ela uma morena produzida, com ar descontraído, têm uma filha que a C. me disse que faz hoje 12 anos. Lá estava a encomendar o bolo de anos para a miúda ir fazer a festa com os amigos para o McDonald’s. Final feliz!

Claro que não tive qualquer influência no percurso de vida do Zé, mas acredito que os miúdos difíceis e perturbadores têm as suas razões (íntimas e profundas) para assim serem e que têm de ser muito bem compreendidos e tratados com muito carinho, muito cuidado,  muita sensibilidade e sensatez.

7 comentários:

  1. E que continuem a viver a sua história de amor!:-)

    Abraço

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  2. Se até na minha vida já intervens:)

    Herr Director!!! Pois pois...

    Gostava que visses agora os novos Directores!!!!

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  3. Pois eu prefiro pensar que tiveste alguma influência. Tivesse esse episódio sido hoje e a mãe e o pai iriam à escola exigir-te explicações por andares a traumatizar o seu "menino".

    Beijocas!

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  4. Concordo com o comentário do Rafeiro...
    Hoje é tudo tão diferente... para pior. Nem os Professores, nem os Pais, nem ninguém mete os meninos na ordem por ir sempre contra alguma Carta de Direitos Qualquer. Tanta evolução para ISTO!!!!

    Ou as famílias são boas educadoras ou então... os jovens vão estragados para a vida activa e é o fracasso total. (tive vários exemplos desses no meu emprego e achei lastimável)

    Ainda bem que grandes amigas minhas virtuais, ex-professoras, têm bons exemplos de FINAIS FELIZES.

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  5. Carol amiga,

    Esqueci de dizer que tem selo de Qualidade para ti lá no meu cantinho.

    Beijosssss

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  6. Antes de mais, obrigada à Tite pelo selinho... és uma querida!
    Depois, obrigada por me darem o benefício de pensar que tive alguma influência naquele aluno. Só deixei a direcção da escola ainda não há um ano e continuava a pô-los lá no meu gabinete a trabalhar. A diferença é que os miúdos já não eram tão humildes como o Zé...
    Quanto aos actuais Directores... são uns pobres Zés... Têm a mania que têm muito poder, mas têm é de passar a vida a preencher dados nas plataformas informáticas do ME...Nunca percebi para que é que este governo "inventou" o directores para depois os maltratar e querer acabar com tantos!

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  7. São de Professores (as) como a Carol que este País precisa, mas antes precisa de:

    1 - Dignificar o papel dos professores

    2 - Motivá-los para a sua profissão

    3 - Não os "encher" de papelada que lhes retira o tempo e a concentração necessária para aquilo que melhor sabem fazer, isto é, ensinar.

    Dir-se-à prioridades, direi eu, a pirâmide das prioridades do Governo Português está ...invertida!

    Obrigado, por ter mudado a vida a esse rapaz, estou certo que também mudou a vida a outros tantos ao longo da sua carreira.

    Bem haja!

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