Uma excelente reflexão de Guilherme de Oliveira Martins sobre o 25 de Abril, um pouco/muito de História que não resisti a trazer aqui.
«Não é possível entender o 25 de abril
de 1974 sem o inserir no longo prazo da história. Quando lemos Fernão Lopes a
descrever os acontecimentos de Lisboa de 1383, percebemos que há, na distância
do tempo, elementos comuns de determinação e rebeldia, que nos levam a pensar
noutros momentos cruciais de mudança política. (…)
Como disse Jaime Cortesão: «a
Nação só atingiu a maioridade política e a plena expressão nacional com a
revolução democrática do século XIV, conforme lhe chamou Oliveira Martins, e o
triunfo e incorporação das classes populares na vida pública.» (…)
Pensar no 25 de abril é, assim,
referir um acontecimento que se insere numa longa continuidade histórica, que
Francisco Sousa Tavares bem compreendeu no Largo do Carmo, em cima de uma
guarita, como o primeiro civil, invocando o paralelismo com o Primeiro de
Dezembro de 1640. Ao fazê-lo, afirmou que era um sinal inequívoco de
independência histórica que ali estava a ser dado. De facto, 1974 situou-se num
encadear de acontecimentos que vêm da independência do Estado no século XII. Daí
se parte para o misterioso desenlace da crise de 1383-85, continuando na
afirmação dos tempos de coruja e de falcão do Príncipe Perfeito, na chegada à
Índia com D. Manuel e no movimento pendular que envolve o desastre de
Alcácer-Quibir e o renascimento da Restauração da independência – e desde o
século XVIII: a glória do ouro, a maldição do terramoto, e reconstrução e a
reforma de Pombal, a guerra peninsular de libertação nacional; bem como a
difícil afirmação do liberalismo constitucional – 1820, guerra civil, vitória
liberal, revolução de setembro de 1836, nova guerra civil, estabilidade da
regeneração, ultimatum, bancarrota, I
República, Estado Novo. Eduardo Lourenço [diz]: «As Nações, com a
responsabilidade histórica da gente portuguesa, não podem imobilizar-se estaticamente,
nem devem iludir-se infantilmente; têm de desentranhar sucessivamente da massa
das suas tradições e aspirações, um ideal coerente com a conjuntura histórica,
que exprima e defina o seu estar em concordância com o seu ser permanente.» a
pertinência da consideração não oferece dúvidas. Daí que falar do 25 de abril
de 1974 seja superara comemoração de quatro décadas, para atingirmos o cerne da
afirmação da liberdade, da democracia e da emancipação cívica.» (…)
(Guilherme de Oliveira Martins, in “Ao Encontro da História” Gradiva,
2018 – com supressões)
F. Sousa Tavares a discursar no Largo do Carmo no 25 de abril de 74 (daqui) |
Ainda custa acreditar como houve tantos anos de 24 de Abril :(
ResponderEliminarBeijinhos
E bem verdade, Pedro!
EliminarBom fim de semana.
Bom dia. Gostei muito do texto...
ResponderEliminarAdorei :))
Hoje:- Eis a fonte que nos alimenta alma
Bjos
Votos de uma boa Quinta-Feira
Obrigada, Larissa. Bom fim de semana.
Eliminargostei de ler.
ResponderEliminarpensamento claro e lúcido!
beijo
Também achei. Gosto muito do que este autor escreve. Leio-o normalmente no JL onde escreve regularmente.
EliminarBeijinho.
O Guilherme Oliveira Martins é uma personagem viva de um conjunto limitado, que tem erudiçào e honestidade que muito admiro. O trecho é uma lição de história conduzida ao longo dum fio contínuo, fluído como se fosse um rio a desaguar na festa-revolução de todo um povo: o 25 de abril. A referência a Fernão Lopes lança uma ponte que nos leva ao Largo do Carmo de 74 - a mesma Lisboa erigida pelas pedras do povo.
ResponderEliminarMuito bom, Graça, este post.