terça-feira, 13 de outubro de 2015

Histórias da minha rua (7)

O gatinho da vizinha morreu. Do alto minha imensa experiência de gatos, eu já previa isto. Uma agressiva insuficiência renal, mal a que muitos gatinhos não sobrevivem, mesmo depois de internamentos a soro e medicação injetável. Uma pessoa, porém, bem afeiçoada aos bichinhos, pensa sempre que com os nossos vai ser diferente. E ela pensava isso mesmo: que o gatinho vinha para casa e melhorava. Para grande tristeza da família, o gatinho veio para casa e acabou por se ficar em grande sofrimento. Já tive dois casos idênticos com gatos cá da casa e preferi que lhes fosse aplicada aquilo que para os humanos ainda não é permitido – e bem entendo porquê – a eutanásia.

A filha da vizinha – minha ex aluna mas já adulta – que mantém comigo uma relação algo estreita, telefonou-me tristinha, tristinha a dizer que o gato tinha morrido. Que sentia muito a sua falta. Que era um enorme vazio na casa por todo o lado. Que, que, que… «Bem sei o que isso é» – disse lhe eu – «já passei por isso algumas vezes e sempre me farto de chorar…» «Pois é» – responde-me ela «mas você [adoro quando me tratam por «você»!...] não sente tanto porque tem outros gatos…»

A imposição de nós próprios e das nossas coisas – neste caso do sofrimento – para cima dos outros é coisa que nós, portugueses, gostamos de fazer sem pararmos um momento para pensar que não somos diferentes dos outros, que não somos especiais.


E propus-lhe o seguinte dilema: «Parece-te que se uma mãe de cinco filhos perder um sofre menos do que uma mãe que só tem um e o perde?»


14 comentários:

  1. Também fico em picos quando me tratam por você....
    Mas a conversa , hoje , é sobre gatos., bicho que detestava até ter uma que só lhe falta falar e já leva uns 17 anos...
    Acontece , que desde que o cão de raça labrador morreu vai fazer um ano , aí pelo quintal , apareceram 2 gatos que a minha neta baptizou de caramelo e mico... São da rua , correm com os ratos e é uma maravinha. Pois não é que lhe fiz 2 caixas . forradas a enchimento de edredon , depois uma camada daquela prata que colocam nos acidentados e....nem digo mais Dormem no alpendre , no alto da lenha que está arrumada e parecem gostar. Não sou do PAN..cheguei tarde à conclusão que os animais sentem afectos Outro dia , a net , mostrava a fotografia de um macaco com ar apavorado a fugir de um incêndio , levando bem apertadinho um cachorro . Fiquei impressionada.
    M.A.A.

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    1. Que bom, M.A.A.!! Os gatinhos e os cães são animais absolutamente ternurentos e fazem tanta companhia!!

      Beijinhos e ronrons...

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  2. Boa questão para fazer a filha da vizinha perceber que, nos afetos, a dor da perda não se pode relativizar.

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  3. Gracinhamiga

    O meu primogénito Miguel completou 51 anos no dia 28 de Setembro; é economista e tem dois filhos: o João (prestes a fazer 22) e o Rodrigo (19)

    Há dez meses meses, mais coisa menos coisa, o João encontrou na rua um gatinho solitário que miava e miava e miava e etc. O bicho tinha quando muito duas semanas. O João levou-o para casa. Que não, não pode ser, nem pó!!! Mas o gato foi-se deixando ficar, já foi ao veterinário fazer uma consulta de rotina, tem uma excelente instalação, comida, água, brinquedos e etc,

    Um destes dias o Miguel contou-nos que quando chega a casa vindo do serviço anda a brincar às escondidas com o Sylvester. 51 anos, economista, pai de dois filhos - não queria acreditar.

    Mas, acreditei porque vi e comprovei. Ao que nós chegámos; e eu nem gosto de gatos, que me perdoes, Gracinhamiga

    Bjs da Raquel e js do Leãozão e... até domingo...

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    1. Que querido o vosso Miguel!!! Adorei saber...

      Beijinhos e até domingo!

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  4. O que é mais revoltante é que já ouvi alguém dizer a mesma coisa acerca de bebés.
    "Ainda é muito nova, pode ter outro".
    Dá vontade de dar um murro a quem diz isto!!
    Beijinhos

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    1. Pois dá, Pedro. E então tratando-se de crianças, nossos filhos, é de nem acreditar!!

      Beijinhos

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  5. Eu lembro que quando aos 13 anos fui trabalhar para a Seca do Bacalhau, havia muitas vezes uma discussão entre algumas das mulheres que trabalhavam na Seca, e eram quase 300, de diferentes idades, quase todas analfabetas, ou semi analfabetas, excepção feita para mim e meia dúzia de outras miúdas, que tendo feito a 4ª classe estavam lá a trabalhar. E a discussão, era, "Se tiveres de escolher entre a vida do teu homem ou de um dos teus filhos, quem escolherias?"
    Acredite, mais de 90% escolhiam o marido.Uma escolha tanto mais estranha, quanto muitas delas eram vítimas de violência doméstica.Perguntei a várias porquê. E a resposta foi sempre a mesma."Se morrer um filho, a dor vai ficar sempre comigo. Mas a vida segue em frente e talvez venha outro que ajude a mitigar essa dor.Mas se morrer o meu homem, a minha vida fica estragada, eu não conseguirei sozinha o suficiente para criar meus filhos que vão passar muita fome"
    Parece que isto não tem nada a ver com o post. Mas eu penso que sim. Estas mulheres não gostavam menos dos filhos do que as de hoje. Mas a vida de miséria em que viviam, dava-lhes uma outra maneira de encarar e viver o sofrimento. Um filho nunca ocupará o lugar do que se perde, e um animal, seja gato ou cão é o mesmo. Dependendo das circunstâncias umas pessoas aceitam com mais coragem a sua perda que outras. Mas essa aceitação, não tem nada a ver com a intensidade do seu sentimento.
    Um abraço

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    1. Obrigada, Elvira, pela partilha dessa realidade tão dura!! As circunstâncias é que fazem o ponto de vista...

      Beijinhos

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  6. Uma belíssima pergunta, Graça ! ... e que só tem uma resposta possível !

    Fica o meu Abraço, Graça ! ... e domingo aperto ! :)))
    .

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  7. A fidelidade amorosa cabe sempre (deveria caber...) em nossos corações. Compaixão!
    Abraço.

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