Não será vasto este pedaço de país, das serranias verdejantes de Sicó aos areias do Osso da Baleia, dos cimos pedregosos e áridos de Aire e Candeeiros à penedia escalavrada de Moel; não será vasto, até, quando medido desde os poços neveiros de Castanheira de Pêra até aos campos de vinhedos e pomares do Bombarral.
Vasto não será, por certo, que de bem maior território e mais largas imensidões podem ufanar-se outros que , a Norte e a Sul, no litoral rente ao mar ou nas bandas do interior quase raiano, compõem este recanto da Europa que dá por nome Portugal. Por escasso que seja, porém, o distrito de Leiria e sua região, faz da variedade a sua riqueza, a sua identidade, a sua magia.
Experimentemos olhá-lo de longe (ou de relance, tanto dá), como se possível fora diluir na contemplação as fronteiras e no olhar esbater as distâncias, pequenas sejam elas.
Detenhamos a vista nos recantos acolhedores por onde ribeiras serpenteiam, a norte, a sulcar de brilho escondido pinhais e bosques vários, os montes ali ao lado, enquanto patamares e socalcos multiplicam miradouros a cada passo. Balança-se-nos a visão entre casebres e solares acastelados, com memórias de anos por contar. Guardião da memória, ali está Santiago, da Guarda chamado, e sua réstia de ameias, vigilantes, ainda, sobre o longe, como quem mantém, séculos volvidos, uma missão a cumprir; ali estão os cumes de Castanheira de Pêra, a espreitar, pressurosos, sobre vales e regatos.
Guardiã da memória será, também, a sombra do Marquês, acolhida às estreitas ruas que, em Pombal, cidade de seu nome, seu termo e sua morada, ao aconchego do velho castelo se acolhem. E com elas (e com ele) farrapos de passado, que em cada aldeia nos espreita, da Redinha a Litém.
Ou essa outra sombra que povoa de façanhas e lendas o fio da lembrança, a de D. Fuas Roupinho, a pairar, ainda, entre as muralhas de Porto de Mós e o casario da velha vila, ou lá no alto do Sítio, a espreitar, o areal da Nazaré, a pata gravada para sempre na rocha da lenda. (...)
Olhemos o pinhal, sim, esse verde ondeado de vento até ao ventre do mar, enlaçado, quase nos areais de S. Pedro, das Paredes, da Polvoeira. De um e outra (de pinheiro e de areia) se construiu a magia incessante e polícroma do vidro por terras se Marinha Grande, semente de uma outra história, às vezes de suor, às vezes de lágrimas, às vezes de luta enfeitiçada, tão travessa quanto madrasta.
Sosseguemos os passos, se sossego há aí, cidade adentro: agora, nas ruas estreitas de Leiria, que rescendem, ainda a Eça, a Rodrigues Lobo, a Lopes Vieira, à beira da Sé ou do Castelo; logo depois, em Alcobaça, à sombra de paredes carcomidas de anos, que respiram amores impossíveis e cantos de morte e desejo, resguardados nas pedras tumulares de Pedro e Inês; a seguir, no remanso das Caldas da Rainha, alfobre de artistas do barro, estância de pintores, ateliê de arquitectos, fiel depositária de todos eles e seus sonhos e devaneios. (...)
Repousaremos, porventura, em Óbidos, ao abrigo das muralhas, a contemplar o sol quando declina e se desvanece, lento e suave, sobre a lagoa, na antevisão do mar que se adivinha, teimosos na Foz do Arelho. Óbidos, esse burgo guardião-mor destas terras; guardião do tempo, guardião da memória, guardião das águas, de terras, de rostos, de colinas. E de templos, que em cada esquina da vila muralhada nos surpreendem o passo afadigado da procura.
(Carlos A. André, in “Terra de Pinhal e de Mar”)
Hoje vi-te no programa de magia da SIC... foste apanhada no talho, melhére?! Ainda se fosse numa vernissage ou num evento cultural qualquer... mas num talho??!?.. eh eh
ResponderEliminarFoste bem apanhada!! Bem giro!!
Que belo texto este do Carlos André!...
ResponderEliminarE que bela é esta região da qual faz parte, em parte, este concelho onde vivo que, pertencendo ao distrito de Santarém tem muito a ver com o de Leiria!
Abraço chuvoso
É verdade, no talho!!! É a única coisa que sei fazer (agora) compras ... no talho...
ResponderEliminarRosinha, também achei este texto muito bem escrito (se bem que não goste muito do autor, pessoalmente)