domingo, 11 de dezembro de 2016

Tenho uma grande constipação...

Não é a primeira vez que me socorro do meu querido Álvaro de Campos para dizer que estou com uma enorme constipação… É que não há outro poema que a defina tão bem e seu estou farta de espirrar e de tossir «até à metafísica»…
 Há três dias e não vai lá nem com «verdade» nem com «aspirina»…


«Tenho uma grande constipação,
E toda a gente sabe como as grandes constipações
Alteram todo o sistema do universo,
Zangam-nos contra a vida,
E fazem espirrar até à metafísica.
Tenho o dia perdido cheio de me assoar.
Dói-me a cabeça indistintamente.
Triste condição para um poeta menor!
Hoje sou verdadeiramente um poeta menor.
O que fui outrora foi um desejo; partiu-se.

Adeus para sempre, rainha das fadas!
As tuas asas eram de sol, e eu cá vou andando.
Não estarei bem se não me deitar na cama.
Nunca estive bem senão deitando-me no universo.

Excusez un peu... Que grande constipação física!
Preciso de verdade e da aspirina.»

14-3-1931, Álvaro de Campos


Hoje foi o meu marido que ficou de igual modo com uma grande constipação, mas o poema para a sua constipação é mais este…


"Pachos na testa, terço na mão
Uma botija, chá de limão
Zaragatoas, vinho com mel
Três aspirinas, creme na pele
Grito de medo, chamo a mulher
Ai Lurdes, Lurdes, que vou morrer
Mede-me a febre, olha-me a goela
Cala os miúdos, fecha a janela
Não quero canja, nem a salada
Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada
Se tu sonhasses, como me sinto
Já vejo a morte, nunca te minto
Já vejo o inferno, chamas diabos
Anjos estranhos, cornos e rabos
Vejo os demónios, nas suas danças
Tigres sem listras, bodes de tranças
Choros de coruja, risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes, que foi aquilo!
Não é a chuva, no meu postigo
Ai Lurdes, Lurdes, fica comigo
Não é o vento, a cirandar
Nem são as vozes, que vêm do mar
Não é o pingo de uma torneira
Põe-me a santinha, à cabeceira
Compõe-me a colcha, fala ao prior
Pousa o Jesus, no cobertor
Chama o doutor, passa a chamada
Ai Lurdes, Lurdes, nem dás por nada
Faz-me tisanas, e pão-de-ló
Não te levantes, que fico só
Aqui sozinho a apodrecer
Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer."

António Lobo Antunes

in Letrinhas de Cantigas (canções) 2002



12 comentários:

  1. ADORO os poemas, mas o do António Lobo Antunes é o mais divertido.

    O meu marido nunca foi de queixumes. Eu já sou mais.

    Melhoras rápidas são os meus festejos.

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  2. As melhoras aos dois! E quem trata de quem?
    : )

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  3. O poema do ALA sobre as pieguices dos homens constipados já a conheço há imenso tempo, mas sempre me divirto ao ler.Ainda por cima: "Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada". eheheh
    Está formidável.:))
    Então, como é vos deixais constipar logo os dois?
    Chá de limão e mel é a solução.

    As melhoras e uma beijoca. :)

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  4. Excelente! :)
    Rápidas melhoras, Graça!

    Beijos

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  5. Andei assim duas semanas.
    Não vou mentir, foi uma seca!
    Beijinhos, rápidas melhoras, boa semana

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  6. As melhoras para os dois. E muita paciência para a Graça, que homem doente é fogo.
    Bebam chá de gengibre bem quente à noite.
    Um abraço

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  7. E eu idem. Apanhei-a com a Minorca e vou na 2° semana. Para azar da minha carpintaria, que ainda não está consolidada; com espirros e tosse a casa abana.
    Os poemas já conhecia mas vieram mesmo a propósito. O que parece a primeira vez são as dores de garganta e o nariz entupido. Esperemos que não seja a última.
    As melhoras desse lado. Vêm aí as Festas! Assim, o perú fica em águas de bacalhau?...
    Boa semana.

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  8. Constipação. Terrível!!! As melhoras dos dois.
    Gostei do Álvaro de campos e adorei o Lobo Antunes.
    Uma boa semana.
    Beijos.

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  9. Mesmo gripada, a Graça tem um sentido de humor fantástico!
    Os poemas, perfeitos, para ilustrar uma velha realidade.

    Melhoras

    Lídia

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  10. Graça, Vendo o lado menos negativo da coisa estando os dois adoentados ficam já despachados e melhorarão ao mesmo tempo!
    Ambos os poemas são fantásticos.
    Bjs e melhoras rápidas.

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  11. Obrigada a todos pelas vossas palavras tão queridas!!

    Ainda bem que gostaram de (re)ler os poemas da minha escolha...

    Beijinhos asséticos ...

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