quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Ericeira



«Fica a sete léguas de Lisboa e tem cêrca de 700 fogos.

Se exceptuarmos Olhão, no Algarve, é esta a terra mais asseada de Portugal.

As ruas estão escrupulosamente varridas como as de um jardim. As mais pequenas casas têm as vidraças nìtidamente lavadas e as paredes exteriores caiadas de branco.

Quási ao meio da vila, sobranceira ao mar, fica num alto a capela de Santo António, circundada de bancos, ponto de reünião dos banhistas à hora do pôr do sol e à do despontar da lua.

(Capela de Santo António)
Para o norte da capela há uma praia de banho, para o sul há outra. A cada uma destas praias corresponde um bairro. a praia do sul, perfeitamente abrigada por uma cortina de rocha que a rodeia como um biombo, é a mais agradável, e o seu respectivo bairro o mais importante. Para o lado do norte ficam as pequenas casas quási todas de um só pavimento, abarracadas.

A vida é extremamente cómoda na Ericeira. As casas alugam-se com mobília, e pode-se ter igualmente de aluguer a louça e a roupa das camas. Uma família de quatro pessoas aloja-se còmodamente por seis libras por mês. O preço do hotel é de 800 réis por pessoa com cozinha sofrível e serviço regular. Há um clube e um pequeno teatro. (…)

O aspecto só deferia do que é em Agosto ou em Setembro pelo número de pessoas. De resto, o mesmo asseio, as mesmas lojas abertas; ao fim da tarde algumas famílias passeavam na praça do Jôgo da Bola. À noite acenderam-se luzes em quási tôdas as casas. Nos pavimentos do rés-do-chão via-se, através dos vidros, os cortinados das janelas, a gaiola envernizada ao centro das duas cortinas; um candeeiro de sala, de globo fôsco ou de abat-jour, sôbre a mesa do centro  confortàvelmente coberta com um tapête; o cabide, o espelho, o vaso com flores, todos os pequenos característicos da vida serena, bem administrada, com orçamento regular, com hábitos adquiridos, com costumes de família. Devemos especificar que em duas casas chegámos a avistar alguns livros: caso extraordinário e raríssimo em Portugal, onde nas pequenas casas de província o livro é um objecto de luxo que ninguém se permite (…)»

(in “As Praias de Portugal: Guia do Banhista e do Viajante” de Ramalho Ortigão, Livraria Clássica Editora, Lisboa, 1943 (1ª edição: 1876)

Foi quase neste ambiente que, noventa anos depois de esta descrição ter sido tão formosamente feita, cheguei com os meus pais, o meu primo-irmão e uma jovem amiguinha para passarmos as nossas férias de Verão a banhos. Tinha acabado de saber que tinha passado no Exame de Aptidão à Faculdade de Letras tendo sido aceite para cursar Germânicas (o que não era fácil à época) e ia feliz e resplandecente no meu fato de banho branco, arrendado à frente, a roçar o estilo bikini que, como já aqui disse, o meu pai não me deixava usar…

Ainda fomos ao areal ao fim da tarde e aí mudou para sempre a minha vida: estava lá um tímido belo Apolo que me arrebatou. 


Faz hoje 48 anos.



15 comentários:

  1. Gosto imenso da Ericeira, embora não seja a minha praia de eleição.
    É uma terra muito bonita e bem asseada como dizes.

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  2. Muitos parabéns!
    Como já escrevi aqui, a Ericeira é um local de visita obrigatória,uma vez por mês. Também tenho algumas boas recordações de tempos lá passados, mas foram amores que as ondas levaram...

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  3. Parabéns...que venham muitos mais!
    Só fui a Ericeira duas vezes com o meu "folha seca".

    Beijinho e uma flor

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  4. Ericeira
    Só nevoeiro e tremideira
    a manhã inteira

    Um abraço ao seu Apolo
    a si, um beijo
    que lhe deixo

    Parabéns ao dois, pois!

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  5. Estive lá muito recentemente!
    Linda!

    Abraço

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  6. Boa prosa, boas imagens e belas recordações.
    Parabéns aos namorados.

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  7. ~
    ~ ~ Que sítio interessante para encontrar um Apolo!

    ~ ~ Para sempre inesquecível!

    ~ ~ Parabéns pela efeméride.

    ~ ~ Continuação de muitas felicidades.

    ~ ~ ~ ~ Abraço muito amigo. ~ ~ ~ ~

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  8. Que venham outros 48.
    Pelo menos.
    Beijinhos

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  9. Há tanta praia por aí
    Esta é para o seu Apolo e para si.
    :)

    Parabéns!

    https://www.youtube.com/watch?v=HYiNOaEs330

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  10. Bonito texto de Ramalho Ortigão, só comparável a outro de Raul Proença.
    Quanto aquelas férias de Verão de 1966, que maravilha:
    Saber que tinha tido sucesso no Exame de Aptidão; usar o célebre fato-banho branco; ter presente o belo Apolo, é a cereja no topo do bolo. Que mais poderia desejar? Isto é a felicidade, com o cenário idílico que é a praia da Ericeira!
    Cumprimentos.

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  11. Também adoro a Ericeira.
    É como diz.
    Para si passou a ser uma terra
    mágica, não é?
    Há acontecimentos que nos ligam
    aos sítios.
    Bj.
    Irene Alves

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  12. os "encantos" da Ericeira...

    também eu já fui ali muito feliz... rs

    beijo

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  13. Curiosa a referência ao asseio de Olhão.
    Gostei das memórias, sobretudo da parte mais romântica.:)

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  14. Uma curiosa descrição e a celebração de uma linda data!
    Seja feliz! (Com o tal Apolo)

    bjs

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