quinta-feira, 28 de julho de 2016

O ranking das alturas

«Deixava a camisa numa guarita abandonada, e atirava-se em cuecas para a água das docas.
Todos reparavam que tinha estilo a nadar. Aprendera na Colónia Infantil d’O Século. Colónia Balnear.
Ia-se pôr e tirar o adesivo da tuberculina. Cortava-se o cabelo rente e, à partida de Alcântara-Mar, recebia-se um chapéu de palha. Aumentava-se de peso. Voltava-se com a última areia nas bainhas dos calções.
Verão-a-Verão, tinham-lhe cabido aquelas semanas. Repletas, desarticuladas dos acanhamentos do resto do ano. Era a mãe quem o inscrevia.

(Filomena Marona Beja “A Sopa”, Âmbar, Porto, 2004, p. 48)


(Colónia Balnear O Século, no Estoril)


(Crianças de Nisa e de Montalvão na Colónia Balnear O Século, 1959 - 1960)
(daqui)

Tanto espanto pelo facto de os portugueses estarem posicionados no top 10 dos que mais cresceram nos últimos cem anos!

Diz a notícia que «entre 1914 e 2014, num século e quatro gerações, mulheres e homens portugueses esticaram em altura Eles cresceram 13,9 centímetros: de 159 para 172,9 – é esta a altura média dos portugueses com 30 anos em 2014.» E «elas chegaram aos 163 centímetros, mais 12,5 centímetros, quando, em 1914, a média rondava 1,50 metros.»


Tivéssemos nós cuidados básicos de saúde e a possibilidade de nos alimentarmos minimamente bem e em quantidade;

tivéssemos nós condições de vida paralelas às dos países europeus que conseguiram livrar-se da alçada das amarras da Igreja Católica com o seu braço armado da Inquisição e do clericalismo salazarista;

tivessem as crianças a possibilidade de irem à escola em vez de, aos seis/sete anos irem trabalhar para os campos ou servir – servir, de servidão – para as casas dos "senhores";

tivéssemos nós uma rede – mínima que fosse – de hospitais e de escolas;

tivéssemos nós sido tratados como cidadãos, pessoas, e não como animais de carga vergados sob o jugo do dinheiro e do poder ditatorial;

e decerto não estaríamos agora tão “orgulhosos” da nossa (pobre) posição no ranking das alturas…

(Cá por mim, estou muito bem posicionada: meço 1,64 desde os tempos do Liceu… )


10 comentários:

  1. Podemos não ser os maiores, em altura, mas somos os (quase)melhores em qualquer competição desportiva!:))
    Isso da altura também tem muito a ver com a genética, e a má nutrição já vem de longe.
    Acho que há miúdos a temer crescer demais, principalmente quando rondam os dezassete anos, já medem 1 metro e 75 cm e pretendem inscrever-se na aviação, onde não podem exceder 1,90 de altura.
    Somos um mundo de contrastes, sem dúvida.

    Também cresci até aos catorze , quinze anos e fiquei pela altura de então. Acho que sou da tua altura, Graça, embora no meu BI tenha menos 4 cm. eheheh
    Já estive ao pé de ti e tu não me ultrapassavas em altura...lol

    Beijinhos, sem ser em bicos de pés!

    ResponderEliminar
  2. Com o meu 1,60m tinha uma altura mediana e agora... estou a ficar baixinha! :)

    Beijocas

    ResponderEliminar
  3. Essas estatísticas esquecem o mais importante - o porquê.
    E é tão fácil de perceber neste caso.
    Beijinhos, bfds

    ResponderEliminar
  4. Como dizia o outro: Não é com palmos que se medem as mulheres e os homens...

    ResponderEliminar
  5. Graça, não sei se tens conhecimento que a fundação "O Século" tem uma unidade de turismo social, cujas receitas servem para suportar as outras valências.
    Já lá fiquei por dois períodos diferentes e gostei muito.

    Beijo e bom fim-de-semana.

    ResponderEliminar
  6. Afinal, parece que também somos medidos aos palmos...

    Um beijo

    Lídia

    ResponderEliminar
  7. Assino o que aqui tão bem disseste, GRaça

    Beijinhos

    ResponderEliminar
  8. Estava a ler o texto e a pensar como era este país....hoje é tudo tão diferente e tão melhor apesar de todas as coisas horríveis que acabaste de enumerar.
    Bjs

    ResponderEliminar
  9. O teu texto está impecável, Graça.
    Para cúmulo, o anterior governo - para agradar à Merkel - retirou parte do apoio aos desempregados e há reformas tão miseráveis que obrigam os utentes a poupar em remédios...

    A verdade é que há por ai muitas mentalidades mais baixas do que elevadas, tanto que acreditaram nas patranhas eleitorais do rei dos Pinóquios.
    ~~~Beijinhos ~~~

    ResponderEliminar
  10. Grata pelos vossos comentários, amigos/as.

    Beijinhos

    ResponderEliminar