quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

«Este medo que nos consome»


 
 (retirado do blogue rua direita)


 Como vai já sendo hábito, não consigo evitar transcrever para aqui algumas das excelentes crónicas que o jornalista-escritor Baptista-Bastos escreve semanalmente no DN. E a de hoje está excelente de mais - para nosso mal, diga-se. É, infelizmente, o retrato fiel deste povo e do governo que este povo escolheu/foi levado a escolher.

Também o filósofo José Gil versou o tema deste nosso medo ancestral no seu livrinho "O Medo de Existir".

«Entramos no novo ano sob o peso de ameaças e de abominações terríveis. O medo institucionalizou-se através do discurso oficial. É um sentimento que nos acompanha há, pelo menos, quatro séculos, com a omnipresença da Inquisição, que a República atiçou e que o salazarismo subtilizou em métodos e processos. Consoante as ocasiões, a política tem utilizado os vários níveis do medo não só como intimidação mas, sobretudo, como ideologia. Há meses que nos dizem, ministros e acólitos, "comentadores" estipendiados e adjacências, dos pavorosos sacrifícios, das misérias atrozes com os quais vamos ser açoitados inclementemente. É uma estratégia indigna, mas eficaz. Não há ninguém que fale em 2012 sem o reduzir a uma qualquer palavra infamante. Mas, depois, ah!, mas depois o Governo, salvador e piedoso, admirável e sábio resolverá a maldição e tudo será leite e mel.

Quiseram fazer-nos cair na pior das armadilhas: a que se fundamenta na descrença, na inevitabilidade, no fatalismo e num insidioso complexo de inferioridade. Pouco valemos e o "outro" é sempre superior. As comparações com Espanha não deixam escapar nenhuma ocasião para estabelecer um paralelismo humilhante. A desmoralização passou a ser um ajustamento político, para fustigar os erros do Governo anterior. Com uma retórica deste género, têm-nos amedrontado, na tentativa de obter, posteriormente, os chamados "resultados plausíveis". Além de indigna, a estratégia é imoral, o que parece não incomodar muito o Executivo de Passos Coelho - nem o próprio. 
Que horizonte? Nenhum. O projecto do Governo é, meramente, de exercício do poder pelo poder, e não perspectiva qualquer solução de melhoria social. Como não sabem o que fazer, crivam-nos de impostos e cercam-nos de privações. A nação esvazia-se de sentido e o País vê os seus melhores filhos proceder a uma debandada. No ano passado, 120 mil portugueses foram-se embora. Nos últimos meses, pelo menos catorze famílias entram, diariamente, em insolvência. O desemprego é transversal a toda a sociedade e a todas as faixas etárias. Os nossos velhos estão a morrer no opróbrio e na vileza, sem aparecerem respostas que autorizem a esperança na dignidade.

"O ano que ninguém quer", diz a RTP num estribilho no qual a espinoteante tolice dissimula a verdade dos factos. Não é o ano que condiciona as necessidades mais fortes; é a imbecilidade e a inépcia de quem cedeu a outrem a capacidade de decidir e o poder de alterar. Leio, numa gazeta semanal, que a troika quer reduzir o poder dos sindicatos. A troika quer? Que Governo é este, que permite a sua própria exautoração e deixa de representar aqueles que o elegeram em favor de um pequeno grupo de burocratas? 
Um Governo assim, negligente e servil, cujo objectivo declarado é o de nos desmoralizar e empobrecer, serve para quê?»
 Baptista-Bastos, in DN , 4/Jan/2012 


13 comentários:

  1. Para nada!!! E nós comemos!!!

    Continuando...Onde está a culpa?

    :(

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  2. Cara Carol
    também não perco uma das crónicas do B.B.
    São duma grande lucidez e infelizmente faz regularmente o "retrato fiel deste povo..." Como gostava que não tivesse razão.
    Abraço
    Rodrigo

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  3. Se quem manda é a troika, pois, este governo só lá está para encher os bolsos de gente inútil, incapaz e servil! Cambada...

    Beijocas!

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  4. Este Governo até pode vir a ter sucesso junto de quem o incumbiu desta tarefa medonha de "empobrecer" o seu próprio povo mas se pensa que vai levar a tarefa até ao fim em paz social está redondamente enganado.
    Lá para meados do ano alguma coisa irá acontecer e poderá não ser nada pacífico.

    E depois não chamem cobarde a este pobre povo.

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  5. Eu acredito em Portugal e nos portugueses, nestes que agora nos (des)governam não.
    "Água mole em pedra dura..."

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  6. e eu quero tanto fugir desse "medo", Carol...

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  7. Tento não ver os noticiários, já me basta ver o medo na cara das pessoas em frente á tv...
    Bjs

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  8. Estimada Amiga Carol.
    Embora viva longe de todos esses problemas que afectam a sociedade portuguesa, fico admirado pela calma e paciência dos portugueses.
    Os políticos, todos eles, depois do 25 de Abril até aos dias de hoje são uma cambada de aldrabões que vão enriquecendo à custa do povo.
    Tem inumidade como tal podem fazer o quiserem que a lei os protege, temos imensos exemplos, deste o Isaltino até ao Portas.
    Não é com greves que o país poderá mudar para melhor, antes pelo conträrio, deviam sim, os portugueses correr com todas essas abutres de S. Bento.
    Se no tempo de Salazar era mau, para alguns, eu vivi sob o seu regime e nada tenho a dizer contra, agora estamos muitos piores.
    E assim vai o país....
    Abraço amigo

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  9. Mesmo que andasse com cabeça e disposição para actualizar o meu blogue não tenho por hábito fazer abordagens destas por uma questão de "linha editorial" do contexto especial em que nasceu mas faço-o no FB.
    Hoje seleccionei do DN uma excelente crónica do Viriato Seromenho-Marques que é de ler com toda a atenção!
    Também gosto muito do BB!

    Abraço

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  10. Carol querida
    As noticias são deprimentes, mas não consigo deixar de as ouvir, não faz parte de mim enterrar a cabeça na areia como a cegonha.

    Beijinho e uma flor

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  11. O maior problema é ter medo do próprio medo:)!
    Abraço

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  12. Também li a crónica do Viriato Seromenho Marques que achei excelente e a de hoje também!

    Também não consigo deixar de ler e de ouvir as notícias, mas uma pessoa fica doente! E as pessoas andam mesmo com medo: medo do que vai ser a vida no futuro próximo; medo de perder o emprego; medo de perder tudo. Não está fácil! Mas daí a ser pior que no tempo do Salazar, não posso aceitar, amigo António! Agora estranho é este povo não se levantar. Por medo, claro!

    Vamos ter coragem e não perder a esperança!

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  13. Só não tem medo de perder o emprego quem já o perdeu! :-((
    Hoje ainda não tive tempo de ler grande coisa...
    Só à noite se vier minimamente sossegada!

    Abraço

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