Somos seis. Todas muito diferentes mas, ao fim e ao cabo, bastante iguais. Somos um grupo há mais de vinte anos. Não se sabe como e porque se organizam determinados grupos, mas nós formamos um grupo há mais de vinte anos. Coeso. Quando nos juntamos, falamos de tudo – até dizemos que falamos todas ao mesmo tempo e é verdade – falamos das nossas tristezas, das nossas alegrias, das nossas fúrias, do país, das férias, da política, das brincadeiras, dos filhos e seus desvarios – ou avarias – dos maridos: só das avarias… E estes apenas têm autorização para se nos juntarem uma vez por ano: no nosso jantar de Natal.
Já nos aconteceu de tudo: casamentos, descasamentos, nascimentos, aposentações, doenças graves, desaparecimentos bem tristes. Mas hoje aconteceu que partiu um dos maridos. O mais jovem de todos eles. Tinha 52 anos apenas.
A experiência de mortes muito próximas visitou-me cedo na vida e por muitas vezes: os meus ascendentes familiares próximos desapareceram todos já, os mais próximos há muitos anos mesmo. Mas, por muito que digamos que a morte é um momento da vida, não conseguimos – eu, pelo menos, não consigo – deixar de nos surpreender e de nos arrepiar com a sua presença dolorosa.
A propósito, lembrei-me de um texto belíssimo do jornalista-poeta-escritor Manuel António Pina com o título Lembrança dos amigos mortos que aborda de forma muito própria e muito de acordo com o que eu sinto o tema da morte, e de que transcrevo aqui parte.
«Presente desde o início dentro de nós e à nossa volta, da morte, como de um vizinho ausente, durante muito tempo só conhecemos o nome. A nossa própria e inevitável morte é uma convenção que aceitamos mais por conformismo ou imperativo racional do que por convicção profunda. E porque, do mesmo modo que a desnecessidade e absurdo da existência, a ideia do desaparecimento do próprio ser é intolerável, se não inconcebível, o medo desenvolveu em todas as culturas a neurose religiosa de uma vida verdadeira, ou real, onde não tem lugar a morte.
Um dia, porém, a morte surge diante de nós com o rosto material e próximo de alguém que amamos. E descobrimos subitamente que ela sempre ali estivera, ao nosso lado, dando-nos a mão, falando-nos ao ouvido com a nossa própria voz.
Então algo vulnerável se desmorona, o mundo que havíamos construído para nós, de um momento para o outro, inabitável e desconhecido. Nomes, coisas, acontecimentos (o próprio acontecimento da morte), desvanecem-se e sentimo-nos partir de nós mesmos para fora de nós como se sonhássemos. […]»
Há anos encontrei um texto que me ajudou um bocadinho. É de um Sermão feito pelo Canon Henry Scott Holland no Domingo de Ramos de 1910
ResponderEliminarO Quarto Ao Lado
A morte não é nada ... Eu apenas fui para o quarto ao lado. Eu sou eu, e tu és tu. O que quer que tenhamos sido um para o outro continuamos a ser. Chama me pelo meu nome familiar, fala comigo da forma fácil que sempre usaste. Não uses um tom diferente, não faças um ar forçado de solenidade ou mágoa. Ri como sempre rimos das pequenas piadas que nos divertiam aos dois. Reza, sorri, pensa em mim – deixa o meu nome continuar a ser a palavra familiar que sempre foi, deixa-o ser falado sem efeitos, sem a marca de uma sombra. A vida significa o que sempre significou. É a mesma que sempre foi, não houve nenhuma quebra de continuidade. Porque deveria ficar fora da tua mente só porque estou fora da tua vista? Eu estou à tua espera, num intervalo, algures muito próximo, logo a seguir à esquina. Está tudo bem.
Passagens que todos faremos! É na oração e fé individual que encontramos a força necessária para esse momento! Paz e meu abraço, Célia,
ResponderEliminarQuerida, sinto muito. As perdasmexem com nosso íntimo. Existe um espaço no coração para essas dores, sempre tão dolorosas. É importante que se viva o luto para superá-lo. boa sorte e meus pêsames.
ResponderEliminarPois é querida amiga, nestas alturas sentimos como somos pequeninos e insignificantes, a vida não nos pertence... quando chega a hora dos familiares e amigos parec que doi mais aquela frase " a vida continua"...
ResponderEliminarBjs
Leio-te com as lágrimas a correr pela cara abaixo!
ResponderEliminarTambém gostaria de falar neste amigo tão cheio de vida, tão brincalhão, aquele que de entre nós ainda trabalhava mas tenho dificuldades!
A morte escolheu de novo Dezembro para nos/me assombrar!
Também li a crónica que referes...
Quanto à dor e luto da nossa amiga, estaremos com ela para lhe enxugarmos as lágrimas e também para a fazer sorrir!
A vida é assim mesmo...
Abraço e até logo
Carol,
ResponderEliminarsinto muito a vossa perda, que um dia nos toca a todos.
Eu ia recomendar-lhe o Sermão feito pelo Canon Henry Scott Holland, no Domingo de Ramos de 1910, porque me ajudou num momento triste da minha vida, mas a amiga Redonda já o fez.
Beijinho e boa semana, Carol!
Lamento muito.
ResponderEliminarLamento a partida de seu amigo.Achei sua postagem uma homenagem muito bonita. E o texto do escritor Manuel Pina uma abordagem tocante.
ResponderEliminarBjs
Lamento carol ! :((... o caso é que nesta idade (embora ele ainda bem novo) estas situações vão sendo mais habituais, mas sempre chocantes, especialmente quando se trata de famila e amigos !
ResponderEliminarNão há forma de impedir; quando muito, de atrazar ...
Bj
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ResponderEliminar"Como se sonhássemos"...
ResponderEliminarCostumo dizer que a morte "acampa" no meu jardim... Quase me habituei à sua presença silenciosa e tão certa.
Um beijo
Carol
ResponderEliminarTal como tu já perdi pessoas que muito amava, a maldita doença não os poupou, partiram muito jovens o meu pai, minha irmã, meu marido e meu netinho com apenas 6 mesinhos este com uma bactéria que apanhou no hospital.
deixo-te o meu abraço muito apertado.
Beijnho
Muito obrigada pelas vossas palavras boas. Vou fazer os possíveis para transmitir essa vossa solidariedade à minha querida amiga que ficou mais só. Tão só!
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