terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Feliz? Eu?...


 


No sábado de manhã, ao entrar na papelaria onde vamos diariamente comprar o jornal, ia, de igual modo, a entrar um jovem senhor, na faixa dos quarenta e…, que me dirige um alegre e aberto sorriso e diz qualquer coisa como “My name’s Fred!” lembra-se? Por acaso, reconheci, de imediato aquele sorriso bem-disposto e aqueles olhinhos escuros e brilhantes e cabelo bem preto num corpito de miúdo de dez ou onze anos, e exclamei: “Claro que me lembro, Fred! Como está?”

Um aluno de há muitos anos, daquele tempo em que nós, professores de Inglês, logo no primeiro ano de ensino da língua falávamos só em inglês e até dávamos nomes bem ingleses aos alunos e nós próprios também usávamos um (o meu era Carol, já aqui o disse). Os miúdos achavam engraçadíssimo e conseguia-se, com esse pequeno artifício, criar um clima de aula de grande cumplicidade. 

E vai daí o Fred (não faço a mais pálida ideia de qual seja o seu verdadeiro nome!) pergunta-me: “É feliz?” “Sim”, digo eu, sorrindo muito mas um pouco atrapalhada com a pergunta, “sou: tenho duas filhas boas, três belos netos… “ “Três netos, com essa cara? Ainda está a dar aulas?” “Com esta cara? Já tenho 63 anos…” “Ah! Mas não parece!... Tão bem disposta… Sabe, tive sorte por ter sido minha professora. Eu não era bom aluno, lembra-se?” (por acaso, não me lembro nada, mas tento negar a sua afirmação) “Era mau aluno, era, mas você conseguiu fazer com que tivesse gosto pelo Inglês e depois estudei e agora até consigo falar bastante bem!”  Etc. etc. etc. … “E continue assim bem-disposta e feliz”… 

Feliz fiquei com esta explosão de simpatia do Fred, de olhinho brilhante! Que bom ser reconhecida e lembrada desta maneira ao fim de tantos anos! E, depois, a contar ao meu marido, até acabei por concluir: eu nunca fui uma professora excecional, mas parece-me que o que fez com que muitos dos meus antigos alunos tenham para comigo estas expressões de bondade e simpatia foi o facto de sempre ter desempenhado a minha função diária de professora com muito entusiasmo e com muita alegria, sem esquecer, naturalmente, o enorme trabalho diário que ficava por trás dessa atitude.

(Não se pense com isto que me envaideço com estas manifestações. Se fico feliz? Ah, isso sim! Mas sempre me lembro daquele outro aluno de nome Arlindo, olhinho também vivaço sobre um corpinho de onze/doze anos, que, no segundo ano seguido em que lhe apareci na frente para ser sua professora, sentadinho nas primeiras carteiras, me franze o sobrolho. E, atenta que sempre me obriguei a estar às emoções dos alunos, perguntei se não ficou contente de me rever. E ele, que não! “Não gostas de mim, é?” “Não!” E, esperto que era, logo segundos depois, emenda algo envergonhado: “Eu não gosto de Inglês…” 
É que o elogio, como a fama, são efémeros…)


13 comentários:

  1. "São efémeros"... mas às vezes sabem tão bem.
    :)

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  2. Gostei muito deste texto. A minha irmã mais nova é professora de inglês e acho que como professora também é assim.
    um beijinho
    Gábi

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  3. Já no Francês, apesar de falarmos sempre nesta língua, não lhes mudávamos o nome! :-))
    Acontece que num ano tive um miúdo que só sorria na minha aula, segundo constatação dos colegas dele e dos meus.
    Eu chamava-lhe Olivier e todos os outros professores lhe chamavam Oliveiros...foi assim, desta forma desastrada, que lhe mudaram o nome num Consulado de 5ª categoria!
    Pois dou-me também por feliz por fazer sorrir o Olivier! :-))
    Se eu lhe perguntava em Francês como é que se chamava, ele tinha que responder em Francês, obviamente!:-))
    Are you happy, Carol?
    Eu tenho dias!

    Abraço

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  4. Estimada Amiga Carol,
    Adorei sua bela história.
    Comigo acontece muitas vezes, pessoas que me cumprimentam e que nem me lembro deles, depois sim, quando eles me disse terem sido meus alunos.
    Todos eles tem a minha idade.
    Mas é sempre bom ver o carinho e amizade dessas pessoas e me sinto feliz.
    Abraço amigo

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  5. Há profesores que nos marcam para a vida e eu felizmente tive alguns ( Houve um que me marcou negativamente, mas isso agora não interessa). Ficava sempre contente quando os encontrava e sentia que eles deviam ter uma reacção igual à da Carol.
    São estes bons momentos que tornam a vida mais macia...

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  6. Esqueça o Arlindo...
    Para tamanhas alegrias
    que lhe aconteça um Fred todos os dias.

    Boa?

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  7. Olá, Carol! São tais manifestações que nos fazem valorizar mais ainda a vocação por nós abraçada! Os "Freds" assim como os "Arlindos" são termômetros em nosso dia-a-dia e, prestarmos atenção a eles e suas reações é a nossa atualização diária como mestres que somos!
    Abraço, Célia.

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  8. Deve ser reconfortante ser-se reconhecida assim por os antigos alunos!!!
    E recordar é viver minha querida.
    Beijinho Carol bom feriado

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  9. Carolamiga

    Faz bem ao nosso ego que alguém nos reconheça e não diga muito mal de nós; ou, pelo menos, só um pouquinho.

    E continuo a gostar da maioria das minhas professoras e dos meus professores, menos das/dos da maldita matemática & correlativos.

    É por isso que hoje Ai quéne çepique ingueliche véri uél, du iu anderestende?

    Qjs

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  10. Era duma professora assim que eu precisava! A que tenho, tem uma fonética que fica longe da realidade, e apenas fala em inglês: gramática sim que dá, escrever, escreveremos...
    Um grande abraço, querida amiga

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  11. Uma bela estória ! :)) Fez-me lembrar outra idêntica passada comigo. Não fui professor mas durante o serviço militar, como alferes, era responsável pela instrução de recrutas.
    Certo dia, passados uns 20 anos, entrei num café em Felgueiras para tomar um. Quando chamei o empregado (que me parecia nunca ter visto mais gordo), para pagar, disse-me ele : "meu alferes, tenho muito prazer em lho oferecer; o meu alferes era um "gaijo porreiro", a "melhor coisa" que encontrei em todo o tempo que passei na tropa" !
    Claro que fiquei muito orgulhoso e feliz com esta apreciação e reencontro, que deu origem a uma longa conversa. :)))
    Ainda fiquei a pensar: se não tivesse sido um "gaijo porreiro", mas um "sacana", que os havia, o que me poderia ter deitado no café este homem, sem me dizer nada ?!... rrssss
    .

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  12. carol

    Como sei o quão bom é isso! Ainda hoje encontrei duas antigas alunas. Souberam-nos bem os beijos e os abraços que trocámos e a cumplicidade que se instalou naqueles cerca de 15 minutos em que recordámos.

    Bom feriado!

    Beijo

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  13. Obrigada, meus queridos amigos. Ainda bem que consegui que se lembrassem de todas essas histórias de antigos alunos ou de antigos professores. Claro que sabe muito bem sermos reconhecidos por "gaijos porreiros" como ali o nosso alferes Rui da Bica...

    Caro Rogério, obrigada pelo desejo de Freds diários; mas o Arlindo também era bom rapaz - só foi sincero....

    Caro amigo Duarte, que pena estarmos tão longe, senão podia dar-lhe umas liçõezinhas, se valessem a pena...

    Henriqamigo, como eu o compreendo com as matemáticas, físicas e companhia... match izier sepique inguelich.....

    Beijinhos a todos.

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