domingo, 10 de junho de 2012

Cratices


Ando há semanas – desde que o ministro (C)rato começou a mandar cá para fora diplomas, propostas de diplomas e bocas foleiras sem que mesmo assim os professores se levantem e venham para a rua como quando fizeram quando a ministra do governo do “Anticristo” se propôs a avaliá-los pelo processo dos restantes funcionários das escolas – a rememorar na minha cabeça um texto que expusesse tudo aquilo que penso sobre as falinhas mansas que muito agradam à população em geral e até aos professores, com que o referido ministro apresenta o seu modelo de educação elitista e seletivo.


 Mas eis que apareceu um texto com tudo o que eu pensava escrever e, naturalmente, muito mais bem escrito e muito mais completo que aquele que eu almejava elaborar! Então porque não transcrevê-lo para aqui? Tem por título «O velho eduquês» e tem a assinatura do Professor José Manuel Pureza.

«(…)Do "independente" Nuno Crato deu-se - e continua a dar- -se - a imagem de alguém que vem pôr ordem na bagunçada (coisa com tradição nefasta em Portugal...). Crato não é diferente de qualquer outro ministro deste Governo: todos acham que os setores que administram eram pântanos de irresponsabilidade e de farra antes de eles chegarem ao poder; e juram que, com eles, vai "voltar" a disciplina, a seriedade e a exigência. Crato desempenha esse papel com mestria, justiça lhe seja. Debita para o senso comum que a escola foi tomada de assalto por aventuras pedagógicas e deixou de ensinar. Que o facilitismo cultivado por esse "eduquês" está a produzir gente ignorante e a transigir com a incompetência. E, numa cruzada contra esse apodrecimento - algo sempre sedutor para os leitores de tabloides -, ele não se propõe menos que a regeneração da educação nacional.

Pois bem, essa regeneração não é outra coisa senão a transformação do conservadorismo ideológico em política pública. São três as suas expressões mais evidentes. A primeira é a sua conceção de curriculum. Crato é há muito porta-voz da tese de que a educação está hoje muito pior do que antigamente. E é ao antigamente que quer voltar. A desvalorização curricular da educação artística (musical, visual e tecnológica) e da educação para a cidadania ou a fixação no suposto papel nuclear dos exames mostra uma desconsideração do papel da escola na formação do sentido crítico, da capacidade criativa, da formação de convicções éticas e na experimentação da cidadania. É uma escola regressada à função de ensinar a memorizar, ler, escrever e contar. Uma escola que forma força bruta de trabalho desqualificado e abdica de formar gente crítica, criativa e consciente dos seus direitos e deveres. Para um país condenado a ter como única vantagem comparativa os baixos custos da mão de obra, isso é quanto basta.

Ideológico é também o desdém para com a educação de adultos e a insinuação de que a certificação de competências incluída no programa Novas Oportunidades era uma certificação da ignorância. Essa recusa de que a vida de trabalho ensina e cria habilitações, tantas vezes mais perfeita e intensamente do que as aprendizagens formais em meio escolar, tem a marca de um elitismo arrogante que não se coíbe de humilhar milhares de homens e mulheres que não tiveram acesso à escola enquanto jovens e que não lhes reconhece nem valida as competências que o percurso da vida lhes deu. Mais ideologia do que isto é difícil.

Ideológica é, enfim, a criação de 115 mega-agrupamentos escolares, alguns com mais de 3600 alunos. Invocar para o efeito o "reforço do projeto educativo e da qualidade pedagógica nas escolas" é brincadeira de mau gosto. O que está em causa é tão-só a transformação das escolas em armazéns de anonimato e mediania, desqualificando o serviço público de educação e favorecendo assim o ensino privado que aposte na personalização do trabalho educativo, vedado desta forma à escola pública.

A escola pública de qualidade é uma das gorduras do Estado que o Governo quer queimar. O espírito crítico, a aprendizagem da estima pela diversidade, a exigência cidadã arderão por arrasto. É a dieta ideal para dar à sociedade gente mansa e com a versão oficial da felicidade bem decoradinha.»

(Os sublinhados são da minha responsabilidade)


 
 

4 comentários:

  1. parece que os ministros, que espalhavam a sua sapiência nos blogues e nos artigos de opinião, estão a perceber que governar é uma coisa diferente.

    o Crato, o Álvaro e o Francisco, se têm espelho em casa, já devem ter percebido que a coisa não está a correr muito bem.

    abraço Carol

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  2. O Crato é um cretino como os outros!
    Vamos a ver como é que vai correr o arranque do ano lectivo com tanta mudança cada vez para pior!
    Penso que muitos e muitas docentes não irão aguentar a parada!

    Abraço

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  3. Aplaudo de pé, Gracinha!

    Bem hajas.

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  4. Subscrevo e assino!
    Chega de tanta hipocrisia!

    beijinhos

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