Quem não se lembra dos episódios do habilidoso MacGyver, exímio em inventar geringonças, que passavam aos domingos à tarde em finais da década de 1980? E quem não se lembra também como tão do agrado era do "nosso" atual "presidente" da República, que à época, habitava - com mais tónus e também com mais milhões que jorravam da Europa - o Palácio de São Bento?
Lembrei-me disso quando li a crónica que Pacheco Pereira (voz verdadeiramente insuspeita!) escreveu no Público que está, diga-se de passagem, um verdadeiro mimo.
Vale a pena ler-se. Passo então a transcrever na íntegra:
«A caracterização do eventual governo do PS como uma
“geringonça” foi feita por Vasco Pulido Valente e repetida com evidente gozo
por Portas, dando o mote para vários deputados do CDS que costumam repetir o
chefe. Muito bem, não me parece que haja qualquer problema em aceitar a
classificação, tanto mais que ela não é tão pejorativa como eles pensam. Mas
proponho outra simétrica para o governo PSD-CDS, muito menos ambígua e que não
há imaginação criadora que lhe encontre qualquer sentido positivo: a avantesma.
A geringonça apareceu para que não nos assombre a avantesma.
Geringonça não é uma designação tão má como isso. É verdade
que é “coisa mal feita, caranguejola, obra armada no ar”. Mas perguntem ao
MacGyver e dêem-lhe um canivete suíço. A primeira máquina a vapor, a primeira
lâmpada, o avião dos irmãos Wright podiam ser designadas como geringonças, mas
as máquinas a vapor, as lâmpadas e os aviões que vieram a seguir já não eram
geringonças. O governo minoritário do centro-esquerda do PS com a apoio parlamentar
do BE e do PCP ainda é uma geringonça, mas quanto mais baixas forem as
expectativas mais a geringonça se pode transformar numa máquina a sério. Ou
talvez não.
Mas, o governo tombado na Assembleia não é uma geringonça, é
já uma máquina a sério, com quase cinco anos de experiência, e é por isso que a
continuidade da direita no poder foi sentida como sendo tão assustadora que
conseguiu que o MacGyver invisível da esquerda, à pressa, construísse com o seu
canivete suíço, a geringonça.
É que, para uma maioria dos portugueses, que votou “contra o
governo” – insisto a única interpretação sólida dos 62% de votos –, ficarem lá
“os mesmos”, seria o pior dos pecados e é essa força invisível e visível que
permitiu a geringonça. É também por isso que o cimento da geringonça não está
nos acordos, nos “papéis” como diz pejorativamente a direita, mas no que
permitiu que eles se fizessem.
Vamos à avantesma. Os nossos dicionários são inequívocos
“aparição de uma pessoa morta”, “pessoa ou objecto assustador, disforme ou
demasiado grande”. Morto está, mas o Presidente da República ainda lhe permite
que mexa, para ainda maior susto dos portugueses. Mete medo? Mete e ainda devia
meter mais. Todo o processo da avantesma, o seu “conceito” como agora se diz,
está bem explícito na história da devolução dos 35% da sobrecarga do IRS, que
agora se verifica ser zero. Porque é que a história da devolução do IRS
fantasma está na massa do sangue da avantesma? Porque foi isso que
reiteradamente semana sim, semana sim, a coligação fez nestes últimos quatro
anos e continua a fazer como quem respira.
É a mentira muito comum na esfera pública e política? É. Há
uns especialistas na mentira que estão agora a contas com a justiça e que
vinham do lado da geringonça. Mas isso não justifica o uso sistemático da
mentira como mecanismo de governação, com a agravante de que uma comunicação
social que nunca esteve tão perto do poder, em particular no chamado jornalismo
económico, mas não só, dá uma amplificação enorme a estas mentiras. Transformaram-se
naquilo que é o mais próximo que já alguma vez conhecemos, do “pensamento
único”. E o “único” tem muita força, mas é do domínio dos “objectos disformes”,
“demasiado grandes”, das avantesmas.
Denunciei várias vezes que se estava a criar artificialmente
um panorama paradisíaco da situação económica portuguesa para efeitos
eleitorais, e que iríamos ter um despertar abrupto depois do dia 4 de Outubro.
Assim foi. Não o disse porque tinha qualquer varinha mágica ou informação
privilegiada para o afirmar. Bastava somar dois e dois e verificar que não
davam quatro e as coisas não encaixavam. A pergunta certa é por que razão não
se fazia a soma a ver o que é que dava?
Mas a voz do governo e dos interesses que com ele se
fundiam, funcionavam como um megafone ensurdecedor. Hoje, que se começa a
perceber melhor qual era a verdadeira situação orçamental, os números
preocupantes sobre a evolução da economia portuguesa, as prevenções do Banco de
Portugal, o que está a acontecer com o Novo Banco e com a TAP, a censura dos
números sobre a emigração, ainda vamos ver culpar retrospectivamente a esquerda
pelos números negativos. Aliás, não é “vamos ver”, é “já vimos”, porque já vi o
desplante de um jornalista da área económica de um grande jornal, dizer que a
culpa destes números, no caso do IRS que fugiu, foi “das eleições”.
Foi, aliás, por estas e por tantas outras que me surpreendeu
que o Presidente da República, na sua nova e inventada Câmara Corporativa, se
tenha esquecido de ouvir os jornalistas de economia que, salvo honrosas
excepções, se comprometeram a fundo nos últimos anos na interpretação do
“ajustamento” que fez a coligação PSD-CDS. Eles lhe diriam certamente que o
maior crime que se pode fazer à economia é aumentar o rendimento das pessoas e
das famílias, em vez das empresas. Eles lhe diriam que a “reversão” da
legislação laboral, um dos terrores dos empresários que acompanham Passos e
Portas, tornará as empresas ingovernáveis e dificultará essa maravilhosa opção
que é despedir. Eles lhe diriam que tentar no meio de muitos constrangimentos,
olhar de forma dedicada e voluntariosa, para medidas moderadas destinadas a
melhorar a qualidade de vida dos portugueses, é um projecto comunista. E eles
lhe diriam, como aliás já li, que Hollande pode – como um mau exemplo a
exorcizar – dizer que não vai cumprir o Tratado Orçamental, para gastar mais em
defesa da França, mas nem pensar pôr em causa as “orientações”, como lhe chama
o Presidente, da “Europa” a Portugal. E eu a pensar que o único senhor das
“orientações” era o povo português, votando. Mas isso já não se usa.
Por isso, a queda do governo foi também a queda do “seu”
governo, com ele perderam a face e a independência, e reflectem também muita da
raiva que anda por esses lados.
A geringonça é um frágil meio de combater a avantesma, mas
hoje não há outro para reequilibrar o sistema político puxado violentamente à
direita. Talvez o melhor exemplo dessa viragem à direita esteja no número de
vozes que afirmam alto e bom som que preferem um governo de gestão sabendo bem de
mais os estragos que isso trará à economia, à paz civil e à legalidade
democrática. É que a avantesma alimenta-se do “único”, do “não há alternativa”,
do direito natural e irrevogável de governarem, para si e para os seus.
Se gosta de ser enganado, junte-se ao exército dos mortos
vivos, mas não se esqueça em Janeiro de 2016 de ir lá buscar a reposição dos
35%. Sim, porque para si, nem Passos, nem Portas, nem Albuquerque, iriam fazer
essa coisa socratista de mentir para ganhar eleições.
É que a avantesma, mete medo e deve meter medo. Não me canso
de dizer, é perigosa, muito capaz na defesa dos seus interesses, com enormes
recursos, com muitas contas a ajustar, e muitas velhas e novas mentiras para
dizer.
E deve-se ser implacável com a geringonça, para que não se
parta por dentro, já que por fora vai respirar ácido sulfúrico.
Ou que esperam da avantesma que é do domínio do enxofre?
Sim, daquele enxofre que vem na Bíblia.»
Até o suspeito Vasco Pulido citado pelo insuspeito Pacheco
ResponderEliminarcasca no mesmo
Cavaco ficará na história não por isso, nem por o governo
mas pelas cagarras
(coitadas)
E pelo tamanho da banana da Madeira....
EliminarPobrezinhas, sem culpa nenhuma...
Gracinhamiga
ResponderEliminarGeralmente dizia que não gostava do Pacheco Pereira, que era um troca-tintas, um camaleão e etc.
Agora, vê lá, já gosto - não muito, cuidado, mas um bocado bastante grande...
Este texto (como mitos outros de Pacheco Pereira) é exemplar. Compara-lo com o do VPV é pecado mortal sem penitência.. A avantesma não tem perdão. E o resto é, como dizem os brasucas, "faz que anda mas não anda"
Bjs da Raquel e qjs do LEÃOZÃO - Não há duas sem três...
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A Travessa do Ferreira já abriu as portas e até já recebe comentários. Ainda falta muito para estar completa; continua em obras, mas já pode ser visitada... Se o quiseres transmitir à malta fico-te muito agradecido. Sê bem aparecida! Obrigado
Tal como eu, Henriquamigo! O que eu vociferava contra o Peixeiro Pareira! E agora, oiço-o e leio-o e concordo com o que diz. Mas sempre com um pé atrás...
EliminarBeijinhos para o três-vezes-Leão!!!!
Nunca gostei do CS. Mas agora parece que só ouvir-lhe o nome me faz alergia. Gostei do texto.
ResponderEliminarUm abraço e bom domingo
Também nunca o suportei e agora nem vê-lo e muito menos ouvi-lo!!!
Eliminar~~~ Kkkk...kkk...
ResponderEliminarMuito se escreveu
sobre tais matérias, porém, esta crónica alia-as magistralmente.
Neste exercício, PP não falhou um tiro, atingiu o alvo em cheio...
Facto que confirma o famoso adágio: «a vingança serve-se fria.»
~~~ Beijinhos. ~~~
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Foi mesmo violento!! Mas bem certeiro!!
EliminarBeijinhos e boa semana.
Excelente artigo! Esclarecedor, duro mas cheio de ironia!
ResponderEliminarTambém achei. E gostei!
EliminarLeio e ouço o PP por me merecer respeito; pelo percurso que teve e pela argumentação com que defende o que pensa, sem pedir licença a ninguém.
ResponderEliminarQuanto ao anilhador ouvi dizer que andavam a derreter dinheiro em obras para o acolher de acordo com a dignidade de ex-presidente em instalações do Estado. Porquê?! se nunca se comportou como Presidente da República dos Portugueses?
Que vá prá Coelha e leve o Coelho.
Boa semana.
E que faça muito boa viagem! Desapareça que saudades não deixa... Nenhumas!
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