quarta-feira, 17 de outubro de 2012

No jornal de hoje


Por vezes o meu jornal diário não traz “de jeito”. Quer dizer, não traz nada que realmente me diga alguma coisa, que me encha as medidas. 
  • Hoje, pelo contrário, traz muita coisa “de jeito”. Até porque é 4ª feira e é dia de crónica de Baptista-Bastos, o grande senhor da ironia mais fina, das figuras de estilo mais estudadas, da escolha das palavras mais adequadas à crítica mordaz das situações da atual conjuntura mais bem captadas. A crónica de hoje intitula-se “D. Policarpo não está cá” e zurze, da forma mais literária e mais elegante a «enormidade» e a «insensatez» das palavras que o cardeal que em tom grandíloquo chama de «o solene purpurado» recentemente proferiu contra o povo que saiu para as ruas a manifestar-se contra a opressão de que está sendo vítima diariamente às mãos de uns governantes que sofrem da «insolência de quem se julga detentor do direito absoluto». Penso que a frase que mais certeiramente pretende atingir o cardeal enquanto homem de Deus, da Igreja e da caridade cristã deverá ser a que diz: «numa altura em que o País vive uma crispação inédita, onde a fome, a miséria e a angústia estão generalizadas, as palavras de D. Policarpo não são, somente, insensatas – colocam o autor no outro lado do coração das coisas.» 
            Lê-se este texto e fica-se com o coração pesado, em sangue. 

  • Já a crónica de Ferreira Fernandes, Vítor Gaspar, o anti-Nobel primário, zurze forte e feio o “nosso” robot das Finanças comparando-o, ou melhor, anti-comparando-o com os dois americanos que ganharam este ano o Nobel de Economia. Diz ele com muita graça: «Leram as justificações do comité sueco ao atribuir o Nobel de Economia? É um ataque claro a Vítor Gaspar, só pode. (…) Se era para sublinhar exatamente o que Gaspar não sabe fazer – ele que até o seu Governo desune – não podia ser mais acintoso.» E, depois de quase rir às gargalhadas com o que desenvolve na sua breve crónica, termina: «Enfim, coisas da vida. Da vida, área que o nosso ministro das Finanças desconhece (e, suspeito, tem raiva de quem conhece). (…) Tudo o que foge ao acerto de contas é-lhe indiferente. Mas esse não é o problema maior. O problema maior é que, depois, ele não acerta as contas.»

    Lê-se este texto e, embora retrate uma realidade bem triste, ficamos com uma enorme vontade de rir. E rir faz bem!

  • Outro texto extraordinariamente justo, elegante e bem escrito – e que merece ser lido – é Para uma breve homenagem de Vasco Graça Moura sobre os 90 anos que escritora Agustina Bessa-Luís cumpriu ontem. É, de facto, nisto que VGM é realmente muito bom: a fazer crítica literária, a discorrer sobre a nossa Literatura, a escrever poesia ou a traduzi-la. Nunca – digo eu – deveria perder o seu precioso tempo a escrever textos de cariz político por ser insidiosamente tendencioso, aleivosamente demagógico, chegando muitas vezes a faltar à verdade da forma mais vil e perversa.


13 comentários:

  1. Só o "Bê Bê"
    Me faz comprar o "Dê Nê"

    O texto enrodilhado e bem letrado do "Fê Fê" já não me faz rir, nem sequer sorrir...

    O outro é memo isso que diz que ele é...

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  2. Assino por baixo. Embora o meu jornal diário seja o "Público", não deixo de ler o BB e o FF no DN "on line". Já quanto ao VGM, confesso que já não consigo ler as suas crónicas no DN. Como poeta e tradutor de poesia é, no entanto, outra loiça...

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  3. Li todas as crónicas menos a de VGM...
    É que no fim de semana tinha lido um artigo muito interessante sobre Agustina e além disso conheço razoavelmente a sua obra!
    E não se consegue ler tudo!
    Quanto ao "purpurado" não lhe fazem impressão os milhares de pessoas que se juntam em peregrinações...afinal é também uma forma de "protesto", pretendem que algo se modifique nas suas vidas!

    Abraço

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  4. Tudo boas notícias. Para variar, então.

    Não gasto um cêntimo em jornais portugueses porque detesto perder tempo com mediocridades.
    As pouquíssimas excepções - refiro-me a jornalistas - dão-se a ler ao fim de semana.

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  5. Vasco .... ??'

    Baptista Bastos....claro!

    Ferreira Fernades....sim.


    Agustina....não.

    Policarpo....pois, funcionário do Vaticano colado ao poder, como é hábito

    Bons sonhos.

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  6. Li o BB e o FF. Para o Vasco, não tenho pachorra...

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  7. Sempre que posso vou à "Tabacaria Marques" buscar o DN. Chego a trazer 2 e três jornais dos últimos dias.
    Estou a recebê-lo gratuitamente no âmbito duma campanha a que correspondi através dum contacto telefónico há já uns meses. Nem sei durante quanto tempo mais o vou receber à borla.
    De facto, as crónicas de Baptista-Bastos, Vasco Graça Moura e Ferreira Fernandes são, normalmente, interessantes. O BB já se sabe é um escritor com um estilo fora de série. Vasco Graça Moura gosto dele como poeta essencialmente
    (se bem que nos tempos das barragens nas portagens da ponte 25 de Abril ele tenha escrito uma crónica/reportagem em que atacava os radio amadores e eu, que na altura era Presidente da Direção da ARAL -radioamadores de Leiria, senti-me na obrigação de escrever a contestá-lo, porque abordou o tema das comunicações pirata da altura duma forma muito leviana...).

    A verdade, porém, é que começa mesmo a ser muito problemático arranjar tempo para tanta leitura.

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  8. Não basta ter razão

    é preciso resistir

    B.B. - sempre

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  9. Rir enquanto podemos. Já reparaste que rimos cada vez menos?

    bji

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  10. D. Policarpo tem o contraditório em D. Januário. Lindo de ver e ouvir!

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  11. Dá gosto "passar os olhos" pelo "teu jornal" através da tua leitura certeira e selectiva!

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  12. Puma, BB sempre! Concordo!

    Nina, querida, temos de rir sempre! Mesmo em tempos de austeridade canina. Ou devo dizer coelhenta?!....

    É verdade, amigo Nunes, não há tempo para tanta leitura. Tantos livros bons para ler, tanto jornal, tanta crónica, tanto comentário! Escreve-se mais do que se lê neste país!

    Justine, agradeço o elogio imerecido.

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