Vai-se falando os jornais e já quase toda a gente sabe que se Alexandre Herculano nasceu há 200 anos, ou seja, em 1810. Mas também se comenta nos jornais que a efeméride não tem sido suficientemente comemorada, ou melhor, que não se está a dar a estas comemorações a importância devida e proporcional à grandeza da figura ilustre que foi Herculano.
Baptista-Bastos escrevia em Julho que “o Governo desleixou as comemorações do bicentenário do nascimento de Herculano. Está na natureza do Governo. O dr. Cavaco ignorou a data. É a sua relutância às minudicências da cultura. O dr. Cavaco tem mais de se ralar do que se apoquentar com a efeméride. Aliás, creio que nem o Governo nem o dr. Cavaco alguma vez se debruçaram sobre uma linha sequer, uma escassa e minguada linha escrita pelo grande historiador.”
João Céu e Silva, por sua vez, escreveu: “Há 200 anos, Alexandre Herculano nascia em Lisboa no Pátio do Gil. 133 anos após a sua morte, não há memória dessa particularidade da sua biografia no referido pátio e o que se encontra ao visitar-se o local é um tapume que cobre a visão de destruição dessa Lisboa antiga.
A poucos metros do taipal amarelado fica a casa onde vivia a fadista Amália, mas, apesar da proximidade, ninguém ali sabe onde é o tal Pátio do Gil. Na taberna ao lado do pátio desaparecido a resposta revela o mesmo desconhecimento do ex-vizinho ali nascido. Alexandre Herculano já não mora ali, nem "existiu" naquele sítio para esta geração de lisboetas que dele conhecem melhor as avenidas com o seu nome e, talvez, o facto de ter morrido distante, só e longe do poder que o venerava, na ribatejana Quinta de Vale de Lobo. Esse ignorar da dimensão nacional da personalidade do historiador também se verifica com as autoridades da cultura oficial, situação remediada à última hora com o anúncio da realização avulsa de cerimónias para assinalar a data do bicentenário do nascimento de Alexandre Herculano.”
António José Saraiva, de acordo com as palavras do Professor Guilherme de Oliveira Martins, que “Herculano tem sido vítima de uma conspiração de silêncio.”
Ontem, e de acordo com o convite que aqui transcrevi no passado dia 15, realizou-se no Arquivo Distrital de Leiria o Colóquio sobre Alexandre Herculano, louvável iniciativa do CEPAE, que só pecou por ter convidado cinco oradores para falarem sobre a figura policromática que foi A. Herculano. De facto, e apesar da intenção ter sido muito boa, já que se pretendia que cada um dos convidados falasse sobre um aspecto daquele Homem cultural, tornou-se demasiado longo o colóquio, dado que, por um lado, se realizou ao final da tarde de um dia de trabalho e, por outro, porque incluiu convidados de alto nível que não foram ali dizer apenas “umas palavrinhas” sobre o poeta historiador.
De todas as comunicações e, sem desprimor para as restantes, dou aqui especial realce à palestra do Professor Oliveira Martins. E explico porquê: é que, enquanto cada um dos outros palestrantes se debruçaram, e bem, sobre um aspecto do homenageado, quer fosse como historiador e historiógrafo (o Professor Saúl António), como poeta e escritor iniciador da narrativa histórica no nosso país (a Dr.ª Amélia Pais), como jornalista (o Dr. Adélio Amaro), ou como agricultor (o Eng. Carlos Fernandes), Oliveira Martins, tocando embora todos os aspectos do Homem de humanidades que foi Herculano, traçou o perfil do cidadão completo, do homem da cidadania, o homem que defendeu as instituições, o homem moderno e liberal, o homem do direito, o homem do municipalismo incipiente à época, o homem da fraternidade espiritual, da rejeição da superstição e da defesa do sagrado, o homem defensor da língua, da história dos factos (e não das lendas) e da cultura.
Posso aqui afirmar que com este Colóquio, em que a sala não encheu, Leiria disse um justo “Presente!” na chamada tímida das comemorações do bicentenário do nascimento de Alexandre Herculano.