sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Tradutores





Fiquei a saber pela minha querida amiga e antiga aluna Rita “Aimée”, tradutora de formação e de profissão (a quem dedico a entrada de hoje), na sua página do Facebook, que hoje é o Dia Mundial do Tradutor. E lembrei-me de um pequeno texto de Sofia Barrocas sobre a árdua tarefa dos tradutores, que li e tenho guardado desde Maio último à espera do momento oportuno para o trazer para aqui. Hoje é o dia ideal para o fazer.

Fiquei a saber que foi escolhido o dia 30 de setembro para celebrar os profissionais de tradução por ser o dia de S. Jerónimo, patrono dos tradutores, que foi quem recebeu do Papa S. Dâmaso, no século IV, a incumbência de traduzir a Bíblia do hebraico para o latim.

Diz então o breve trecho:

«Há uma profissão tão difícil quanto delicada e muito pouco reconhecida: a dos tradutores. Embora quase nunca pensemos neles, um tradutor é tão importante como um autor. Em textos técnicos, um erro de tradução pode implicar prejuízos de milhões, quedas de infra-estruturas, conflitos diplomáticos e uma miríade de inimagináveis desastres. Em textos literários, pode implicar o sucesso ou o fracasso de um escritor: uma má tradução torna impossível - ou, pelo menos, desgastante – a leitura de uma obra, nem que tenha sido escrita por um dos maiores génios da literatura. Mesmo sem termos a menor noção do texto original, tropeçamos nas frases, chocamos com incongruências, sentimos que alguma coisa “não está bem”. Uma boa tradução faz-nos aderir ao universo do autor, deixa-nos subentender as nuances de uma língua que não dominamos, permite-nos entrar noutros mundos. E tão importante é a tradução de uma obra de um elaborado poeta do século XVII como a de um livro infantil de «bonecos». (...)»

Sofia Barrocas
Notícias Magazine, 15 de Maio de 2011

Por mim, as minhas preferências de leituras foram sempre para as obras de autores portugueses para evitar a(lguma)s traduções. Lembro-me de ter desistido da leitura de O Erro de Descartes de António Damásio pela tradução pobre que dele foi feito para a nossa língua. Por outro lado, não podemos deixar de pensar que muitos dos nossos melhores autores e, em especial, poetas, são ou foram também tradutores. É o caso de Jorge de Sena, Eugénio de Andrade, Sophia de Mello Breyner, Fernando Pinto do Amaral, Nuno Júdice, João Barrento, José Agostinho Baptista, Mário Cesariny, para não falar de Camilo Castelo Branco, Eça de Queirós e muitos, muitos outros excelentes autores portugueses.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

A minha Avó





Esta é uma fotografia da minha avó materna quando era ainda solteira e vivia na sua terra natal, Calañas, Rio Odiel, Huelva. Lá nasceu no dia 29 de setembro de 1895. Faria hoje... muitos anos.

Veio para Portugal ter com uma das irmãs mais velhas, no ano de 1926, viúva, com dois filhos e depois de ter perdido outros dois - Lucas e Francisco - que, tal como o pai,  por lá ficaram sepultados.


(Não é uma graça este passaporte?)

Anos mais tarde, quando resolveu voltar a casar cá em Portugal e precisou de documentos de registo de nascimento, teve imensa dificuldade em consegui-los porque os registos tinham ardido ao tempo da Guerra Civil. Depois de muito andar e mexer junto do Consulado e da Embaixada espanhois, lá conseguiu, passados anos e muitas manobras, um certificado de nacionalidade que, dizia a minha avó, vinha com o ano de nascimento errado... Verdade ou não, o certo é que sempre brincámos com ela relativamente à idade que tinha (ou não)...


Era a minha avó do coração.  Era a minha Memé - como eu a chamava. Nasci em sua casa, quase vivi com ela até aos dez anos e quando enviuvou pela última vez, tinha eu 14 anos, veio viver connosco para Sintra.  Quando vim viver para Leiria, veio comigo. Ajudou a tratar da minha filha mais velha e saiu de minha casa para a sua última morada em 28 de Dezembro de 1982.

Não era uma pessoa fácil, não senhor! Não se dava muito bem com a filha, a  minha mãe (que também não fácil, diga-se!), e fez "a vida negra" à nora (que era um doce de pessoa). Mas era a minha Memé e eu gostava muito dela.


quarta-feira, 28 de setembro de 2011

A festa de fim de Verão




Belo fim de tarde de verão, não obstante ser já outono...


Foi uma festa de fim de verão daquele tipo "assalto" que se faziam nos tempos de juventude em casa de alguns para a qual se convidava uma série de amigos que levavam outros amigos. Cada um levava algo para comer e para beber, dispunha-se tudo muito bem na mesa e depois cada um servia-se a contento. Punham-se discos levados por alguns a tocar no gira-discos e dançava-se até haver comida e bebidas e paciência dos pais da casa para nos aturarem.

No sábado, lá fomos, convidados por uns amigos que se dispuseram a organizar as coisas, a alugar o salão das antigas instalações do Hotel das Arribas na Praia Grande, levando cada um de nós doces e salgados e bebidas. Só que a música era ao vivo e a cores com os amigos Diamantes.

Foi uma festa daquelas! Muito informal, muito divertida, muito completa. Eles tocaram todas aquelas músicas loucas de 60 e 70 – curiosamente tocaram melhor que naqueles tempos – e houve, de igual modo, momentos de grande ternura e de grande emoção.


Cá está o nosso conjunto que contou com a presença do Duarte Mendes (de camisa branca)
Lembram-se dele no festival da Eurovisão em 1975 com a canção Madrugada?



Dançou-se muito


Dançou-se assim



Assim..


... e assim.

Houve o momento de ternura que foi a primeira apresentação da neta do nosso querido baterista e meu amigo Caínhas tocando o itema Smile no seu saxofone


A Carlota, muito compenetrada, tocando o seu saxofone


E também houve lugar a uma breve homenagem ao compositor e poeta recém desaparecido José Niza, quando Duarte Mendes cantou, visivelmente emocionado, a canção de autoria do referido compositor "Com uma arma, com uma flor" que mereceu uma interminável e sentida salva de palmas de todos os presentes.


Nasci num país de silêncio e luta
E cresci rasteiro
(meu pão era curto)
Não vendi a esperança
Nem pedi meu preço
De tudo o que vi
Nunca mais me esqueço
Fui vivendo à força
De suor e fome
Vi levar amigos
Do meu mesmo nome
Nas balas da sorte
Tive a minha escola
Aprendi a vida na morte
Em angola
Numa lua cheia
Saltei a fogueira
Numa lua nova
Saltei a fronteira
Sofri um país
Calei a razão
Vendi minha pele em frança
Por pão
Calaram-me a boca
Cortaram-me o riso
Mas estava de pé
Quando foi preciso
Em abril, abril
Em abril-sem-medo
Vesti minha farda
Fardado em segredo
Em abril, abril
Em abril-sem-medo
Da raiva e na dor
Do suor sem terra
Deste dó maior
Do lucro e da guerra
Das armas em flor
Nasceram razões
Nasceram braços
Nasceram canções
Nasceram bandeiras
Da cor deste sangue
Que temos nas veias
Que temos na carne
Nasceu meu país
Meu país criança
Em abril, abril
Tempo de mudança
Meu povo, raiz,
Dum cravo de esperança.

Composição: José Niza
Letra: Paulo de Carvalho

terça-feira, 27 de setembro de 2011

O meu amigo Sebastião



Podem muito bem  pensar que vivo apenas de recordações. Não é de todo verdade. Só que o presente é tão fugaz - há quem diga até que não existe, que é apenas o momento que separa o passado do futuro - e o futuro ...  sabe-se lá! - talvez seja o reflexo do passado. Bom mas além de tudo isso, tenho muito boa memória. E como, enquanto "estive no activo" não tinha quase tempo para respirar, mantive muitas - ia a dizer todas, mas isso seria exagero - lembranças em passivo se bem que dia a dia me viessem à cabeça de acordo com as datas. E, agora, que tenho a mente quase por minha conta, elas, as lembranças, vêm constantemente ao de cima. Diz quem sabe que a memória é o grau mais baixo da inteligência. Pois talvez eu me tenha ficado mesmo pelo grau um sem conseguir alcançat os restantes. Paciência...

É o que acontece sempre no dia 27 de cada mês de setembro: faz anos o meu amigo Sebastião. A última vez que o vi foi em 65 do século passado, tendo-lhe escrito ainda alguns anos a felicitá-lo por este dia. Nunca mais soube nada dele, mas ficou registado. Não, não me "passou pelo coração", foi apenas um daqueles amigos da Nazaré. Era de Ponte de Sôr, era o mais alto de todos nós e tinha uns lindos olhos verdes - um giraço! Mas não passou de um amigaço.


(estão a vê-lo? Muito alto e ao lado da baixinha do grupo, a MariCarmen.
Eu estou no cantinho esquerdo, de sorriso divertido.)


Era o fotógrafo do grupo; todas as fotografias que guardo daquele tempo foi na máquina dele que se tiraram e foi ele que as revelou, e tinha imenso jeito para desenhar. Uma vez enviou-me um desenho com uma simpática dedicatória que eu guardei e que sempre recordo no dia do seu aniversário.






Parabéns, Sebastião! Lá em Ponte de Sôr ou sei lá onde.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Abbey Road



Li algures que foi a 26 de Setembro de 1969 – faz hoje 42 anos – que o último álbum dos Beatles Abbey Road – foi lançado. Diziam também que, no mesmo dia e mês mas do ano de 1965, Sua Majestade a Rainha Isabel II os teria feito membros da Ordem do Império Britânico passando a ter o tratamento de Sir. Não foi, porém, em 26 de Setembro mas em 26 de Outubro do ano de 65.

Muito se especulou a propósito da capa do álbum porque o Paul ia descalço, porque o John ia à frente, porque iam a atravessar a rua naquele sentido, que o Paul teria morrido, etc., etc. Qualquer coisa que eles fizessem era, de imediato, considerado carregado de significado mesmo que fossem as coisas mais comuns e mais sem sentido. Era o preço da fama dos que foram a verdadeira pedrada no charco da cultura, da forma de viver, da mundividência do mundo ocidental.

 


Procurei o meu velhinho disco de vinil que me ofereci no Natal de 69, para relembrar as canções todas desse último trabalho do conjunto – naquele tempo não se dizia “banda”- que mais me marcou – e a (quase) toda a juventude daquele início de década. O disco está muito cansado (para não dizer riscado) de tantas vezes ter sido rodado, e o gira-discos – peça há muito caída em quase completo desuso – está um bom bocado rouco. Mas deu para ouvir aquelas que foram as últimas obras compostas e gravadas pelos quatro em conjunto. A intenção era escolher uma, mas ... A mais bonita talvez seja “Something”, a mais jovial talvez seja “Octopus’s Garden”, a mais conhecida talvez seja “Here comes the Sun”, a mais carismática talvez sela “The End” – e estive quase a escolhê-la. Mas acabei por escolher a mais romântica, a mais dramática, porque eu sou assim...

Quererão manifestar a vossa preferência de entre as canções deste que foi a última obra prima dos Beatles?


 




domingo, 25 de setembro de 2011

Vistas de Sintra



Foi um belo fim de semana. O tempo esteve maravilhoso: um princípio de outono com uma temperatura de amena primavera. Nem as cores são ainda de outono mas Sintra já se vestiu daquele frescor matinal e vespertino que faz lembrar a escola quando começava em outubro.

A festa foi ... completa. Mas dela falarei numa próxima vez. Hoje deixo-vos com algumas imagens que espero bem sejam do vosso agrado.


Castelo dos Mouros visto da Correnteza


Palácio da Vila e Torre da Câmara  também vistos da Correnteza


Vista da Vila Nogueira e da Casa dos Penedos


Recorte do Palácio da Pena visto do Arrassário


Palácio Milhões (actual Quinta da Regaleira) visto do Arrassário


 Vista da Torre da Câmara, Casa das queijadas da Sapa e Volta do Duche


Ao longe a Casa dos Penedos (Raul Lino) vista do velho mercado da Vila


As chaminés do Palácio da Vila visíveis por sobre todos os telhados


 S. Pedro de Sintra


 E este mirante? Tão romântico!


E este arco que tantas e tantas vezes passei?

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Fim de semana em Sintra





Ao volante do Chevrolet pela estrada de Sintra,
Ao luar e ao sonho, na estrada deserta,
Sozinho guio, guio quase devagar, e um pouco
Me parece, ou me forço um pouco para que me pareça,
Que sigo por outra estrada, por outro sonho, por outro mundo,
Que sigo sem haver Lisboa deixada ou Sintra a que ir ter,
Que sigo, e que mais haverá em seguir senão não parar mas seguir?

Vou passar a noite a Sintra por não poder passá-la em Lisboa,
Mas, quando chegar a Sintra, terei pena de não ter ficado em Lisboa.
Sempre esta inquietação sem propósito, sem nexo, sem consequência,
Sempre, sempre, sempre,
Esta angústia excessiva do espírito por coisa nenhuma,
Na estrada de Sintra, ou na estrada do sonho, ou na estrada da vida...
                                                             (...)

     (Álvaro de Campos)


Vem este intróito todo para dizer que vamos passar o fim de semana a Sintra. Não vou "ao volante do meu Chevrolet" porque nem tenho um Chevrolet, nem consigo ir ao volante... mas nunca se resiste a um (pedaço de) poema do meu querido Álvaro de Campos, mais ainda se fala de Sintra (e daquela inquietação de quem não está bem onde está...)

Vou a uma festa de fim de verão, lá para a Praia Grande...



... animada pelos meus amigos Diamantes...




... que eram assim quando começaram...




Regeneração IV


Depois de estrear na Mãe de Água e de ter sido exibida em Vitoria - Espanha e em Tibães, a exposição Regeneração da nossa amiga Clotilde Fava vai ser inaugurada no Centro Cultural de Sines, no próximo dia , sábado, pelas 18.30.

É uma boa oportunidade para dar uma "escapadinha" até ao lindíssimo e sereno  litoral alentejano onde ainda se pode desfrutar de um tempo muito agradável e até de umas ricas banhocas.

Fica aqui o convite.





quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Summer's gone!



Gosto, sempre gostei  muito, da voz e das canções de Paul Anka, aquele extraordinário cantautor canadiano que apareceu nos anos 50 encantando todos quanto o ouviam naquela forma romântica de cantar.

Continuei , ao longo das anos, a ouvir e a trautear muitas das suas belas canções e, todos os anos, no fim do verão - época do ano que sempre me custa a passar - vem-me à cabeça a sua interpretação de "Summer's gone" de 1960, que deixo aqui para ouvirem e apreciarem a letra, se for caso disso.



  



Summer's gone and no songbirds are singing
Because you're gone, gone from my arms
Gone from my lips but you're still in my heart

What to do? Oh, I'm left here just crying
Over you, oh, I'm so blue
What can I do now that you're gone?

The days, they prolong now that you're gone
My nights, they leave me blue (you're so blue)
I don't know why there are tears in my eyes
Can it be that I'm still in love with you?

Summer's gone and no songbirds are singing
Because you're gone, gone from my arms
Gone from my lips but you're still in my heart!


Também poderão gostar de relembrar outra cançãozinha que canta o  fim de verão, do ano de 1968, que nos representou na Festival da Eurovisão desse ano contra todos os "velhos do Restelo" que preferiam aquelas canções superlamechas com que concorreramos nos anos anteriores.  No fim, e pela primeira vez nas nossas (tristes) participações no dito festival, arrancámos quatro belos pontos que bem deixaram os ditos velhos de cara à banda.

Lembram-se?




Como tudo o que acaba,
Como pedra rolando duma fraga,
Como fumo subindo no ar;
Assim estou quase indiferente,
Caminhando sem mais notar a gente,
Que por mim vejo passar!

O verão já terminou,
Uô, Uô, Uô
Foi um sonho que findou
Uô, Uô, Uô
Não interessa mais pensar!

Assim deixo esta tristeza
Vogando embalado na certeza,
Que o verão há-de voltar!
E o verão que sonho perto,
Vai trazer para mim eu sei de certo,
Aquilo que este agora veio tirar!

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

O meu Professor Vitorino Nemésio



Última aula de V. Nemésio em 9/12/1971


Eu vira a notícia no Jornal de Letras que o António Mega Ferreira, meu diário companheiro de comboio Sintra-Lisboa no tempo de Faculdade (ele entrava no Algueirão e sentava-se sistematicamente no assento frente ao que eu utilizava na carruagem de 1ª classe e que, por isso, ia mais vazia. Líamos, estudávamos no comboio, sabíamo-nos colegas, eu de Letras, ele meu vizinho de Direito. Nunca nos falámos, porém. Mais por timidez da parte de ambos do que por pretensa arrogância – da parte dele, claro!) ia promover uma homenagem ao Professor Vitorino Nemésio lá no (seu) Centro Cultural de Belém, no dia 18.

Logo anunciei que gostaria muito de assistir à comemoração que começaria por uma mesa redonda sobre o Homem e a sua Obra, onde iria participar o também meu professor igualmente açoriano António Machado Pires, à época assistente de Nemésio. Não vou esquecer nunca a sua figura magra, testa alta de pessoa inteligente, cabelo ondulado posto para trás algo despenteado e o olhar fixamente atento, na primeira fila do anfiteatro, perscrutando todas as palavras do Mestre que, quando se perdia no discurso das aulas teóricas – e isso acontecia não raramente – se virava para ele e dizia seguro da prontidão da resposta: «Ó Machado Pires, como se chamava aquele escritor....?» O Machado Pires (que era um querido de um professor mas a quem, não obstante, um grupinho de meninas tontas – eu incluída, naturalmente! – trataram de chamar por brincadeira por “carapau para o gato”) assegurava e bem! as aulas práticas da cadeira de História da Cultura Portuguesa que os alunos de Germânicas tinham no seu plano de estudos do 2º ano. E era ele, de facto, que “nos ensinava alguma coisa” e nos punha os limites da matéria que haveríamos de saber e de estudar para o exame porque o Mestre, nas aulas teóricas, fazia um pouco como no programa “se bem me lembro” que manteve durante anos na RTP, divagava dentro da sua extensíssima e variadíssima cultura.

A homenagem no CCB seguiria com a leitura do texto que serviu de base à última lição dada pelo Professor no habitual Anfiteatro I da minha Faculdade e que ocorreu no dia 9 de Dezembro de 1971, ano em que terminei a minha licenciatura, a que não assisti ao vivo por estar casada há meia dúzia de semanas e porque, na época, as notícias não corriam, como hoje, à velocidade dos e-mails ou do Facebook. Por fim, realizar-se-ia a projeção do documentário “Vitorino Nemésio – Viagem” sobre a vida e depoimentos sobre a vida do Professor, enquanto escritor, poeta e grande homem de cultura.

Um programa que, pensei, me encheria as medidas.

Acabei por não ir, facto que se deve – como me acontece amiúde – à provincialidade, termo que inventei agora mesmo por paralelo à insularidade de que gozam os habitantes das Ilhas, leia-se Regiões Autónomas. Só que estes tiveram sempre e têm, por enquanto, um subsídio que lhes cobre, ou pretende cobrir, a dita insularidade; enquanto nós, os que vivemos (contrariados) “na província” não auferimos de qualquer abono que nos subsidie as idas à capital...

Mas tive pena. E, em jeito de homenagem caseira ao Professor, relembrei a sua imensa bonomia – quando tive de fazer a prova oral (nesse tempo na Faculdade de Letras não havia lugar a dispensas das orais) de Cultura Portuguesa, umas orais antes da minha, estava a ser examinada uma colega não sei de que curso que, em plena sala de exame, se largou a chorar (episódio que acontecia muitas vezes nas orais dada não só a eventual falta de preparação dos alunos, mas muito mais pela imensa timidez de que sofríamos nesse tempo cinzento de fechadismo pessoal, cultural, social, moral e de toda a ordem). Perante a moça que se desfazia em lágrimas, o bom do Professor, também quase de lágrima no olho e com a voz trémula, tratou de dizer: «Vá-se lá embora que eu não posso ver ninguém a chorar.» E não a chumbou!

Lembrei-me de como foi ele que “me iniciou” na leitura de Fernando Pessoa partindo da Mensagem para o estudo dos símbolos e dos mitos nacionais, nomeadamente do sebastianismo, do messianismo e do saudosismo de que sofremos desde tempos imemoriais sem quase nos darmos conta.

Lembrei-me da loucura dos apontamentos que tínhamos de tirar nas aulas teóricas e que dificilmente tinham sequência dada a dispersão de pensamento do (grande) Professor que, sem que nos apercebêssemos estava a anos luz de nós em todos os sentidos. E dispersão por dispersão, dispersávamo-nos nós, tontas meninas, e acabávamos por brincar nas suas aulas. Por vezes, perante alguns comportamentos menos próprios de alunos já na casa dos 18, 19, 20 anos – o que naquele tempo deveria ser já idade para grandes responsabilidades – o Professor interrompia a sua peroração e dizia com muita graça: «Se não querem estar com atenção à aula, durmam, façam a tradução de latim escrevam uma carta à namorada, mas estejam calados!»

Quem disse que os alunos só agora se portam mal?



 
Página de apontamentos de aula "normal"


Página do mesmo caderno noutra aula...

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Namoro de Verão



Todos, ou pelo menos, muitos de nós tem, no fundo das suas recordações, um namoro de verão daqueles que, diziam as nossas mães, ficavam "enterrados na areia". A propósito, e porque este verão está a chegar ao fim, vêm-me sempre à lembrança os dois agostos loucos que passei, em 64 e 65, na Nazaré, praia que, com aquela disposição muito própria - pelo menos que eu desconhecia -  das barracas em fileiras viradas umas para as outras, favorecia  a formação rápida e intensa de grandes grupos de adolescentes. Quase de um dia para o outro, na nossa fileira, reuniu-se um animado grupo de rapazes e raparigas vindos dos mais variados pontos do país: Viseu, Leiria, Torres Novas, Torres Vedras, Ponte de Sôr, Lisboa, nós que vínhamos de Sintra e até de Madrid!




(aposto que não me descobrem nestas fotos tão antigas...)

Naturalmente que, também rapidamente, de entre alguns dos elementos desses variegados grupos nasciam, sempre sob os olhares vigilantes das mães, os famosos namoros de verão de que José Jorge Letria tão bem fala  neste poema que aqui vos deixo:


O namoro durava o que dura um Verão,
tanto e tão pouco, quase nada.
Era um sopro, uma embriaguez,
um êxtase, com o mar ao fundo
a trazer para o areal algas e conchas,
restos de comida, garrafas vazias,
objectos náufragos, nomes de sereias.
O Verão, às vezes, durava uma vida.
Outras vezes durava uma noite.
Havia uma canção que marcava a cadência
da paixão volátil: Smoke Gets in Your Eyes.
Como seria ridículo dizer isto em português.
Depois havia as cartas e os retratos
com dedicatórias lembrando aquele Agosto,
aquele passeio de barco, aquela
madrugada no Palm Beach
ao som de Yesterday. Era tão veloz
esse tempo que parecíamos envelhecer
uma vida em cada semana.
Se morria um amigo, era como
se morresse para sempre a magia do Verão.
E nunca mais houve amores
como esses, primordiais e inocentes. Totais.
Voltar a eles é tão impossível
como voltar ao aconchego do ventre materno.
O namoro durava apenas um Verão,
mas é sempre a ele que voltamos
quando a palavra amor nos queima os lábios.






segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Intolerável!





O “papagaio de serviço” que faz os comentários que muito bem entende aos domingos na TVI, lá veio ontem, uma vez mais, perante o ar absolutamente enfeitiçado (ou apalermado se preferirem) do gaseado apresentador do Telejornal, pôr água na fervura do vergonhoso caso das contas da Madeira, dando a entender que não foi nada de mais, que o anterior governo... que o Tribunal de Contas... que o Banco de Portugal... que... que... E lá acabou por concluir brilhantemente que o senhor em causa não pode ser deixado cair pelo partido em que milita (só podia ser aquele, pois nenhum outro o suportava!) porque ganha eleições. José Sócrates foi eleito há dois anos e já lá não está. Mas o Alberto João Jardim ganha eleições!

É inacreditável, não é? (Esqueceu-se foi de dizer que o primeiro foi apeado pelo senhor presidente da República logo no seu famigerado discurso de tomada de posse; enquanto o segundo, não obstante o ter achincalhado publicamente por mais de uma vez, continua a ser alvo de palavrinhas mansas e de comentários de circunstância.)

Porém, pior do que as carradas de demagogia avulsa do dr. Marcelo, pior que os sorrisinhos matreiros e dos silêncio estudados, pior que os convenientes pigarreios e aclarar da garganta que usa não inocentemente, pior que aquela (parola) daquela professora que entrevistou antes dos comentários e da apresentação dos novos livros que disse tanto disparate pela boca fora que até senti vergonha de ter sido professora toda a vida, pior, pior, pior... é o facto de as doutas opiniões do dr. Marcelo – qual divina encarnação do Oráculo de Delfos – serem referidas pelos jornais e repetidas nos telejornais das 2ªs feiras.

Não se pode! Marcados indelevelmente pelos 300 anos de Inquisição e pelos 48 anos de ditadura moralista a que nos ativemos como bons alunos, continuamos – não obstante termos votado até junho último maioritariamente à esquerda – a ser um povo de direita. Castrado, condicionado, subserviente, atendente à “sábia” palavra do “mestre” – de um mestre qualquer que queira e saiba meter-nos a areia para os olhos.

Intolerável. Verdadeiramente intolerável!



Mas é  disto que o pessoal gosta...


domingo, 18 de setembro de 2011

A exposição de R. Chichorro





Levada pela sugestão da amiga  Justine, lá fui ontem até ao belíssimo edifício do Banco de Portugal aqui em Leiria ver a inauguração da exposição de pintura  "Subúrbio d'um Azul Enluarado" de Roberto Chichorro, também na esperança de ver por lá alguns amigos bloguistas.

De bloguistas nem o mais pequeno vislumbre, mas naturalmente valeu a pena ir porque a exposição está muito bonita e os quadros são magníficos com umas cores perfumadas, quentes e brilhantes que nos fazem entrar num mundo de luz, de sonho e de emoção.

Não posso deixar aqui imagens de todos as telas mas deixo de algumas.












(um dos meus preferidos: o meu retrato??)


(e este: animais)


(e mais animais)


(definitivamente o meu preferido: gatos, flores lilás e a viola)


(sensualidade:
 o pormenor da perna de preta e perna de branca com sapato encarnado)


(maior sensualidade)


 (citação do livro "Mariscando Luas" de que é coautor)


Quem marcou presença foi o retratista pintor de rua de Leiria, o conhecido Salvador (já falado no blog Tinta com Pinta), que aproveitou para ali mesmo fazer o retrato de um dos presentes:





Ato de criação que prontamente foi registado por uma familiar do retratado:




Presente, como não podia deixar de estar por ser também ela própria uma africanista, a pintora nossa amiga Clotilde Fava que, com o afável autor da exposição, acederam simpaticamente a pousar aqui para nós.