segunda-feira, 25 de março de 2019

Presságio


Ela há-de vir como um punhal silente
Cravar-se para sempre no meu peito.
Podem os deuses rir na hora presente
Que ela há-de vir como um punhal direito.

Cubram-me lutos, sordidez e chagas!
Também rubis das minhas mãos morenas!
Rasguem-se os véus do leito em que me afagas!
— A coroa de ferro é cinza apenas...

E ela há-de vir a lepra que receio
E cuja sombra, aos poucos me consome.
Ela há-de vir, maior que a sede e a fome,
Ela há-de vir, a dor que ainda não veio.

Pedro Homem de Mello, in "Príncipe Perfeito"



(Foto de F. Mendes)

quinta-feira, 21 de março de 2019

Um poema no Dia da Poesia


Horário do Fim

morre-se nada
quando chega a vez

é só um solavanco
na estrada por onde já não vamos

morre-se tudo
quando não é o justo momento

e não é nunca
esse momento

Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"





domingo, 17 de março de 2019

Ils sont fous ces anglais...



Tradução livre.

Uma breve história da relação da Bretanha com a UE

Reino Unido: queremos mm desconto nas taxas-
UE: Ok.
Reino Unido: Não queremos pertencer ao Euro.
UE: Ok.
Reino Unido: Não queremos pertencer ao espaço Shengen.
UE: Ok.
Reino Unido: Queremos uma restrição dos benefícios até as pessoas trabalhem aqui durante algum tempo.
UE: Ok.
Reino Unido: Queremos deixar de pagar os benefícios às crianças que não estão no Reino Unido.
UE: Ok.
Reino Unido: Queremos expulsar as pessoas que vêm para cá e não querem trabalhar nem têm como se sustentar.
UE: Está bem; também podem.
Reino Unido: Queremos montes de tratamento especial que os outros países não conseguem.
UE: Bem… não podemos dar isso sem a concordância de todos os outros.
Reino Unido: Se não nos dão o que queremos, vamo-nos embora.
UE: Estão a exagerar, mas vocês é que sabem…
Reino Unido: Está bem, então saímos.
UE: Então adeus.
Reino Unido: Agora que estamos de saída queremos tudo o que tínhamos antes.
UE: Bem…. Isso não funciona assim…
Reino Unido: Se não nos dão o que queremos, vamos embora sem nada.
UE: (coçando a cabeça) Ok… er… er… pois…
Reino Unido: Estamos a falar a sério: vamo-nos embora sem nada para vos dar uma lição.
UE: Então adeus (outra vez).





sexta-feira, 15 de março de 2019

Volta Freud...


É assim desde as minhas mais recônditas memórias: este constante medo de que me ralhem…

Poderia Freud explicar isto? Ou Jung, ou Lacan ou sei lá quem...

Raios partam a mente humana!





terça-feira, 12 de março de 2019

Uma dieta equilibrada

Porque é preciso rir.... e porque é importante manter uma dieta equilibrada...

Veja como deve fazer ...




sexta-feira, 8 de março de 2019

Mulher


A Luz que Vem das Pedras

A luz que vem das pedras, do íntimo da pedra,
tu a colhes, mulher, a distribuis
tão generosa e à janela do mundo.
O sal do mar percorre a tua língua;
não são de mais em ti as coisas mais.
Melhor que tudo, o voo dos insectos,
o ritmo nocturno do girar dos bichos,
a chave do momento em que começa o canto
da ave ou da cigarra
— a mão que tal comanda no mesmo gesto fere
a corda do que em ti faz acordar
os olhos densos de cada dia um só.
Quem está salvando nesta respiração
boca a boca real com o universo?

Pedro Tamen, in "Agora, Estar"



A Vénus de Botticelli


sábado, 2 de março de 2019

Deprime-me o Carnaval


Deprime-me a época do Carnaval. E não é por não gostar desta quadra como afirma grande parte das pessoas minhas conhecidas. Eu sempre me considerei uma pessoa divertida e que gosta de se divertir, por isso gosto, ou melhor, gostava de brincar ao Carnaval.

Lembro-me, ainda em Algés, que a minha avó me levava de elétrico ao cinema do Restelo em Belém, às matinées para crianças onde muitas delas estavam mascaradas e onde se atiravam serpentinas e papelinhos de cores bem vivas e os já muito esquecidos saquinhos de serradura que tanto faziam doer em quem eles acertavam… E, claro, as irritantes bisnagas de água com nos molhavam a cara e os cabelos. E eu, que era uma menina educada sozinha com os meus avós, sossegada e tímida, achava tudo aquilo tão divertido, tão fora do meu mundo cinzento…

Depois, Sintra, já na adolescência, no tempo do colégio felizmente misto, vieram as festas em casa desta e daquela, os primeiros bailes dos meus Diamantes, o primeiro baile na garagem não sei de quem lá para baixo para a Rua da Pendoa ou para a Rua da Biquinha, os bailes da SUS, aquela loucura anos 60 – se bem que uma loucura algo permitida, algo dominada – as festas em nossa casa, as mascaradas trapalhonas, os primeiros beijos…. Viviam-se as semanas a estudar muito para restar todo o tempo livre para as festas nos fins de semana.

A Faculdade trouxe outra etapa, outros amigos, outro namorado. Adeus Diamantes! As festas de receção aos caloiros no Espelho de Água, os bailes de carnaval nas Belas-Artes, a louca música dos carnavais brasileiros e os próprios dos jovens brasileiros que por cá andavam e estudavam. Tanto divertimento! Tanta emoção!

E já adultos e casados, ainda houve festas de Carnaval e de Passagem de Ano, com muita música e muita dança e muito divertimento. Mas nunca nada de desfiles ou de corsos com aqueles deprimentes carros alegóricos cheios de meninas em bikini a fingir que sambam, mas a tiritar com frio. Esse nunca foi o meu Carnaval.

Porém a vida, na sua inexorável trajetória, começou a descrever o arco de volta inteira (ou de volta abatida, sei lá!) e as festas e as folias deixaram de surgir e de fazer sentido. Ficou a memória e uma certa nostalgia, pois que mais poderia restar.

E são essa memória e essa nostalgia – junto com os primeiros estremeções que a primavera nesta altura do ano dá no ar e este novelo labirinticamente emaranhado em se me move a mente – que me deprimem.

Hélas!