Desengane-se quem, com algum
desdém, afirma que os festejos do dia 31 de outubro foram importados da
América. Errado! É uma tradição celta e os celtas também andaram por cá pela
Península. Só não se chamava Halloween, que é, de facto, um termo celta, inglês,
que foi importado e popularizado pelos países americanos.
E eu, que já vou na sétima década
de vida, sempre me lembro de se falar no Dia das Bruxas, em véspera do Dia de
Todos-os-Santos.
Se tiverem paciência, leiam este textinho que
transcrevo do DN.
Esconjurar o mal
A culpa é do Mago Merlin. Ou, se
quisermos viajar para ainda mais longe no tempo, talvez mesmo dos antigos
egípcios que tentavam apaziguar os espíritos dos mortos com requintadas
oferendas de bens terrenos. Esperava-se que, assim, devidamente saciados,
chegassem e bom destino e não votassem para infernizar os vivos.
O Halloween, que hoje se vende
nos hipermercados para deleite dos miúdos e angústia suplementar dos adultos,
tem as suas origens no riquíssimo manancial das tradições celtas pré-cristãs.
No final do verão, encerrado o ciclo das colheitas, celebrava este povo o
festival de Samhain, durante o qual eram levantadas, em cada aldeia, enormes
fogueiras. Acreditava-se que na noite que corresponde sensivelmente ao nosso 31
de outubro os espíritos dos mortos visitavam quem tinham deixado por cá. O
fogo, bem como as celebrações dos sacerdotes, os famosos druidas, servia para
exorcizar quaisquer espíritos malignos que se dispusessem a acompanhar as boas
almas nessa “peregrinação” anual.
O culto dos mortos e o ritual de
sazonalmente lhes apaziguar a “inveja” pelos que vivem e a saudade do que
deixaram e, no entanto, tão universal quanto a espécie humana. Não admira, por
isso, que quer os invasores romanos (que também erguiam altares domésticos aos
antepassados) quer os cristãos tenham assimilado essa tradição celta, em
detrimento de outras (como a crença em fadas ou nos espíritos da natureza, como
das árvores) que foram perseguidas com furor. O cristianismo primitivo passou,
assim, a festejar o All Hallow’s Day (também conhecido por Dia de
Todos-os-Santos), destinado a recordar os mártires sacrificados em nome da
Igreja. Originalmente celebrado a 13 de maio (curiosa coincidência com a festa
de Nossa Senhora de Fátima), foi transferido, no século VIII, por determinação
papal, para o final de outubro, de modo a coincidir com o Samhain que
continuava a celebrar-se, aqui e ali, na Grã-Bretanha, Irlanda, França e no norte
da Espanha. Devidamente cristianizada, a data continuava a evocar os santos
mártires da Igreja, mas mantinha a crença de que essa era uma noite especa, em
que, por artes mágicas, se abria um canal de comunicação entre vivos e mortos. Chamaram-lhe All-hallows-even, mais
tarde Hallow Eve [véspera dos Santos], depois Hallowe’en e, finalmente, Halloween.
(Texto de Maria João Martins in DN 1864)