Incondicionalmente rendida, como
sempre, às obras de (bons) autores portugueses, trouxe para férias, entre
outros, o livro «A Duração dos Crepúsculos» de Filomena Marona Beja, de 2006 e
que comprei em 2009, por cinco euros, numa daquelas feiras de livros para
limpeza de stocks. Dessa autora tinha
já lido, com muito agrado, «A Cova do Lagarto», excelente romance sobre a vida
do engenheiro Duarte Pacheco, o grande Ministro das Obras Públicas e
Comunicações de Salazar.
Não menos interessante foi a
leitura desta obra da autora, naquele seu estilo fragmentário e breve de constantes
avanços e recuos na narrativa que nos fazem estar atentos e despertos ao tempo,
ao espaço, à continuação da diegese, da ação. Além de que nos surpreende constantemente
com apontamentos culturais do nosso país.
O tempo da ação decorre por quase
todo o século XX, tocando mais ou menos a fundo nas épocas das duas Guerras
Mundiais, num espaço que se expande entre Lisboa, Paris e a zona norte da Ilha
de São Miguel, nos Açores, tudo enleado por breves romances de amor, tudo em
termos fugidios como terá convindo aos terríveis tempos de guerra. Sem dramas,
porém. E sempre presente a perspetiva cultural: a literatura, a ciência, as artes
plásticas. O António Dacosta, o António Pedro, os surrealistas da Casa Repe, Bento
de Jesus Caraça, a investigação sobre Pedro Nunes, o nosso matemático do tempo
das Descobertas. Muito bom!
Para mim a novidade foi a
descoberta da escritora Virgínia Folque de Castro que, no início do século XX,
se dedicou a escrever (talvez dos primeiros) livros para crianças, livros sobre
figuras importantes da História, argumentos para filmes. «A História de DonaRedonda», talvez o mais conhecido, por ter sido a primeira obra da literatura
fantástica escrita em português.
Toda a história é relembrada e
narrada em 1ª pessoa pelo cineasta Ayres de Aguiar, amigo da Senhora Dona
Virgínia, a Gy dos livros infantis, depois de, já velho, se ter refugiado na
sua velha casa na Lomba da Maia, na parte norte da Ilha de São Miguel.
Boa literatura! E sabem o que
mais me chocou? Muito boa literatura por cinco euros em limpeza de stocks. Juro que nunca vi os livros
destes “autorzinhos” da moda nem os best-sellers
tipo Margarida Rebelo Pinto ou Rodriguinho dos Cantos a cinco euros para
limpeza de stocks….
Mas, entretanto, o pessoal que
tem estes gostos – ou outros piores – em termos de leituras em bom português,
empenha-se muito na defesa da língua de Camões e até quer referendar o último
acordo ortográfico…. De partir a rir!