Não, desta vez não venho desfeitear
o ministro (C)rato, nem pôr em causa os exames de matemática e menos ainda os
professores da dita. Sou de Letras, bem sabem…
A questão é que hoje sinto-me tão
abatida (sei lá porquê) que, porque sou de Letras, antes que ponha aqui um Antero
ou um Ruy Belo que vos deixe ainda pior do que eu estou, é melhor lançar mão da
Trigonometria Amorosa que essa sim, é escorreita, exata, linear e amoral (Cuidado!
Atenção! Eu não disse «imoral»!)
Vejam se gostam.
TRIGONOMETRIA MATEMÁTICA
Um Quociente apaixonou-se
Um dia
Doidamente
Por uma Incógnita.
Olhou-a com seu olhar inumerável
E viu-a, do Ápice à Base...
Uma Figura Ímpar;
Olhos rombóides, boca trapezóide,
Corpo ortogonal, seios
esferóides.
Fez da sua
Uma vida
Paralela à dela.
Até que se encontraram
No Infinito.
"Quem és tu?" indagou
ele
Com ânsia radical.
"Sou a soma do quadrado dos
catetos.
Mas pode chamar-me
Hipotenusa."
E falando descobriram que eram
O que, em aritmética, corresponde
A almas irmãs
Primos-entre-si.
E assim se amaram
Ao quadrado da velocidade da luz
Numa sexta potenciação
Traçando
Ao sabor do momento
E da paixão
Retas, curvas, círculos e linhas
sinusoidais.
Escandalizaram os ortodoxos
das fórmulas euclidianas
E os exegetas do Universo Finito.
Romperam convenções newtonianas
e pitagóricas.
E, enfim, resolveram casar-se.
Constituir um lar.
Mais que um lar,
Uma Perpendicular.
Convidaram para padrinhos
O Poliedro e a Bissetriz.
E fizeram planos, equações e
diagramas para o futuro
Sonhando com uma felicidade
Integral E diferencial.
E casaram-se e tiveram
uma secante e três cones
Muito engraçadinhos.
E foram felizes
Até aquele dia
Em que tudo, afinal,
se torna monotonia.
Foi então que surgiu
O Máximo Divisor Comum...
Frequentador de Círculos
Concêntricos
Viciosos.
Ofereceu, a ela,
Uma Grandeza Absoluta,
E reduziu-a a um Denominador
Comum.
Ele, Quociente, percebeu
Que com ela não formava mais Um
Todo,
Uma Unidade.
Era o Triângulo,
chamado amoroso.
E desse problema, ela era a
fração
Mais ordinária.
Mas foi então que Einstein
descobriu a
Relatividade.
E tudo que era espúrio passou a
ser
Moralidade.
Como aliás, em qualquer
Sociedade.
(Millôr Fernandes)