Este fim-de-semana lá nos
abalámos até ao cinema – que preguiçosos estamos para sairmos de casa se não
tivermos uma obrigação! – para irmos ver Os Maias com realização de João Botelho.
É bom que haja quem queira dar
visibilidade – e uma visibilidade moderna, desassombrada – aos nossos clássicos
e João Botelho, para além da quantidade de filmes que já assinou, realizou com
grande mestria a sua versão do Livro do Desassossego.
Quanto a Os Maias, que tem muito
mais de teatro do que de cinema, gostei e não gostei.
Gostei da intervenção do narrador em voz off que nos vai servindo o fio condutor da história;
Gostei da forma elegante como se nos apresentam as personagens e,
de alguma forma, a ambiência decadente em que se movem;
Gostei da finura das filmagens, nomeadamente no que toca às cenas
de envolvimento amoroso, especialmente da última noite de amor de Carlos e de
Maria Eduarda;
Gostei particularmente da representação de João da Ega e do velho
Afonso da Maia;
Gostei da utilização algo inovadora dos cenários pintados –
lindíssimos – em vez da bela paisagem natural da Lisboa oitocentista.
Mas não gostei da forma teatral e por de mais exagerada como nos foi
apresentado o passado da família Maia: as desavenças do pai absolutista com o
filho Afonso da Maia que, liberal e maçon, teve de se refugiar em Inglaterra,
bem com os amores de Pedro da Maia, pai de Carlos, com a negreira Maria
Monforte. Mesmo tendo sido feito com a intenção de dar a ideia de uma rápida
analepse, achei muito exagerado.
Muito embora tenha sido um
diletante, não gostei da escolha de
um betinho para dar vida à personagem
Carlos da Maia.
Não gostei do episódio das corridas de cavalos mais parecidas com
as de Ascot do que com a descrição crítica e irónica das mesmas no romance
escrito.
Também o Dâmaso Salcede, o amigo
adjacente de Carlos da Maia, não está bem na sua pele de bajulador balofo e
untuoso que Eça tão bem retrata e descreve. Tal como é absolutamente truncada a
história de rivalidade entre Eusebiozinho e Carlos desde os tempos da infância
em Santa Olávia e que vai redundar na idade adulta nas bengaladas – e só isso nos
é mostrado no filme – com que Carlos brinda o «amigo» na segunda parte do
filme.
A segunda parte do filme é, de
facto, muito mais dinâmica e entusiasmante do que a primeira que, com já acima
referi, me pareceu muito teatral.
De qualquer forma, acho que vale
a pena abalarem-se de casa e irem ver a versão João Botelho da obra-prima de
Eça.